Espaços devem ser
alterados e equipes precisam de orientações específicas para promover
integração
Em 03 de dezembro, o mundo comemorou o Dia
Internacional da Pessoa com Deficiência, instituído pela Organização das Nações
Unidas (ONU) em 1992 para celebrar o fim do ciclo iniciado em 1983 (ano em que
a entidade adotou o Programa Mundial de Ação a respeito das Pessoas com
Deficiência). A própria Organização estima que 10% da população mundial tenha
algum tipo de deficiência.
No caso da professora e tradutora Cristina Faraj, a
deficiência motora teve origem no nascimento, devido à falta de oxigenação no
cérebro por um curto período (anoxia). “Hoje tenho um problema de coordenação
motora. É uma condição que me fez enfrentar bullying e preconceito, seja na
formação escolar, seja na inserção do mercado de trabalho. Em alguns momentos
tive vontade de tentar esconder essa limitação, mas hoje sou feliz pelas minhas
conquistas”, afirma.
Cristina é formada em Letras (Inglês-Tradução) pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e ingressou no Estado
logo na primeira vez em que prestou concurso público. Apesar do sucesso
profissional, logo no início da carreira a professora teve dificuldades para conseguir
um emprego e sentiu que a deficiência motora era uma das principais razões para
as recusas.
Legislação e inclusão
São consideradas pessoas com deficiência aquelas
que têm impedimento de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou
sensorial, que impeça a participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade
de condições. No Brasil, o Decreto nº 5.296/2004 descreve os diferentes tipos
de deficiência.
Além disso, a Lei nº 8.213/1991, conhecida como Lei
de Cotas, prevê uma série de medidas com o objetivo de inserir e integrar
pessoas com deficiência no mercado de trabalho. Empresas a partir de 100
colaboradores têm a obrigação de empregar uma parcela de pessoas com algum grau
de deficiência. A cota mínima varia entre 2% e 5%, dependendo do total de
trabalhadores na empresa.
Para a fonoaudióloga do Hospital Paulista
Christiane Nicodemo, no entanto, as empresas devem se preocupar em não apenas
empregar a pessoa com deficiência, mas também integrá-la à empresa, respeitando
suas dificuldades e promovendo suas potencialidades.
“Quando contrata e emprega um funcionário com
deficiência, a empresa não está apenas cumprindo a lei. Está promovendo uma
função social, humanitária. Para isso, é preciso que a área de Recursos Humanos
tenha a sensibilidade de facilitar o ambiente de trabalho de acordo com a
deficiência do novo colaborador, capacitar os gestores e os demais
funcionários, de modo que a pessoa não se sinta acuada, preterida ou
discriminada em seu cotidiano laboral”, avalia a especialista.
Cada forma e grau de deficiência requerem
adaptações específicas no ambiente de trabalho. Contratar um cadeirante para um
local com escadas e sem elevadores/rampas, por exemplo, impede que o
trabalhador interaja corretamente com os colegas e superiores e limita seu
desenvolvimento.
Deficientes auditivos
No caso específico dos deficientes auditivos, a
fonoaudióloga Christiane ressalta que um dos aspectos mais importantes é que o
ambiente de trabalho – principalmente no espaço de quem tem alguma limitação –
seja bem iluminado, com sinalizações claras e de fácil acesso. Além disso, é
essencial que os outros funcionários sejam orientados sobre as formas corretas
de interagir com o deficiente auditivo.
“É preciso sempre sinalizar a essa pessoa quando
desejamos falar com ela. Dê um toque no ombro, se aproxime, fale de frente à
pessoa. Ao sair para almoçar ou tomar um café, convide-a. Promova o deficiente
auditivo ao convívio com o restante da equipe e evite informar os funcionários
apenas pela linguagem falada. Invariavelmente, você irá se movimentar e a
pessoa com limitação auditiva não conseguirá acompanhar a mensagem. Além disso,
fique atento às próprias estações de trabalho. As divisórias precisam ser, no
máximo, de acrílico para permitir que o deficiente auditivo tenha uma melhor
compreensão da comunicação”, explica.
Nos últimos anos, iniciativas públicas e privadas
têm oferecido cursos de capacitação para pessoas com deficiência. Um dos
objetivos é afastar completamente uma das teses de muitas empresas que não
cumprem a lei, ao alegarem que o mercado não oferece deficientes físicos
capacitados.
“O governo de São Paulo vem promovendo cursos
gratuitos de qualificação. A Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN) também
oferece um programa de cursos gratuitos. É muito importante que outros setores
da indústria e de serviço desenvolvam iniciativas semelhantes, de modo a
capacitar esses profissionais para um leque maior de funções”, diz Christiane.
Reabilitação
Quem tem algum grau de deficiência pode também
reabilitar-se a partir de terapias específicas, aparelhos de auxílio e
cirurgias que o ajude a diminuir a limitação, seja ela qual for. Cristina
destaca, no entanto, que a abordagem da reabilitação ao profissional com
deficiência deve ser feita de um modo que respeite sua própria vontade, sua
independência e seus interesses profissionais.
“Por exemplo, passei por uma escola em que sofri
certo preconceito de alunos e colegas da docência por conta da minha limitação
motora. A então diretora insistia constantemente que eu deveria passar pela
readaptação. Para uma pessoa que tem alguma deficiência, isso não é algo fácil
de ouvir. Até que um dia, sem qualquer aviso prévio, fui chamada a uma reunião
na qual me informaram que eu teria de começar a readaptação. Fiquei sem reação,
saí bem chateada. A readaptação me fez bem, mas a forma como foi conduzido esse
pedido foi desgastante”, conta.
Independentemente do tipo e do grau de deficiência,
é importante ressaltar que profissionais com alguma limitação podem realizar
uma enorme gama de funções. Para isso, é preciso que a lei seja cumprida, mas
também que empresas, gestores de recursos humanos e os próprios trabalhadores
se conscientizem sobre a importância de inserir e integrar pessoas com
deficiência no mercado de trabalho.
“O trabalho tem também a função de ressignificar a
vida da pessoa com deficiência. Uma cultura de inclusão permite esses
profissionais participem ativamente do ambiente de trabalho, compreendendo suas
limitações, mas também cientes do quanto podem evoluir e crescer”, afirma a
fonoaudióloga.
“Entendo que as pessoas devem se esforçar para
evoluir, mas quem tem alguma dificuldade não pode ser deixado para trás. Fala
isso como educadora e como alguém que tem uma limitação motora. É preciso
promover essa inclusão e ajudar quem tem qualquer tipo de deficiência a
caminhar lado a lado com as outras pessoas”, conclui Cristina.
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