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quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

Como lidar com autistas em sala de aula


O acesso de uma criança autista à escola é um direito garantido por lei. Mas para essa experiência seja realmente inclusiva, é importante que a escola e o educador estejam bem preparados e informados.

Tecnicamente o autismo hoje é chamado de Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). Ao tratar essa condição de saúde como “espectro”, a ciência evidencia o fato de que não existe um único tipo de autismo: ao contrário, há tantos níveis diferentes de comprometimento que sua manifestação em cada pessoa é tratada como única.
Em geral, entretanto, pessoas que se enquadram no espectro têm três importantes áreas do desenvolvimento humano afetadas : as habilidades socioemocionais, a atenção compartilhada e a linguagem. 


INFÂNCIA

Durante a infância, a manifestação mais evidente do autismo está no comportamento da criança. Ainda bebê, é possível notar alguns sinais, como por exemplo um olhar mais distante do que o habitual, uma certa apatia. Outro indicador é a criança se mostrar incomodada por algum som específico ou pelo toque de outra pessoa. O maior sinal, entretanto, é uma grande falta de interesse por situações sociais, em geral, uma vez que a socialização é a parte mais afetada


ROTINA

Para se sentir confiante a participar do ambiente escolar, a criança autista precisa que a escola estabeleça para ela sequências de ações, rotinas. É importante que o autista perceba cada parte da rotina. Grande parte dos autistas tem dificuldade de comunicação e, quando este é o caso, a escola pode trabalhar com os livros adaptados que, com figuras de rotinas e ações, ajudam o autista a se comunicar. Claro que há outros recursos e estratégias. Cada criança tem suas próprias características e necessidades. Um caso pode ser diferente do outro porque também há graus diferentes de autismo (leve, médio e moderado). O grau leve é mais difícil de detectar na infância e tem uma forma de lidar totalmente diferente dos níveis de comprometimento médio ou moderado. Existem escolas especiais para esta condição, mas o convívio em classes regulares deve ocorrer logo de início, mesmo que com menor tempo de permanência na escola. 


AMIZADES

O autista tem dificuldade em ter amizades, mas elas são importantes para ele. O problema, na verdade, é que ele não consegue compreender alguns aspectos que fazem parte dos laços de amizade. É comum que o autista mantenha pouquíssimos amigos em ambiente escolar ou de trabalho. Para que o autista tenha relações de amizade é preciso que sinta empatia, afinidade com a pessoa, que os laços de amizade sejam muito fortes. Mesmo assim, quando uma outra pessoa, com menor afinidade, entra em seu grupo de convívio, ele tende a se fechar, pois não consegue encontrar facilmente situações comunicativas com a pessoa "nova". Ele precisa conhecer e se acostumar com suas amizades. Embora a socialização seja difícil, o autista sente, dentro de si, a necessidade de convívio, especialmente no grau leve. Nos graus médio e moderado é importante a presença de amigos, mas o tipo de necessidade é um pouco diferente, pois as perspectivas sociais também são distintas. De qualquer forma, é de grande importância que o autista tenha amizades, porque ele precisa de convívio social. Apesar de ser difícil para ele, o autista precisa aprender como funcionam relações entre as pessoas e, sem as amizades, isso fica quase impossível. 


LIDANDO COM O PRECONCEITO

Grande parte das pessoas acaba tendo realmente preconceitos em relação ao autista por não saber lidar com aqueles comportamentos considerados estranhos. É importante ensinar o autista a lidar com situações diversas em relação às pessoas que o cercam, especialmente estas, com maiores preconceitos. Para ensinar, é preciso fazê-lo, primeiramente, entender o ponto de vista das pessoas. Muitas vezes, o autista vê o comportamento mas não entende o motivo de ele acontecer. Dependendo da situação, o autista nem percebe o preconceito. Uma grande dificuldade para quem está no espectro é a leitura de emoções e sentimentos. Para compreender e lidar com as situações, ele precisa aprender a ler sinais de emoção ou de sentimentos das pessoas que os cercam. Além de entender estas emoções, necessita saber o que deve fazer quando as percebe. Se sofre um preconceito, precisa aprender a identificar e receber instruções sobre como lidar com cada situação. Quando alguém usa tons mais altos de voz e está com determinadas feições mudadas, por exemplo, o autista pode estar diante de uma situação de agressividade com ele. Ele precisa ser orientado a permanecer calmo, explicar que tem dificuldade para fazer tal coisa e apenas precisa que a pessoa lhe explique melhor ou perguntar por qual motivo a pessoa está agindo daquela maneira para que ele possa entender e ajudar. Para que a criança no  espectro compreenda partes de indícios sociais, especialmente os não verbais, pode ser interessante o uso de fotos para explicar feições, pois o visual é importante para o autista. 


