Psicóloga avalia
como são criados e como podem ser tratados os traumas humanos, tema de
documentário e livro recém-lançados.
“Trauma não é o que acontece com você. Trauma é o
que acontece dentro de você, como resultado do que acontece com você”. Esta
afirmação é do médico Gabor Maté, criador do recente lançamento The Wisdom of Trauma. O documentário
expõe as epidemias relacionadas à ansiedade, doenças crônicas e uso abusivo de
substâncias tóxicas enfrentadas pela sociedade ocidental e é resultado da
experiência do médico, que dedicou sua vida a compreender a conexão entre
doença, vício, trauma e sociedade.
A temática ganha ainda mais relevância, a partir de
pesquisas recentes sobre saúde mental. Um estudo realizado pelo Ministério
da Saúde revela que a ansiedade é o transtorno mais presente desde o
início da pandemia. Os resultados preliminares foram obtidos a partir de um
questionário online em maio de 2021 e apontam uma elevada proporção de
ansiedade (86,5%) e uma moderada presença de transtorno de estresse
pós-traumático (45,5%).
Em seu livro ‘Mover o Pensamento, Sentir o
Movimento – Reflexões sobre os desafios do mundo atual em psicoterapia’,
lançado em junho, Maria del Mar, psicóloga, psicoterapeuta e formadora
internacional, cria um espaço para a reflexão sobre traumas, sobre o poder
transformador das crises e a importância da resiliência frente aos desafios do
mundo atual.
De acordo a psicoterapeuta, um determinado
indivíduo que passa por uma situação traumática pode sentir medo e ficar
impressionado, enquanto outra pessoa que passa pela mesma experiência pode
ficar em choque, porém agradecido por estar vivo. As reações podem variar de
pessoa para pessoa, mas como é possível explicar essa diferença?
“Cada pessoa tem sua própria forma de reagir a
situações de risco de vida ou experiências inesperadas. Uma experiência
traumática é um evento que nos destitui da capacidade de tomar decisões, que
surge de forma imprevista e que para voltarmos a ter o sentido de segurança,
precisamos restabelecer a capacidade de tomar decisões, restabelecer um sentido
de governança”, reflete Maria del Mar.
Os traumas podem ocorrer em fases muito precoces da
vida, sem que estejam no consciente de quem os vivencia. “O sistema neurológico
demora anos para se formar por completo. O bebê depende da mãe para se
alimentar e para se sentir seguro. O sentido de segurança é construído neste
vínculo dos primeiros anos de vida. É fato que, quem desenvolve bom vínculo
inicial possui uma capacidade de resposta do sistema nervoso muito superior se
comparado a quem não teve este vínculo inicial”, detalha a terapeuta.
Durante a infância são criados resíduos de
situações que ficam acumulados no sistema nervoso, chamados de cristalizações,
que ajudam a entender por que temos certo tipo de reações, comportamentos,
rituais, formas de nos vermos a nós próprios e que podem ser totalmente
distintas de como os outros nos veem. O trauma é uma consequência desses
resíduos gerados na infância.
Maria del Mar esclarece que o sistema nervoso é um
sistema de informação que se comunica o tempo todo com os sistemas endócrino,
imunológico e cardiorrespiratório, afetando a fisiologia humana desde o tônus
muscular e até a forma como se dá o relacionamento com o mundo exterior. É como
uma orquestra, que alia situações do meio externo com o mundo interno do ser
humano.
“O sistema nervoso autónomo é composto por dois
sistemas que o regulam, o sistema Simpático e o Parassimpático. Numa linguagem
simplista, o Simpático é o que gera o movimento, é o que nos deixa alerta em
situações de risco. Ele é o responsável pela nossa sobrevivência, pela
mobilidade que nos apoia para as respostas de stress, luta, fuga e defesa. Já o
Parassimpático é o que nos faz parar como resposta à sobrevivência, gerando um
estado de congelamento. Fisiologicamente é responsável pela digestão, por
baixar o ritmo cardíaco, por dormir bem, por meditar”, avalia.
Muitas vezes, pessoas têm vontade de mudar, querem
fazer coisas diferentes só que o corpo possui um ritmo mais lento do que a mente.
Mudar a mente não significa mudar o corpo, por outro lado mudar o corpo permite
a mudança da mente, visto que muitas das sensações desagradáveis estão no
corpo, ainda que a mente não as conheça ou sequer se lembre delas.
“A qualidade dos padrões de vínculo são os maiores
preditores para a saúde ou resiliência mental. E isso explica, portanto, porque
é que, diante do mesmo evento, uma pessoa responde de uma forma extrema e a
outra com mais tranquilidade e assertividade”, finaliza a terapeuta.
Maria del Mar Cegarra Cervantes - Psicóloga, Psicoterapeuta, formadora internacional e escritora. É pioneira e visionária na área de saúde integral do ser humano. Psicóloga Clínica, doutoranda em Psicossomática e Biologia Neural, Psicoterapeuta Somática, diretora do CPSB – Centro de Psicoterapia Somática, para Portugal e Espanha, Psicoterapeuta conjugal, naturopata, homeopata. Ex-presidente da Associação Portuguesa de Psicoterapia Corporal (APPC).
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