Pressa e
congestionamentos amplificam sentimentos como raiva e irritação
Exercitar
a empatia é uma das recomendações para minimizar o estresse do trânsito
Imagem: Shutterstock
Motoristas, motociclistas, pedestres, passageiros e
ciclistas estão no trânsito se deslocando para diferentes destinos e com
objetivos igualmente diversos: retorno do trabalho, ida a um compromisso
importante ou apenas a passeio. Porém, todos se deparam com situações
estressantes, como sinfonia de buzinas, congestionamentos e desrespeito às leis
de trânsito. Não raro, esse ambiente democrático torna-se hostil e se revela
ideal para a troca de afrontas entre os usuários. Para que acidentes não agravem
esse cenário, manter a paciência e a calma são determinantes. Conforme estudo inédito do Instituto de Transportes da
Virginia Tech, associadas à direção, raiva, agitação e tristeza aumentam em
quase dez vezes os riscos de colisões. Para entender em que momento dirigir
passou a ser encarado como um ato estressante, a Perkons ouviu alguns especialistas.
Antropólogo e professor da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Bernardo Conde enxerga o trânsito
brasileiro como um retrato de traços culturais específicos, como a
hipervalorização da emoção. “As pessoas manifestam suas vontades individuais
também em espaços públicos, como o trânsito, onde o esperado é se agir com a
razão. Por isso sorrimos ao pedir vez a outro motorista, pois assim,
demonstramos emoção. Da mesma forma, agimos emocionalmente quando ao invés de
nos planejarmos para sair uma hora antes para percorrer determinado trecho,
saímos com atraso de 30 minutos e a mesma expectativa. O resultado é a
frustração e, por consequência, o estresse”, elucida. Segundo ele, as
oscilações de humor também respingam nas interações entre os usuários, que, em
sua maioria, se tratam com distanciamento. “Somos um povo muito cordial e
solidário com o que nos comove, mas não com os desconhecidos, como é o caso do
motorista ao lado”, completa.
Conforme Conde, mesmo em meio ao sentimento de
intolerância generalizada que se alastrou pelo país nos últimos tempos, a falta
de gentileza no trânsito não se originou na contemporaneidade, mas veio se
consolidando há décadas. “O trânsito está mais caótico e nós menos tolerantes.
O estresse traz consequências e agora, com mais informação e divulgação do que
acontece no dia a dia, a sensação é de que tudo está pior. Não se pensa no bem
comum. Não consigo perceber que sou tanto quem tem pressa dentro do ônibus,
como quem está no ponto raivoso com o motorista que não parou”, analisa.
Dominar as próprias emoções pode garantir um
trânsito harmonioso
Apesar de decisiva, a abordagem emocional do
trânsito ainda é recente e, conforme o vice-presidente do Observatório Nacional
de Segurança Viária (ONSV), Mauro Gil, perde espaço para pontos também vitais,
como a importância do cinto de segurança e os riscos de associar ao volante
celular ou bebida alcóolica. “Estamos predispostos a reagir de maneira
agressiva em situações desconfortáveis e embora essa tendência não seja
exclusividade do trânsito, costuma ser transportada para ele com frequência. O
perigo é o carro ser visto como válvula de escape, mesmo sendo uma arma”,
ressalva.
Perceber o trânsito como um espaço democrático,
compartilhado e que exige respeito e reciprocidade é, para Gil, o primeiro
passo para impedir que as emoções aflorem de maneira nociva. “As pessoas pensam
que ditam as regras do trânsito, quando, na verdade, o que acontece é o
contrário. Se não houver esse discernimento, os acidentes continuarão a
ocorrer. É preciso refletir e questionar as próprias condutas”, aconselha.
Recomendações como essas são a premissa básica
do Programa de Educação Emocional no Trânsito (PEET), dirigido pelo educador de trânsito Rodrigo
Ramalho. Ele explica que a associação entre estresse e volante remonta à década
de 1990 e é conhecida como fenômeno road rage (raiva
no trânsito). Mas foi no ano de 2006 que países como Brasil, Rússia e Estados
Unidos passaram a apresentar casos mais recorrentes de conflitos violentos no
trânsito. Na análise do educador, uma das razões que corroborou para a difusão
desses embates foram os recordes de congestionamentos registrados em algumas
capitais a partir da década de 2000. E a cada ano, os recordes são superados. “A falta de espaço e de tempo tornaram o ambiente
do trânsito muito mais competitivo na década de 2000 do que nos anos 80 e 90.
Soma-se a isso, um universo de celulares e outros dispositivos de registro de
imagens que flagram esses conflitos”, ressalta.
Sejam os suscitadores da raiva os engarrafamentos
ou a postura dos demais usuários, Ramalho acredita ser possível reverter um
cenário a priori agressivo em um espaço de convivência pacífica e harmoniosa.
“Ter domínio do próprio comportamento e relacionar-se com mais inteligência
emocional é um passo importante para o sucesso na vida pessoal, profissional e
também no trânsito”, salienta. Para equalizar as emoções e evitar que o
estresse interfira na saúde física e mental, ele orienta o desenvolvimento da
empatia, o controle da raiva e a aplicação de técnicas de comunicação positiva.
Beatriz Souza
Assessoria de Imprensa Perkons
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