TALENTOS

Existem casos em que pessoas autistas ficaram conhecidas por sua inteligência acima da média, comportamento autodidata, desenvolvimento de talentos especiais para música ou grande facilidade com números. Nesse caso, a família e a escola podem estimular o aprimoramento da pessoa no espectro.

Este é o caso do autismo leve ou do tipo Asperger, comentado anteriormente. O autista consegue ter pouca, mas alguma sociabilidade. Este tipo de autismo costuma ter focos durante a vida, fixações. Geralmente o Asperger tem um interesse grande por um determinado tema e se aprofunda demais nele, o que as outras pessoas identificam como comportamento autodidata. Por se interessar e buscar informações para este tema, acaba criando formas pessoais e extremamente estruturadas de estudo que são muito interessantes de serem analisadas. Com isso, acabam tendo maior facilidade de estudo, mas não quer dizer que serão bons em tudo. Acontece de serem muito bons nas áreas de seu interesse, embora consigam lidar bem com as demais. 

A família pode incentivar estimulando a criança com várias fontes diferentes onde poderá encontrar informações sobre seu tema de interesse e também mostrar à criança novos temas que podem ser relacionados. Desta forma, consegue ampliar seu campo de interesse. A escola pode utilizar as estratégias de estudo criadas pela criança para estudar também matérias que não estão no foco dessa criança. Deve estimular seu convívio social, para que a criança possa ampliar conhecimentos. Embora tenha dificuldade em se relacionar, as amizades também são importantes para seu estímulo, porque podem aprender a partir do convívio, trazendo novas informações para seu "mundo". Caso seja possível, é interessante matricular a criança em cursos relacionados à suas área de interesse maior, para que ela possa se desenvolver também com profissionais que tenham maior conhecimento sobre o assunto. 

Uma equipe multidisciplinar, composta por vários profissionais que tenham conhecimento das características do autismo, pode ajudar a família a lidar com todas as particularidades do autista, inclusive os talentos natos. 


FAMÍLIA, CUIDADORES E QUALIDADE DE VIDA

Pais e cuidadores devem compreender e aceitar que o indivíduo autista consegue aprender e tem a possibilidade de se desenvolver, mas precisará de estímulos diferentes das outras pessoas. As mais preciosas dicas são: leia muito sobre o assunto e observe como o indivíduo se comporta. Observar como a pessoa no espectro trabalha com rotinas pessoais é o que dá acesso à compreensão de seus comportamentos. É importante salientar que, embora o autista não tenha um comportamento social comum, ele tem dificuldade em lidar com situações nas quais as pessoas fazem coisas que ele considera erradas. Conversar com o autista, mesmo que ele não dialogue totalmente da forma como esperada, ajuda muito a compreender os motivos pelos quais ele faz determinadas ações. Ele sempre mostrará um comportamento que dará dicas de como lidar com as situações. 


BEM-ESTAR GARANTIDO

Existem alguns indicadores de que educadores, família e cuidadores estão no caminho certo para garantir o bem-estar da pessoa no espectro. É preciso sempre incentivar suas habilidades, procurar não expor o indivíduo a situações sociais nas quais ele não se sinta confortável (com o tempo, o autista aprende sozinho a lidar com situações de exposição), conversar com ele sobre as situações que percebemos ter gerado desconforto nele, procurar auxílio de profissionais que possam ajudar na orientação de como lidar com o transtorno, não forçar situações sociais que podem parecer comuns para pessoas fora do espectro (como forçar a criança a cumprimentar estranhos em situações de exposição). 

O convívio familiar é também uma situação social. É um lugar de segurança para o autista, no qual ele pode aprender sobre os comportamentos da vida social, mas em menor escala. É preciso estimular as situações de conversa, deixando o autista seguro em relação ao ambiente. Todos os familiares devem respeitar os limites da criança autista e procurar compreender que terá respostas diferentes dos demais membros da família para determinadas situações.


SEMPRE A ROTINA

Ter rotina ou fazer ações em etapas ajuda muito o autista tanto em casa quanto na escola ou no trabalho. Criar rotinas para a criança dentro do ambiente familiar ajuda-a a se sentir mais confortável, deixando-a mais tranquila e segura e trazendo maior equilíbrio para o ambiente. A rotina é pessoal do autista, mas deve ser construída ao longo da vida e para isto é interessante que os familiares possam contribuir com as primeiras rotinas. No trabalho, não forçar situações sociais nas quais o autista não queira participar e compreender que ele precisa sim das relações sociais na interação com colegas, mas se mostrará mais calado com colegas com os quais não tem tanta intimidade. 

