Apenas
nos primeiros 40 dias de 2025 já aconteceram 21 acidentes aéreos segundo o
painel do Sipaer
O aumento de acidentes de avião pode amplificar
significativamente o medo de voar, uma vez que esse cenário desafia a confiança
fundamental que as pessoas depositam na aviação. Voar é visto como um símbolo
de progresso, liberdade e conectividade. No entanto, essa percepção é
profundamente abalada em períodos de tragédia, transformando a aeronave de um
veículo de materialização das possibilidades da vida em um paradigma de
risco de morte.
Segundo informações do painel do Sistema de
Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Sipaer) da Força Aérea
Brasileira (FAB), em 2025, já aconteceram 21 acidentes aéreos e oito óbitos,
enquanto em 2024 foram 175 acidentes.
"Uma das consequências imediatas do aumento de
acidentes aéreos é o desencadeamento de um medo em massa. Quando há um trauma
social, a sensação de segurança associada às viagens aéreas diminui, e a
ansiedade pode ser ampliada pela cobertura midiática que frequentemente
enfatiza a gravidade em detrimento da raridade dos acidentes", comenta
Marcos Torati, psicólogo, professor e Mestre em Psicologia pela PUC-SP.
Essa perspectiva transforma o voo em uma
experiência cercada por desconfiança e vulnerabilidade. Psicologicamente, o
medo de voar pode não se limitar a um receio específico de estar a bordo de um
avião. Segundo Torati, ele pode fomentar ou eliciar outras ansiedades.
Para o psicólogo, o “medo da queda” não é apenas
literal, mas uma representação simbólica de perda de controle, de impotência e
de desamparo. Isso pode traduzir-se em comportamentos de evitação (não voar,
por exemplo) de situações geradoras de desproteção.
“Outro ponto importante, é o laço social
estabelecido em torno do medo, notícias virais e alarmistas tendem a contagiar
a população, acessando medos mais profundos. Inconscientemente, os acidentes
aéreos podem fomentar angústias de morte e provocar pesadelos com situações de
impotência”, afirma Torati.
Torati ainda aponta que não existe o objeto e
condição de vida que seja livre de riscos. Se buscarmos a esterilização do
risco, a possibilidade é que não aconteça a vida. Perseguir os próprios sonhos,
os desejos e enfrentar os desafios sempre nos colocam numa posição de risco.
Ancorar-se na segurança é também arriscado, pois impossibilita o viver. Certos
riscos são passíveis de negociação, outros apenas devemos admitir.
O papel do consumo de notícias
nesse cenário
A repetição de notícias de acidentes pode reativar
gatilhos em quem já possui um medo latente ou histórico de abalos emocionais
relacionados ao tema. Essa exposição contínua a cenários trágicos pode
intensificar sentimentos de vulnerabilidade e ansiedade.
"Isso ocorre porque, ao se expor continuamente
a esses cenários negativos, o ego estabelece uma conexão com o trágico, associa
voar com arriscar a vida, como se, estatisticamente, viver em terra firme fosse
uma experiência menos ameaçadora do que estar nos ares. O desafio do tripulante
está em ressignificar o avião como mais um veículo viabilizador das
experiências de sua vida na modernidade, mesmo que existam os acidentes”,
comenta ele.
Segundo Torati, o lado positivo do medo de voar
deve ser interpretado como um desejo de autoproteção, um instinto de
autopreservação, e não há nada de errado com isso. A bem da verdade, ninguém é
obrigado a voar, mas, se assim for preciso, esta situação nos convida para um
desafio: assumir nossas escolhas de vida integralmente, sem arrependimentos.
Sendo assim, diante desta dificuldade, os
indivíduos devem procurar ajuda terapêutica e tomar cuidado com o acesso a
notícias trágicas, pois elas vivificam ansiedades paranóicas. Quando
necessário, recorrer ao apoio profissional, são estratégias eficazes para
minimizar os efeitos negativos e manter a saúde emocional em foco.
"O impacto emocional gerado por essas notícias
pode aumentar sentimentos de vulnerabilidade e insegurança, principalmente em
pessoas mais sensíveis. Isso cria um ciclo confuso: se por um lado o consumo
excessivo de notícias alarmantes é a forma de tentar se precaver contra
eventuais ameaças, por outro lado, ela amplifica o medo, afetando a saúde
emocional. De fato, a aviação não é perfeita, mas perfectível e, mesmo com o
medo, a nossa fé e esperança nela ainda prevalece, por isso continuamos
embarcando”, finaliza Torati.
Nenhum comentário:
Postar um comentário