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terça-feira, 31 de março de 2020

A importância da alimentação no período de quarentena



freepic.diller

Devemos ficar atentos a exageros durante o período e praticar, cada vez mais, o conceito de mindful eating para o bem-estar prolongado


Com a pandemia do coronavírus, muitas pessoas têm se isolado, evitando as saídas de casa, exceto para atividades essenciais. E com isso, entre tantas preocupações com relação à saúde e o bem-estar de todos, devemos dar a devida importância também à qualidade da alimentação, principalmente durante o período de isolamento social, pois uma boa refeição reforça o sistema imunológico, que pode deixar seu corpo mais resistente e menos suscetível, bem como buscar uma consciência maior durante a alimentação. Por isso, uma das práticas mais benéficas para esse período é o mindful eating.


Mas o que é mindful eating?

O termo pode ser traduzido como “alimentação consciente” e visa estimular o hábito de uma alimentação mais equilibrada e saudável, aliando também à qualidade, atenção e presença no ato da refeição. Isso porque não basta apenas ter um bom alimento no prato, e sim se alimentar com tranquilidade e serenidade. A hora da refeição deve ser um momento sem distrações de tv ou celular, focando apenas no alimento, o que faz com que a ocasião se torne mais prazerosa e benéfica, pois o mindful eating se trata da atenção ao que e como você está enquanto come.

Neste período de isolamento social, pode acontecer que as pessoas “comam mais” do que o comum e frequentemente em frente à tv, computador ou celular, até considerando tédio, ansiedade, estresse e outros sentimentos que possam surgir durante a quarentena. Por isso, é tão importante as boas práticas alimentares aliadas ao comportamento e ao prestar atenção às sensações durante as refeições.

É importante lembrar que muitas pessoas buscam nos alimentos um conforto ou uma fuga para os sentimentos de angústia e ansiedade, tão comuns neste momento de estresse. Para evitar que isso reflita em outros problemas de saúde, o ideal é que a pessoa tenha a real consciência de sua sensação de fome, sabendo diferenciar se a busca pela refeição no momento está baseada nos sentimentos. Se este for o caso, uma sugestão seria substituir o ato de comer à alguma ação benéfica, como tomar um copo com água, ou um chá, que contribuem para a hidratação, ou apenas desviar a atenção para uma outra atividade, como concluir um trabalho para quem está em home office, ou arrumar algo na casa que esteja precisando ser revitalizado.

Na seleção dos alimentos e no preparo da refeição, a sugestão é que se prefira alimentos em natura e o menos processados possível, monte um prato bem colorido, por exemplo, com verduras e legumes.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta a obesidade como um dos maiores problemas de saúde pública mundial. No Brasil, mais de 50% da população está com sobrepeso. De acordo com o site da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO), a região do sul do Brasil concentra a maior porcentagem de adultos com excesso de peso, 56,08%, enquanto o sudeste apresenta a maior porcentagem de crianças com excesso de peso na infância (entre 5 e 9 anos) 38%.

O mindful eating existe para ser um aliado na melhoria da qualidade da refeição e da qualidade de vida. Outro aspecto importante é, na medida do possível, realizar exercícios físicos neste período de quarentena.





Dr. Andrea Bottoni - médico nutrólogo, instrutor de mindful eating, mestre em nutrição e doutor em ciências pela UNIFESP, coordenador da equipe de nutrologia do Hospital IGESP e supervisor do programa de residência médica em nutrologia do hospital.


Hospital IGESP


Dependentes de crack são vulneráveis ao Coronavírus e suas complicações


Psiquiatra destaca que o vírus ataca o trato respiratório, muitas vezes já comprometido em dependentes de tabaco e usuários de cigarros eletrônicos, maconha e outras drogas


Pessoas que estão em vulnerabilidade social nas ruas das grandes cidades, principalmente os dependentes químicos, preocupam profissionais da área da psiquiatria em tempos de pandemia da Covid-19. Por atacar os pulmões, o novo coronavírus pode ser uma ameaça especialmente importante para quem fuma tabaco, maconha ou que utiliza outras drogas fumadas como o crack.

Quem faz o alerta é psiquiatra Alessandra Diehl, que é vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos sobre o Álcool e outras Drogas (ABEAD). “Além disso, os indivíduos com transtornos por uso de substâncias têm maiores chances de experimentar falta de moradia e estar em situação de rua. Tais circunstâncias apresentam desafios únicos em relação à transmissão do vírus que causa a COVID-19, cuja prevenção está relacionada às medidas de higiene e isolamento social”, afirma Alessandra.

