Como ajudar os
filhos diante da separação dos pais?
Uma separação envolve muitos sentimentos dolorosos,
mas poucos são tão difíceis quanto o medo do que essa decisão pode provocar nos
filhos. Por outro lado, manter-se em um relacionamento infeliz “pelo bem dos
filhos” coloca uma carga pesada nos ombros deles, trazendo consequências
igualmente penosas, muitas vezes obrigando-os a presenciarem brigas entre o
casal, e a conviverem com uma insegurança e preocupação constantes sobre o
futuro.
De fato, pode haver prejuízos no ajustamento social
e bem-estar emocional de crianças e adolescentes nos contextos pré e
pós-divórcio, mas mesmo quando uma separação é amigável, e a guarda,
compartilhada, se trata no mínimo de uma grande mudança na rotina, nos projetos
de futuro e nas relações entre os membros da família, inaugurando um processo
de luto, com o qual cada um vai lidar à sua maneira.
No senso comum geralmente usa-se a palavra luto somente diante da
morte de alguém querido, mas na realidade vivenciamos esse processo sempre que
perdemos alguém, ou mesmo algo, significativo. É um conjunto de reações,
experiências e sentimentos manifestados diante de uma perda. Uma demissão, um
diagnóstico, a mudança de escola ou de cidade, e uma separação são exemplos de
eventos que podem desencadear o processo de luto. Quando um casamento acaba,
acabam com ele muitas esferas da vida do casal e da criança, e todos precisarão
de tempo e de apoio para a elaboração e a reconstrução de outros modos de viver
e relacionar-se.
Embora a perda faça parte de vida de todos nós,
investimos a maior parte do tempo dos esforços tentando evitá-la, e nos pegamos
sem recursos quando inevitavelmente ela aparece. Infelizmente não há protocolo
ou recomendação de especialista que salve da dor – a nossa e a de nossos filhos
– mas há caminhos possíveis, que nos permitem atravessar juntos os momentos
difíceis.
Converse com seu filho
Conte para ele, de preferência em conjunto com o
ex-parceiro, sobre a separação, explicando que essa é uma decisão dos adultos,
sobre a qual ele não tem nenhuma responsabilidade. Algumas crianças se sentem
culpadas pelas brigas dos pais, e imaginam ser a causa dos conflitos entre
eles. Deixe claro que as crianças nunca são responsáveis pelo que acontece nos
relacionamentos adultos. Informe também o que vai mudar na rotina dela e o que
permanecerá igual. Se seu filho está em idade pré-escolar, fazer um calendário
visual com os dias em que ele vai estar com cada genitor pode ajudar. Fornecer
alguma previsibilidade num cenário de mudança contribui para que a criança se
sinta mais segura e vá se adaptando à nova realidade. Reconheça qualquer
sentimento que ela manifestar como legítimo, compartilhando um pouco dos seus
também. Dizer para ela que você também fica triste às vezes, e que tudo bem a
gente se sentir assim, ajuda a criança a normalizar e se perceber acolhida em
suas emoções.
Escute seu filho
Na tentativa de proteger crianças e jovens, muitas
vezes os pais adotam estratégias como negar, diminuir ou distraí-los do que
estão sentindo, tirando deles a oportunidade de expressar e dividir emoções
dolorosas, deixando-os, portanto, sozinhos com o que sentem. Ao escutá-los e
ajudá-los a dar nome aos sentimentos, como raiva, tristeza, e saudade,
fornecemos uma via para que expressem o que é difícil e recebam o apoio
necessário, ao invés de acabarem por se retrair e transformar o que sentem em
sintomas ou comportamentos disfuncionais. Mas não force a criança ou o jovem a
falar sobre este assunto, basta estar disponível para ouvir e acolher o que ele
trouxer, quando ele trouxer. Há livros e animações sobre o tema que também
ajudam na elaboração das vivências infantis.
Respeite a mãe/o pai de seu
filho
Quando intensos e frequentes, os conflitos entre os
pais – separados ou não – podem trazer grandes prejuízos emocionais para as
crianças. É essencial evitar colocar seus filhos no meio de brigas ou fazê-los
sentir que precisam escolher um lado. Nunca discuta na frente deles, seja
pessoalmente ou por telefone. Se o conflito for inevitável, conversem em um
outro momento ou abandonem a conversa. Não critique o comportamento do outro
para a criança. Se há queixas, resolva a questão diretamente com o adulto.
Lembre-se que seu ex ainda é pai/mãe dela. Excluídos casos de violência e
negligência, os filhos se beneficiam em manter um relacionamento com ambos os
pais. Se a criança ou jovem parece estar se distanciando do outro genitor,
cheque com ele se há alguma coisa está fazendo com que se sinta assim. Depois
pensem juntos em soluções que os fariam sentir-se mais confortáveis.
Fique atento ao seu filho
Algumas crianças e adolescentes atravessam o
divórcio dos pais com poucos problemas, enquanto outras passam por momentos
muito difíceis. É esperado que todas sintam e manifestem uma série de emoções
dolorosas, mas com o tempo, a presença do amor dos cuidadores e a segurança
proporcionada pelos novos ambientes e rotinas, a tendência é que elas construam
novas percepções de sua família e novos modos de estar com os pais. Porém,
é importante estarmos atentos para alguns sinais que, persistindo por muito
tempo, podem indicar a necessidade de algum apoio adicional. Converse com o
pediatra, hebiatra, com a equipe escolar que acompanha seu filho ou busque um
psicólogo infantil caso a criança ou o adolescente apresente problemas de sono,
queixas recorrentes na escola, abuso de substâncias, autolesão, distúrbios
alimentares, explosões frequentes de raiva ou violência, ou desinteresse em
atividades que antes gostava.
Cuide-se
Para estarmos plenamente disponíveis ao cuidado com
o outro, precisamos priorizar e dedicarmo-nos ao cuidado conosco. Muitas
crianças calam o próprio sofrimento ao perceberem que os pais não estão bem,
tentando evitar assim de onerá-los ainda mais. Ao dar espaço para suas próprias
dores e necessidades, você estará também contribuindo para o bem-estar da
criança, que certamente se beneficiará ao poder contar com adultos mais
emocionalmente regulados. Procure construir e contar com uma rede de apoio,
tanto para que você possa partilhar eventualmente o cuidado com seu filho,
quanto para pedir suporte para você mesmo. Preserve seus espaços sociais,
conecte-se com amigos e amigas, estabeleça contato com grupos de apoio e, caso
seja necessário e possível, busque psicoterapia.
Se a separação aconteceu recentemente, pode parecer
que os momentos difíceis vão durar para sempre. Mas lembre-se que um divórcio,
como toda mudança, exige tempo para que todos se ajustem. Não se apresse, ou a
seus filhos. Com apoio, e juntos, vocês encontrarão um lugar para isso na
história de cada um, e construirão novos formatos para se compreender e se
reconfigurar enquanto família.
Bárbara Saddy - psicóloga clínica, com mais de dez anos de experiência no atendimento ao
público infantojuvenil. Também é autora da ficção “Azul-Ninguém”, em que trata
sobre o luto de uma separação