Quando educamos uma pessoa, o objetivo é formar um
indivíduo capaz de interpretar o mundo à sua volta para tomar decisões e fazer
escolhas diante dessa realidade. No entanto, de tempos em tempos convivemos com
transformações tão profundas que a maneira como o processo educacional é
construído precisa passar por uma revisitação. E esse movimento está
acontecendo neste exato momento. Impulsionado pela celeridade no
desenvolvimento e difusão da inteligência artificial, temos observado claros
gestos de readequação em vários setores.
Na educação básica, por exemplo, temos visto um
enorme temor principalmente pelo impacto da ferramenta na questão avaliativa
dos alunos. Isso porque, o estágio atual da IA, popularizada sobretudo pelo
ChatGPT, já permite que, em poucos comandos, o estudante tenha em suas mãos uma
ferramenta capaz de resolver problemas ou exercícios escolares de forma
imediata.
No entanto, a verdade é que isso é o menor dos
problemas pensando no processo de aprendizagem. Mesmo porque, condutas
controversas voltadas à driblar os mecanismos de avaliação já existem desde que
era uma criancinha. O que deve acontecer, assim como já ocorreu anteriormente,
tal como na época da popularização do Google, é uma readaptação.
O grande cerne passa realmente pelo desenvolvimento
de um novo método de estudos e pesquisas. Até porque, toda a forma de
relacionamento do estudante com o conteúdo já está sendo totalmente
transformada perante o avanço da IA. Atraídos pela facilidade e o alto nível de
assertividade das respostas disponibilizadas pela tecnologia, os alunos tendem
a deixar o seu crivo crítico de lado para utilizá-las praticamente de forma
automática. Isso porque as narrativas construídas pelas ferramentas são
expostas de tal forma que será, ou melhor, já está sendo difícil criar qualquer
tipo de resistência.
Já existe até mesmo uma definição teórica que dá
nome ao fenômeno. Trata-se do “dadoísmo”. Mencionado pela primeira vez em 2013,
pelo jornalista David Brooks, o conceito descreve como os insumos gerados pelas
ferramentas tecnológicas geram padrões comportamentais na sociedade, e como ela
acaba se utilizando dessas informações para guiar a sua vida, ainda que de
forma involuntária.
Sendo assim, o grande desafio do momento na
educação passa pela preparação dos alunos em relação à interpretação e análise
de todas as narrativas expostas pelo ecossistema à sua volta. Quando digo isso,
vale ressaltar, não falo somente relacionado a qualidade dos conteúdos, o que
já é uma dificuldade e tanto, mas sobre a veracidade dos mesmos.
Afinal, não podemos esquecer que a IA apresenta uma
capacidade de produção em massa de conteúdo, alavancando tanto a criação de
concepções positivas, como também para a elaboração de conteúdos falsos - as
chamadas deepfake. Além disso, vale reforçar que a atual capacidade técnica das
IAs, especialmente o Chat GPT, ainda apresenta algumas ‘alucinações’, fenômeno
em que ela não identifica uma resposta adequada para a solicitação do usuário e
acaba entregando dados e informações aleatórias para solucionar a dúvida.
Nesse sentido, o combo entre a absorção
praticamente sem qualquer crivo por parte dos alunos e os perigos existentes
dentro dos conteúdos reproduzidos pelas plataformas, sobretudo na questão da
genuinidade, traz uma ameaça pela formação de uma geração pouco autônoma em
suas decisões. Sem uma regulamentação sobre o conteúdo reproduzido, ou uma
discussão maior sobre o uso das IAs na formação educacional, corremos o risco de
impulsionar a narrativa gerada artificialmente como uma verdade absoluta a ser
seguida.
Por outro lado, há de se ressaltar também o
potencial benéfico, se bem utilizada, que acompanha a tecnologia, sobretudo na
própria educação. Um exemplo prático é a construção de narrativas antagônicas
entre si e a criação de discussões para que os estudantes possam exercitar o
seu pensamento crítico perante diferentes pontos de vista.
Prós e contras a parte, o surgimento de uma nova
ferramenta de tamanho potencial, como é o caso da IA, traz consigo uma
possibilidade de alavancar ainda mais os métodos de ensino e de formação de
toda uma geração. Nesse caso, é preciso que o ecossistema escolar deixe o
saudosismo de lado e utilize tudo aquilo que já aprendemos, mesmo que por meio
de metodologias mais arcaicas, para decidir qual o melhor caminho a ser seguido
neste novo mundo. Até porque a educação segue e continuará sendo a base mais
importante para uma sociedade emocionalmente saudável.
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