Parte dos usuários de drogas vive nas marquises de prédios e viadutos nos grandes centros urbanos. Um levantamento sobre o perfil de usuários de drogas da Cracolândia, em São Paulo, revela que a população do antigo fluxo de dependentes químicos no chamado “Quadrante Helvétia”, na região da Luz, mais do que dobrou em um ano: de 709 pessoas em abril de 2016 para 1.861 pessoas em maio de 2017. O aumento corresponde a 160% e foi divulgado pela Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social de São Paulo.

A Prefeitura do Rio identificou 150 locais da cidade nos quais dependentes químicos se reúnem para fazer uso de crack e outras drogas. Ao todo, esses pontos contabilizam quase 1.939 pessoas. O Centro do Rio é o bairro onde há maior concentração de dependentes químicos: são cerca de 320 usuários espalhados por locais como as avenidas Rio Branco e Presidente Vargas, duas das principais vias da região, além do Campo de Santana e Cinelândia. Na Zona Sul, a turística Copacabana é o segundo bairro onde mais se agrupam usuários de substâncias (cerca de 115 dependentes). Bangu, Complexo da Maré e Tijuca, regiões na Zona Norte, também convivem com a presença dos dependentes diariamente em suas ruas. Esses dados constam do levantamento mais recente da Secretaria Municipal de Assistência Social e Direitos Humanos (SMASDH), realizado em 2018.

Em Curitiba, no Paraná, uma pesquisa realizada pela Fundação de Ação Social (FAS) apontou que, no período de 20 dias, no ano de 2016, 1.715 pessoas se encontravam em situação de rua na cidade. Ao serem questionados sobre os motivos que os levaram à situação de rua, os quatro motivos principais foram: envolvimento com drogas, 27%; álcool, 24,7%; conflitos familiares, 22,3%; e desemprego, 9,9%. Como nesta pergunta o entrevistado poderia responder mais de uma alternativa, 13% das pessoas marcaram como motivo único o uso de drogas e 8% o consumo de álcool.

Para Alessandra Diehl, esse breve panorama visto nas três capitais brasileiras demonstra a necessidade de investimento em políticas públicas voltadas para a população que vive nas ruas, entre eles os dependentes químicos, durante a crise do novo coronavírus. “São incontáveis quantas pessoas transformam as ruas em moradia em todo o Brasil. Grande parte delas vive de esmolas, doações e furtos e com o fim do movimento nos centros urbanos, determinado pelas autoridades para conter a escalada das infecções, estão, literalmente, sozinhas. Especialmente nesse momento, essa parcela da população não pode ser abandonada. Elas convivem diariamente com a fome e, provavelmente, o medo do contágio e as medidas de prevenção devem ficar em segundo plano. Mesmo porque, não sabemos se têm informações suficientes para evitarem o contágio da Covid-19. Água e sabão, por exemplo, que não podem faltar no combate da doença, não são acessíveis para os moradores de rua”, ressalta Alessandra.


Por que a Covid-19 pode ser fatal entre os dependentes químicos?

A psiquiatra Alessandra Diehl destaca que o vírus ataca o trato respiratório e parece ter uma taxa de mortalidade mais alta que a gripe sazonal. De acordo com a especialista, a taxa exata da mortandade ainda é desconhecida, pois depende do número de casos não diagnosticados e assintomáticos, e são necessárias análises adicionais para determinar esses números.

“Até agora, as mortes e doenças graves que iniciam com a COVID-19 parecem concentradas entre pessoas idosas e com problemas de saúde subjacentes, como diabetes, câncer, condições neurológicas e condições respiratórias. Portanto, é razoável se preocupar que a função pulmonar comprometida ou a doença pulmonar relacionada à história do tabagismo, uso de maconha e ou crack como a doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Todos esses fatores corroboram para incluir os dependentes na população de risco”, diz Alessandra.

Ela acrescenta que os dados têm mostrado que condições prévias, incluindo DPOC, doenças cardiovasculares e outras doenças respiratórias, pioram o prognóstico em pacientes com coronavírus, que afeta o sistema respiratório. “Embora os dados até o momento sejam preliminares, eles apontam para a necessidade de mais pesquisas para esclarecer o papel das doenças subjacentes e outros fatores na suscetibilidade a COVID-19 e seu curso clínico. Entre estes fatores certamente inclui o tabagismo, o uso de maconha fumada e o consumo de crack”, finaliza a psiquiatra.

Outro fator que preocupa a vice-presidente da ABEAD em relação às pessoas com transtornos relacionados ao uso de substâncias inclui a ausência de cuidados médicos. “O acesso limitado aos cuidados de saúde coloca as pessoas com dependência química em maior risco de muitas doenças e o quadro pode se agravar nesse momento de crise do novo Coronavírus, que provavelmente vai sobrecarregar o sistema de saúde. Mesmo que hospitais e clínicas forem ampliados, pode ser que as pessoas com dependência, que já são estigmatizadas e não são atendidas pelo sistema de saúde, experimentem ainda mais barreiras ao tratamento da COVID-19”, enfatiza Alessandra.