* Designer de atividades pedagógicas, Janaína Spolidorio é formada em Letras, com pós-graduação em consciência fonológica e tecnologias aplicadas à educação e MBA em Marketing Digital. Ela atua no segmento educacional há mais de 20 anos e atualmente desenvolve materiais pedagógicos digitais que complementam o ensino dos professores em sala de aula, proporcionando uma melhor aprendizagem por parte dos alunos e atua como influenciadora digital na formação dos profissionais ligados à área de educação.





Janaina Spolidório


Polinização é ameaçada por desmatamento e agrotóxicos no Brasil


Declínio desse serviço ambiental, estimado em R$ 43 bilhões em 2018, põe em risco a produção de alimentos e a conservação da biodiversidade brasileira, alertam autores do primeiro relatório sobre o tema no país (fotos: Rede Brasileira de Interações Planta-Polinizador (REBIPP))

Das 191 plantas cultivadas ou silvestres utilizadas para a produção de alimentos no Brasil, com processo de polinização conhecido, 114 (60%) dependem da visita de polinizadores, como as abelhas, para se reproduzir. Entre esses cultivos estão alguns de grande importância para a agricultura brasileira, como a soja (Glycine max), o café (Coffea), o feijão (Phaseolus vulgaris L.) e a laranja (Citrus sinensis).

Esse serviço ambiental (ecossistêmico), estimado em R$ 43 bilhões anuais, fundamental para garantir a segurança alimentar da população e a renda dos agricultores brasileiros, tem sido ameaçado por fatores como o desmatamento, as mudanças climáticas e o uso de agrotóxicos. A fim de combater essas ameaças, que colocam em risco a produção de alimentos e a conservação da biodiversidade brasileira, são necessárias políticas públicas que integrem ações em diversas áreas, como a do meio ambiente, da agricultura e da ciência e tecnologia.

O alerta foi feito por um grupo de pesquisadores autores do 1º Relatório Temático de Polinização, Polinizadores e Produção de Alimentos no Brasil e de seu respectivo “Sumário para Tomadores de Decisão”, lançados quarta-feira (06/02), durante evento na FAPESP.

Resultado de uma parceria entre a Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES, da sigla em inglês), apoiada pelo Programa BIOTA-FAPESP, e a Rede Brasileira de Interações Planta-Polinizador (REBIPP), o relatório foi elaborado nos últimos dois anos por um grupo de 12 pesquisadores e revisado por 11 especialistas.

O grupo de pesquisadores fez uma revisão sistemática de mais de 400 publicações de modo a sintetizar o conhecimento atual e os fatores de risco que afetam a polinização, os polinizadores e a produção de alimentos no Brasil, e apontar medidas para preservá-los.

“O relatório aponta que o serviço ecossistêmico de polinização tem uma importância não só do ponto de vista biológico, da conservação das espécies em si, como também econômica. É essa mensagem que pretendemos fazer chegar a quem toma decisões no agronegócio, no que se refere ao uso de substâncias de controle de pragas ou de uso da terra no país”, disse Carlos Joly, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), coordenador do programa BIOTA-FAPESP e membro da coordenação da BPBES, durante o evento.

O relatório indica que a lista de “visitantes” das culturas agrícolas supera 600 animais, dos quais, no mínimo, 250 têm potencial de polinizador. Entre eles estão borboletas, vespas, morcegos, percevejos e lagartos.

As abelhas predominam, participando da polinização de 91 (80%) das 114 culturas agrícolas que dependem da visita de polinizadores e são responsáveis pela polinização exclusiva de 74 (65%) delas.

Algumas plantas cultivadas ou silvestres dependem, contudo, exclusivamente ou primordialmente de outros animais para a realização desse serviço, como é o caso da polinização de flores de bacuri (Platonia insignis) por aves. Outros exemplos são da polinização de flores de pinha (Annona squamosa) e araticum (Annona montana) por besouros, de flores de mangaba (Hancornia speciosa) por mariposas e de flores de cacau (Theobroma cacao) por moscas.

“As plantas cultivadas ou silvestres visitadas por esses animais polinizadores enriquecem a nossa dieta ao prover frutas e vegetais que fornecem uma série de nutrientes importantes”, disse Marina Wolowski, professora da Universidade Federal de Alfenas (Unifal) e coordenadora do relatório. “Outras plantas cultivadas pelo vento, como o trigo e o arroz, por exemplo, estão mais na base da dieta”, comparou.

