Opinião
Em meio a uma pandemia global que atinge todo o
planeta de maneira devastadora, contaminando mais de 26 milhões de pessoas e
matando quase 900 mil, e durante uma das mais intensas crises econômicas já
vividas nas últimas décadas, com o PIB do 2º trimestre caindo a -9,7%, o
brasileiro encontrou uma maneira de rir e fazer meme.
E a responsabilidade é de ninguém menos que o
próprio Banco Central, que resolveu lançar uma nova cédula
de real, no valor de R$ 200, tendo como símbolo o lobo-guará, animal que faz
parte de nossa fauna e que, agora, integra o ‘time’ de representantes de nossa
moeda, formado também por tartaruga-de-pente (R$ 2), garça branca (R$ 5), arara
vermelha (R$ 10), mico-leão dourado (R$ 20), onça-pintada (R$ 50) e garoupa (R$
100).
Nosso querido beija-flor, que ilustrava a nota de
R$ 1, saiu do grupo em 2005, quando a cédula deixou de ser fabricada no Brasil.
Não bastasse toda a ‘campanha’, tipicamente
brasileira, clamando pelo uso do vira-lata caramelo como mascote da cédula de
R$ 200, o debate sobre a nova nota foi muito além. E isso nos traz cinco
grandes reflexões.
O deboche como estratégia de marketing
Se o brasileiro quer o vira-lata caramelo como
protagonista da nova nota, afinal, nenhum outro bicho representa tão bem o
nosso país, o Banco Central, debochado, criativo e inteligente, usou o
famigerado a seu favor. Primeiramente, ao dizer que cogitava, sim, trazer o
canino para a cédula. Mas, na verdade, a ‘ação relacionada ao animal’, citada
pela diretora de administração do BC, Carolina de Assis Barros, referia-se à
campanha de lançamento, divulgada nas redes sociais do órgão. Na peça, um
vira-lata caramelo pede para a população receber o lobo-guará (ou 'caramelo do
serrado') com carinho.
É sempre bom lembrar a importância do branding
Entre os assuntos mais comentados após a divulgação
da nova cédula, seu layout foi, com certeza, o principal. E aqui, não estou
falando – ainda, fica para o próximo item – sobre estética, mas sim sobre
branding e alinhamento de marca. A diferença entre fontes, elementos tamanho e
estrutura é bastante perceptível em relação às demais notas. Nunca é demais
relembrar que nós, profissionais de comunicação e marketing, temos um
compromisso com a identidade de nossas marcas e produtos, e, geralmente, os
reflexos causados por desalinhamentos de KV são imediatos.
Não subestime a estética
E agora sim, além do branding, a estética como um
todo. O lobo-guará utilizado na representação está em uma posição desfavorável,
com aplicação que remete a imagens de baixa qualidade e com composição que
prejudica sua visualização. Isso, claro, sem citar o ‘arbusto’ destoante
localizado acima da grafia ‘duzentos reais’. Independentemente de questões de
segurança – que são, claro, absolutamente indispensáveis -, não podemos
subestimar a estética de qualquer item, seja marca, produto, embalagem ou
acessório.
Qual a necessidade disso... agora?
São diversos os argumentos utilizados para
justificar a criação da nota de R$ 200 neste momento. Mas, não podemos
desconsiderar a crise econômica pela qual o Brasil está passando. E com isso,
vem a pergunta: precisávamos destes custos de produção na Casa da Moeda em
pleno período de pandemia? E ainda sobre o lançamento da nova cédula, deixo
para os colegas de compliance a reflexão sobre potencial aumento de crimes como
corrupção e lavagem de dinheiro, que são comumente facilitados com uso de notas
de maior valor.
Use a ‘fábrica de memes’ a seu favor
E por último, o principal aprendizado: planejar uma
boa estratégia de marketing no Brasil sem levar em consideração que somos a
maior fábrica de memes do planeta é quase impossível. Nesse sentido, o Banco
Central soube aproveitar muito bem a repercussão – que poderia ter tomado uma
conotação negativa – a seu favor. Trazer o vira-lata caramelo para sua campanha
de lançamento foi uma das maiores sacadas da publicidade brasileira em 2020.
Se depois de seis meses de isolamento social e de
números tão assustadores (seja na pandemia ou na economia) nós encontramos na
nova nota de R$ 200 razões para nos distrairmos, que assim seja.
Cristiano Caporici - diretor de Comunicação e
Marketing da Tecnobank
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