Ao trafegar por vias públicas, vemos policiais que buscam, pela própria ostentação da sua existência, conter os mais incautos no manejo de seus veículos. Muita gente, logo que o\as vê, passa a dar sinais de luz para o\as condutore\as dos carros com os quais cruza. À sorrelfa, alertam o\as “colegas” sobre as autoridades rodoviárias. É como se dissessem: “Suspendam por um instante as infrações que vêm cometendo.”
Por outro lado, não se contam sobre nossas autoridades policiais
rodoviárias as melhores histórias: grosseria, autoritarismo, multas à socapa,
corrupção, chantagem, formação de quadrilha, ineficiência. Não tenho ouvido
elogios à Polícia Rodoviária, nem como instituição. O IPEA, “revela que é alto
o medo da violência no Brasil e baixa a confiança nas polícias que combatem os
crimes mais próximos do cotidiano do cidadão.
Mais da metade dos brasileiros sentem ‘muito medo’ de sofrer agressão. A
pesquisa também ouviu a opinião dos entrevistados sobre as instituições
policiais. Apenas a Polícia Federal (PF) teve índice acima de 10% na resposta
‘confia muito’. As polícias civis e militares dos estados atingiram apenas 6%
das respostas ‘confia muito’. Cerca de 9% disseram ‘confiar muito’ na Polícia
Rodoviária Federal (PRF)” (FENAPRF, 08jul12).
“Para a especialista em segurança pública e professora da Universidade
Federal Fluminense (UFF) Jacqueline Muniz, a corporação precisa de um resgaste
institucional. ‘A PRF precisa passar por um processo de reinstitucionalização e
resgaste de sua credibilidade, atualizando uma doutrina da força com protocolos
públicos e publicados’” (Brasil de Fato, 05out23). A percepção é a de uma
relação inadequada entre cidadã\o e autoridade.
Dificilmente nasceria daí alguma colaboração. Não gostamos da Polícia;
não confiamos na Polícia; queremos enganar a Polícia. Contudo, paradoxalmente,
esperamos bons resultados da atividade policial. Parece-me que, por decorrência
dessa relação desqualificada, não poderíamos pedir tanto. Por sobre isso,
todavia, emergem outros problemas.
Primeiro, não queremos que a Polícia disponha de meios para trabalhar. É
verdade que a instituição tem, ou deveria ter, uma função orientadora, todavia,
a sua principal atividade é de controle e repressão. Para tanto, ela precisa de
meios. Considero que seus recursos mais eficientes são os que combateriam as
principais causas de acidentes: para reprimir a velocidade excessiva, radares;
para evitar que bêbados dirijam, bafômetros.
Aí, duas questões verdadeiras a favor da cidadania. Uma, os radares não
podem ser “escondidos”; é necessário anunciar a sua instalação. Duas, ninguém
pode ser obrigado a produzir prova contra si, então, nenhuma pessoa está
obrigada a soprar um “bafômetro”. Também pretendo ver cumpridas as garantias
cidadãs, mas, então, devo tomar em conta que os radares serão de pouca
utilidade para coibir velocidade excessiva e que os bafômetros serão inúteis.
Segundo, a Justiça não decide uniformemente sobre a identificação válida
do estado de bêbado, ou de embriaguez. Na falta de meios melhores, consideram-se
as vestes desalinhadas, a fala arrastada, o hálito alcoólico, o andar
titubeante, o reflexo fotomotor lento, o controle muscular perturbado. Ora, a
legislação pertinente fala em concentração específica de álcool no sangue,
logo, tem que ser medida, não pode ser suposta.
À sua vez, o STJ avocou a si a tarefa de estabelecer como se
identificará a condição etílica. Daí resultou súmula 620, cujo teor assente que
“para comprovar a embriaguez, objetivamente delimitada pelo art. 306 do CTB, é
indispensável a prova técnica consubstanciada no teste do bafômetro ou no exame
de sangue. Comprovar a embriaguez alcoólica, é indispensável a prova técnica
consubstanciada no teste do etilômetro ou no exame de sangue”.
Vale o “bafômetro”; o
“bafômetro” é recusável. Estamos em um impasse. Há a lei, tentamos contornar a
lei. Ao tempo em que nos alarmamos em face do morticínio de guerra em nossas
estradas, intentamos driblar a repressão aos excessos; resistimos à punição por
nossas transgressões ao Código de Trânsito. Reflexos da ideologia da
malandragem, um pouco do Brasil, uma ladinagem que nos sobra contra nós.
Doutor em Direito pela UFSC.
Psicanalista e Jornalista.
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