Os pesquisadores avaliaram o grau de dependência da polinização por animais de 91 plantas para a produção de frutas, hortaliças, legumes, grãos, oleaginosas e de outras partes dos cultivos usadas para consumo humano, como o palmito (Euterpe edulis) e a erva-mate (Ilex paraguariensis)

As análises revelaram que, para 76% delas (69), a ação desses polinizadores aumenta a quantidade ou a qualidade da produção agrícola. Nesse grupo de plantas, a dependência da polinização é essencial para 35% (32), alta para 24% (22), modesta para 10% (9) e pouca para 7% (6).

A partir das taxas de dependência de polinização dessas 69 plantas, os pesquisadores estimaram o valor econômico do serviço ecossistêmico de polinização para a produção de alimentos no Brasil. O cálculo foi feito por meio da multiplicação da taxa de dependência de polinização por animais pela produção anual do cultivo.

Os resultados indicaram que o valor do serviço ecossistêmico de polinização para a produção de alimentos no país girou em torno de R$ 43 bilhões em 2018. 
Cerca de 80% desse valor está relacionado a quatro cultivos de grande importância agrícola: a soja, o café, a laranja e a maçã (Malus domestica).

“Esse valor ainda está subestimado, uma vez que esses 69 cultivos representam apenas 30% das plantas cultivadas ou silvestres usadas para produção de alimentos no Brasil”, ressaltou Wolowski.


Fatores de risco

O relatório também destaca que o serviço ecossistêmico de polinização no Brasil tem sido ameaçado por diversos fatores, tais como desmatamento, mudanças climáticas, poluição ambiental, agrotóxicos, espécies invasoras, doenças e patógenos.

O desmatamento leva à perda e à substituição de hábitats naturais por áreas urbanas. Essas alterações diminuem a oferta de locais para a construção de ninhos e reduzem os recursos alimentares utilizados por polinizadores.

Já as mudanças climáticas podem modificar o padrão de distribuição das espécies, a época de floração e o comportamento dos polinizadores. Também são capazes de ocasionar alterações nas interações, invasões biológicas, declínio e extinção de espécies de plantas das quais os polinizadores dependem como fonte alimentar e para construção de ninhos, e o surgimento de doenças e patógenos.

Por sua vez, a aplicação de agrotóxicos para controle de pragas e patógenos, com alta toxicidade para polinizadores e sem observar seus padrões e horários de visitas, pode provocar a morte, atuar como repelente e também causar efeitos tóxicos subletais, como desorientação do voo e redução na produção de prole. Além disso, o uso de pesticidas tende a suprimir ou encolher a produção de néctar e pólen em algumas plantas, restringindo a oferta de alimentos para polinizadores, ressaltam os autores do relatório.

“Como esses fatores de risco que ameaçam os polinizadores não ocorrem de maneira isolada é difícil atribuir o peso de cada um deles separadamente na questão da redução das populações de polinizadores que tem sido observada no mundo”, disse Wolowski.

Na avaliação dos pesquisadores, apesar do cenário adverso, há diversas oportunidades disponíveis para melhorar o serviço ecossistêmico de polinização, diminuir as ameaças aos polinizadores e aumentar o valor agregado dos produtos agrícolas associados a eles no Brasil.

Entre as ações voltadas à conservação e ao manejo do serviço ecossistêmico de polinização estão a intensificação ecológica da paisagem agrícola, formas alternativas de controle e manejo integrado de pragas e doenças, redução do deslocamento de agrotóxicos para fora das plantações, produção orgânica e certificação ambiental.

Uma política pública destinada aos polinizadores, à polinização e à produção de alimentos beneficiaria a conservação desse serviço ecossistêmico e promoveria a agricultura sustentável no país, estimam os pesquisadores.

“Esperamos que o relatório ajude a estabelecer planos estratégicos e políticas públicas voltadas à polinização, polinizadores e produção de alimentos em diferentes regiões do país”, afirmou Kayna Agostini, professora da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e também coordenadora do estudo.

Na avaliação de Marco Antonio Zago, presidente da FAPESP, o relatório incorpora várias atividades que o programa BIOTA tem feito ao longo dos seus 20 anos de existência. Entre elas, a de fornecer subsídios para políticas públicas.

“O BIOTA-FAPESP participa ativamente da vida do Estado de São Paulo e do país ao fornecer subsídios científicos para as decisões governamentais e, ao mesmo tempo, realizar atividade de pesquisa da maior qualidade em uma área vital”, disse Zago na abertura do evento.

Também esteve presente na abertura do evento Fernando Dias Menezes de Almeida, diretor administrativo da FAPESP. 

 



Elton Alisson

Agência FAPESP



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