Na opinião dela, é muito importante que os gestores de saúde possam garantir que os pacientes usuários de crack e outras drogas não sejam discriminados se um aumento nos casos de COVID-19 colocar uma carga adicional em nosso já frágil sistema de saúde. “Neste momento, tudo que não precisamos é de mais estigma, julgamentos adicionais e moralismos de extermínio, não merecedores ou impuros. Esta guerra é de todos nós!”, finaliza a vice-presidente da ABEAD.



Desespero em tempos de crise: o que há de humano em meio à barbárie?


O momento atual que estamos vivendo nos permite observações interessantes acerca do comportamento humano - e o que não dá para negar é a força social exercida sobre o indivíduo. Primeiro, pelo bombardeio de informações de fontes diversas, algumas confiáveis, outras nem tanto, mas que chegam à população com status de verdade e a colocam em um movimento de “barata tonta”, com a pergunta “corro para onde”? Somos alvejados cotidianamente pelas posições sensacionalistas daqueles que ou têm em mente o intuito de manipular as informações, ou por aqueles que estão desesperados e, desenfreadamente, reproduzem-nas sem buscar conhecer as fontes ou ponderar a lógica do que está sendo veiculado. E diante disto, que parece um caos, ou melhor, uma “torre de Babel” com muitas “línguas” sendo faladas ao mesmo tempo, mas não sendo compreendidas, instala-se um comportamento coletivo de “histeria” (denominariam alguns colegas), em que sem nem bem saber porque, seguem a “onda”.

Assim tem se apresentado o cenário mediante uma crise instaurada na saúde, cujas consequências atingem os âmbitos econômico, cultural, geopolítico, dentre outros. As pessoas mantêm comportamento tanto de avidez pela informação sobre os trágicos efeitos de uma epidemia (já pandêmica), como alimentam atitudes de discriminação (preconceitos) em relação ao que consideram a origem do problema, de egocentrismo na busca da garantia de seu bem estar em detrimento dos demais (vide as compras desenfreadas, brigas por artigos de higiene), acirrando as desigualdades sociais tão presentes em sociedades capitalistas. A saúde, nesse contexto, compreendida como produto, é o mote da vez: com a corrida em busca da “cura” (vacina ou controle), há nações que querem chegar antes, sem considerar as outras como seus pares, quase num conflito armado.

Então podemos questionar para que existem as crises. Elas representam a possibilidade de ruptura de algo que já estava nos “trilhos”. Servem para questionar o que aparentemente estava em ordem, ou deflagram o que já não estava bem (mas ainda estava no escuro). Mesmo que o momento de ver sob a luz seja dolorido, o conhecimento - ou o reconhecimento - de que algo não está bem e impele mudanças, também pode ser libertador. Dessa forma, o que temos visto é a deflagração do que há de mais humano, os processos de identificação (no sentido de se sentir o mesmo) e de diferenciação (de comparação e distanciamento), que se apresentam como uma luta por sobrevivência (para alguns a qualquer preço, pois a civilidade depende de educação social - precisa ser aprendida para convivência em sociedade). A diferença é de que nível de sobrevivência estamos falando. Há possibilidade de viver sozinho? Fazemo-nos pelas relações sociais. Estas nos constituem. Então, se vivo interações de reconhecimento, consigo exercitar a empatia, a alteridade, com mais propriedade do que aqueles que foram privados dessa aprendizagem.

Em um sistema que teima ideologicamente em disseminar a individualidade como ideal a ser conquistado, inibe-se o “espírito” gregário, de identificação sobre a mesma “natureza” (somos feitos de sangue e carne, que dói, que chora, que se apaixona...). A quem serve destituir o valor social de nossa constituição? A um plano de governança que nos quer ver digladiando, lutando pelo espaço, pela comida, pela água, ao preço de uma necropolítica, do genocídio, da miséria…

A condição de humanidade precisa ser conscientemente alvo de aprendizagem, com a proposição da valoração de cada um no coletivo, e deste manifestando-se em cada eu. A história nos ensina: os processos grupais são importantes para o movimento das sociedades, tanto na evolução (de construção de novas tecnologias, de melhorias para qualidade de vida, de garantia de direitos), como para obstrução do desenvolvimento (ao diferenciar grupos sociais no acesso a bens, ao não garantir equidade, ao incitar a violência). A aposta agora pode se dar na produção de condições que valorizem a solidariedade e a aprendizagem mútua.





Cláudia Cibele Bitdinger Cobalchini - psicóloga e mestre em Psicologia da Infância e Adolescência pela UFPR. É supervisora em práticas profissionais em Psicologia Comunitária e professora do curso de Psicologia da Universidade Positivo.


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