Os venezuelanos pedem
socorro. Não, não são todos. Lá, como em quaisquer regimes totalitários, graças
à fé doentia nas lideranças revolucionárias ou aos favores que recebe ou espera
receber do Estado, parte considerável da população está alinhada com a
ditadura. Os que a ela resistem se defrontam com as forças militares e com as
milícias armadas pelo regime.
Pobre povo venezuelano! Foge pelas
fronteiras e conta mortos nas ruas. Tudo se passou como se uma velha garrafa
jogada do malecón habanero em meados do século passado, houvesse atravessado o
Mar das Caraíbas, arribado no pedregoso litoral venezuelano e ali se quebrado,
espargindo uma torrente de maldições semelhantes às que se abateram sobre Cuba.
Sim, porque quase tudo na Venezuela segue o funesto ritual cubano: crescentes
restrições às liberdades políticas, manipulações eleitorais, cerceamento da
oposição e prisão de dissidentes, intervencionismo estatal, tabelamento de
preços, sucateamento do parque produtivo, escassez. E, desde 2013, a versão
bolivariana, eletrônica, da libreta
de racionamento. Quando esta começou em Cuba, no ano de 1963, foi muito mal
recebida pela população. Era uma forma de proporcionar, a um povo que
empobreceu rapidamente após a revolução, alimento subsidiado em quantidades
mínimas. Passados 54 anos, o Estado cubano continua se apropriando da
totalidade da renda nacional e remunerando a população em servidão com salários
mensais que apenas compram três quilos de leite em pó.
A libreta se adelgaçou a menos da metade do conteúdo original, mas os
cubanos reagem às propostas para extingui-la, porque "con la libreta nadie puede vivir, pero sin la
libreta hay mucha gente que no puede vivir".
Diferentemente
de Cuba, a Venezuela era rica,
petroleira, membro da OPEP. O comunismo, que afundou a economia cubana em três
anos, levou 17 para arruinar o país. Mas nada é impossível a esse ogro
político-ideológico. Se o comunismo conseguiu manter na miséria metade da
Alemanha durante 44 anos, não seria uma republiqueta bolivariana que haveria de
resistir a seu poder de destruição.
Os venezuelanos estão famintos. Matéria da United Press
International em fevereiro deste ano informou sobre uma pesquisa desenvolvida
por três universidades venezuelanas (Universidade Central da Venezuela,
Universidade Católica Andrés Bello e Universidade Simão Bolívar). Os resultados
foram assustadores! Em meio à crise de alimentos e medicamentos, a população
perde peso em proporções alarmantes. Um milhão de estudantes abandonaram a
escola. Por quê? Blackouts, greves, fome. A renda de 82,8% dos venezuelanos os
classifica como em estado de pobreza. O FMI estima que a inflação do país
atingirá 1600% no corrente ano e a Comissão Econômica da ONU para a América
Latina e o Caribe avalia uma redução de 4% no PIB nacional.
Matéria do El Nacional do dia 16 de agosto
passado mostra que se repete na Venezuela um fenômeno generalizado no
comunismo: até as vacas param de dar leite e a população apela para éguas e
cabras. A falta desse produto agrava a mortalidade infantil por desnutrição e
doenças digestivas.
Nesse cenário é impositivo perguntar: para onde se deve mover
a sensibilidade de uma pessoa com senso de justiça e humanidade? Claramente, é
o sofrimento da população que nos deve condoer. Em instância mais remota, será
a ruína de um país vizinho e sua tragédia perante a história. Mas, para isso, é
preciso ter senso de justiça e humanidade. Os dirigentes e militantes dos
nossos partidos de esquerda (PT, PCdoB e PSOL) olham para a realidade
venezuelana e, entre o sofrimento da população sob seu governo comunista, ficam
com o governo, apoiando-o para que ponha mais lenha no braseiro do inferno que
criou.
Percival Puggina membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do Brasil. integrante do grupo Pensar+.
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