Um dado recentemente divulgado pelo Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf, 2025) acende um alerta grave: 29% da população brasileira entre 15 e 64 anos é considerada analfabeta funcional. Ou seja, embora saibam ler palavras e frases simples, essas pessoas não conseguem interpretar textos, seguir instruções básicas ou realizar operações matemáticas elementares. Trata-se de um bloqueio cognitivo com impactos diretos na cidadania, na empregabilidade e no pensamento crítico.
Para o
neurocientista Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, pós-PhD em Neurociências e
especialista em genômica comportamental, esse fenômeno é explicado por uma
desintegração funcional entre regiões específicas do cérebro responsáveis pela
leitura, interpretação e raciocínio. “O analfabeto funcional lê, mas não
compreende. Isso ocorre porque há uma falha na comunicação entre estruturas
como o córtex pré-frontal dorsolateral, que organiza o raciocínio lógico, e as
áreas temporais e parietais, responsáveis pela linguagem e contexto.”
O estudo
também revela que a situação está estagnada desde 2018, evidenciando uma
falência estrutural no sistema educacional brasileiro. Mais da metade dos
jovens que abandonam os estudos entre 15 e 17 anos sequer concluiu o ensino
fundamental. De acordo com Dr. Fabiano, essa evasão agrava o cenário, pois
compromete a fase em que o cérebro ainda está em forte desenvolvimento
sináptico. “Na ausência de estímulo cognitivo adequado, as conexões neurais que
sustentam a leitura e a abstração não se consolidam. A plasticidade cerebral
depende do ambiente, especialmente na infância e adolescência.”
A baixa
qualidade do ensino, como mostram os dados do Saeb (2023), reforça o problema.
A maioria dos alunos do ensino médio não atinge o nível mínimo de proficiência
em língua portuguesa. “A escola não forma cérebros preparados para interpretar.
Ensina a ler palavras, mas não a construir sentido. E essa é uma falha
neurofuncional, não apenas pedagógica”, observa o neurocientista.
Segundo ele,
a superação do analfabetismo funcional exige uma abordagem integrada, que
considere o cérebro como um sistema em desenvolvimento. A formação cognitiva
deve começar antes da alfabetização formal e ser reforçada com estímulos que
favoreçam a integração entre linguagem, memória, raciocínio e emoção. “O
problema é estrutural, mas também cerebral. Corrigir erros ortográficos é
irrelevante diante de um cérebro que nunca foi treinado para compreender. A
mudança começa com o reconhecimento dessa arquitetura falha.”
Os dados do
Inaf 2025 não apenas revelam um colapso silencioso. Eles exigem uma resposta
baseada em ciência. A alfabetização verdadeira é, antes de tudo, um processo
neurobiológico.
Créditos MF Press Global
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