A conquista do chamado Oeste paulista e a do Oeste americano nasceram de sonhos parecidos: fé, destino e expansão. Em ambos os lados do continente, o território “vazio” foi o argumento moral para a ocupação e a violência. O resultado foi semelhante — povos originários expulsos, rios desviados, matas arrasadas e um imaginário nacional construído sobre o mito da conquista.
A
partir de 1850, o interior de São Paulo tornou-se palco daquilo que o Império
chamava de “civilização do sertão”. O fim das sesmarias e a Lei de Terras
abriram caminho para o domínio. A espada dos bugreiros, a catequese dos
capuchinhos e a caneta dos cartórios e os grileiros completaram o trabalho. Os
Botocudos e Caiuás, como os Sioux ou os Cheyenne, foram retratados como
obstáculos à modernidade.
Nos
Estados Unidos, a doutrina do Destino Manifesto justificava: o direito divino
de ocupar e explorar. No Brasil, a retórica era outra, mas a lógica, a mesma —
uma missão civilizadora, movida por lucro, medo e fé. Os dois “Oestes” criaram
seus próprios mitos fundadores: o cowboy e o bandeirante. Ambos inventaram
heróis para encobrir suas sombras.
A
série Yellowstone,
fenômeno global, revisita esse imaginário com rara franqueza. Mostra que a
fronteira nunca acabou: ela apenas mudou de rosto. Os conflitos por terra, água
e pertencimento continuam, agora entre empresários, povos nativos e o próprio
Estado.
No
Brasil, o Oeste Paulista
vive uma versão silenciosa do mesmo enredo. A monocultura substituiu a mata; o
agronegócio, o coronel; e o progresso, a promessa. Mas as feridas permanecem. O
sertão ainda arde sob o asfalto, e o país, como os Dutton de Yellowstone,
continua lutando para sustentar uma ideia de posse que o próprio tempo já
desmente.
Entre o faroeste e o sertão, há menos distância do que parece.
Ambos nasceram da crença de que conquistar é o mesmo que existir — e ambos
ainda buscam, no fundo, a coragem de devolver a terra à sua própria verdade.
Henrique A. Chagas - escritor, genealogista e autor do
livro “Tavares Terra – A diáspora mineira, os Tavares Terra e José Theodoro de
Souza no sertão paulista”. Formado em Direito, estudou Psicologia e Filosofia,
foi coordenador jurídico da Caixa Econômica Federal e atualmente dirige uma
organização social que atende pessoas com deficiência visual na região de
Presidente Prudente (SP).
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