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‘Sob o ponto de vista jurídico, a posição predominante é de que o sigilo de correspondência previsto na Constituição Federal não pode ser usado para encobrir abusos’
Todos nós conhecemos as
vantagens da era digital. Entretanto, observo que a evolução das ferramentas e
usos das tecnologias estão nos transformando em escravos/dependentes de todo
esse arsenal tecnológico ao alcance de nossos dedos. Desde as recentes notícias
que revelaram a intensa espionagem da qual os países se utilizam para
bisbilhotar a vida dos próprios cidadãos e vizinhanças, escancarando, entre
outros, que o governo dos EUA tem obrigado o Facebook, Google, Yahoo! e
Microsoft a colaborar com a bisbilhotagem, colocando em xeque o futuro dessas
empresas quanto à credibilidade e respeito à privacidade dos internautas,
também o mundo empresarial vem sofrendo e conhecendo as desvantagens
tecnológicas.
Artigo publicado no jornal
inglês Daily Telegraph revelou que o uso que os funcionários
fazem, para fins pessoais, de redes sociais como Twitter e Facebook durante o
expediente causa às empresas britânicas um prejuízo de mais de R$ 5 bilhões por
ano em tempo desperdiçado. Mais da metade dos empregados entrevistados
admitiram recorrer a essa prática. No Brasil, segundo pesquisa da
Websense/Harris Interactive, o prejuízo é de pelo menos R$ 3 bilhões ao ano. E
com o ingresso no mercado de trabalho de jovens acostumados a ficar plugados o
tempo todo, o problema tende a aumentar ainda mais. Fica a questão: o que as
empresas podem fazer para evitar, ou pelo menos reduzir essa perda?
Sob o ponto de vista jurídico,
a posição predominante é de que o sigilo de correspondência previsto na
Constituição Federal não pode ser usado para encobrir abusos. Exemplo de abuso
é utilizar o e-mail corporativo, que é uma ferramenta de trabalho, para
finalidades que não estão relacionadas ao trabalho. Por esse motivo, é
importante que as empresas estabeleçam, de preferência em contrato, uma
política muito clara sobre o que é permitido ou não no que diz respeito à
utilização de meios eletrônicos pelo funcionário durante o horário de trabalho.
Nas grandes organizações, o tema deve constar no Código de Ética Profissional
da empresa. Algumas, inclusive, já usam sistemas para monitorar os sites que
seus funcionários visitam na internet. Portanto, se um empregado for pego
visitando sites pornográficos ou jogando pôquer virtual quando deveria estar
trabalhando, ele está, sim, sujeito à demissão por justa causa.
Outra questão importante
referente ao uso dos e-mails no ambiente de trabalho é que eles podem ser
usados como provas em ações judiciais relativas a assédio moral e assédio
sexual. O assédio moral ocorre quando o chefe fere, repetidamente, a dignidade
de seu subordinado, dirigindo-se a ele de forma insultuosa, tratando-o de modo
abusivo, denegrindo sua imagem etc. Já o assédio sexual é assim definido pela
lei nº 10.224, de 15 de maio de 2001: “Constranger alguém com intuito de obter
vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de
superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou
função”. O que nem todos se dão conta é que o assédio, seja ele moral ou
sexual, não ocorre apenas através de contato pessoal. Eles também podem ocorrer
através de e-mails cujo conteúdo possa ser considerado insultuoso ou abusivo,
no primeiro caso, ou de conotação sexual, no segundo. E não só podem, como de
fato são usados por funcionários em ações movidas contra colegas, chefes e a
própria empresa. Afinal, conforme diz o Código Civil, “responde o patrão
pelos atos de seus subordinados”. Isto significa que se o empregado sofrer
assédio moral ou sexual por parte de colegas de trabalho ou superiores, o
empregador poderá ser responsabilizado. Contudo, se a empresa possuir uma
política clara sobre o assunto, devidamente comunicada ao funcionário antes da
ocorrência, o empregado considerado culpado poderá ser demitido por justa
causa.
Sendo assim, todo cuidado é pouco. A desculpa de que aquele e-mail abusivo ou malicioso era “apenas uma brincadeira” não vai colar. Prova disso é o aumento das ações trabalhistas relativas ao assédio nas quais os e-mails são utilizados como evidências. Nessas ações, é bom que se diga, os reclamantes costumam pleitear – e com frequência ganhar – significativas indenizações. É um preço alto demais para se pagar por supostas “brincadeiras”.
Ivone Zeger - Advogada, consultora jurídica, palestrante e escritora.
Fonte: https://www.dcomercio.com.br/publicacao/s/espionagem-virtual-o-lado-sombrio-da-internet
**As opiniões
expressas em artigos são de exclusiva responsabilidade dos autores e não
coincidem, necessariamente, com as do Diário do Comércio

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