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Imagem da árvore escaneada no campus da USP divulgação |
Pesquisadores da Universidade
de São Paulo (USP) criaram um software que orienta com precisão a poda de
árvores em áreas urbanas, reduzindo o risco de queda. Com os eventos climáticos
mais frequentes e extremos, os temporais em grandes cidades têm derrubado um
maior número de árvores, provocando perdas econômicas e de vidas.
Somente em São Paulo, após
fortes chuvas na capital, a prefeitura contabilizou em um único dia deste mês
(12 de março) 330 quedas – em uma delas um carro foi atingido, matando o
motorista. Por ano, estima-se que o município tenha cerca de 2 mil quedas de
árvores urbanas – excluindo parques públicos e áreas de proteção ambiental.
Segundo os cientistas, o
primeiro passo é fazer um escaneamento das árvores, com o uso de equipamento a
laser, para captar em pontos diferentes imagens tridimensionais que são
colocadas em um modelo computacional. Para fazer a modelagem, o grupo
desenvolveu uma combinação de software e chegou a um “algoritmo de poda”, com o
objetivo de manter o equilíbrio da árvore.
O trabalho une biologia,
matemática e mecatrônica, e está sendo desenvolvido por pesquisadores do
Instituto de Estudos Avançados (IEA-USP), do Instituto de Biociências (IB-USP)
e da Escola Politécnica (Poli-USP) no âmbito do Centro de Pesquisa e Inovação em
Gases de Efeito (RCGI), um Centro de
Pesquisa em Engenharia (CPE) constituído por FAPESP e Shell, com apoio de
diversas outras empresas, voltado a estudos avançados em bioenergia,
agricultura e ciências ambientais para mitigar efeitos das mudanças climáticas.
“As árvores, assim como outras
formas na natureza, são estruturas otimizadas, que utilizam apenas o material
essencial em sua configuração física. Se você faz uma poda errada, pode
provocar fraqueza nessa estrutura. Com o software que desenvolvemos,
conseguimos avaliar as deformações, até mesmo a deflexão das árvores devido aos
ventos. Com isso, é possível ter um diagnóstico e orientar a poda de forma mais
precisa”, diz à Agência FAPESP Emílio Carlos Nelli Silva,
professor do Departamento de Engenharia Mecatrônica e Sistemas Mecânicos da USP
e vice-diretor científico do RCGI.
Nas primeiras análises,
realizadas no campus da USP em São Paulo, os pesquisadores fizeram uma poda de
até 20% da copa com base no algoritmo e conseguiram manter o equilíbrio da
árvore. Em outro ensaio, com outro tipo de corte, houve aumento dos pontos de
fraqueza, com mais possibilidade de queda.
Normalmente, a poda em área
urbana é realizada dentro de um plano de manejo ambiental dos municípios para
compatibilizar a estrutura do vegetal ao convívio humano, com foco na saúde da
árvore, mantendo sua resiliência e equilíbrio. A definição de como será a poda
em cada árvore é feita por técnicos ou profissional responsável pelo serviço,
no limite de 30% da copa.
“O ser humano não tem a
capacidade de fazer essa poda tão precisa como conseguimos usando o
escaneamento com algoritmo. Ainda não calculamos o porcentual que o software é
capaz de evitar de queda de árvores com a poda mais precisa, mas conseguiremos
em breve”, afirma Marcos Buckeridge,
professor do Departamento de Botânica do IB-USP e vice-diretor do IEA.
E complementa: “Essa ferramenta
vem de uma sequência de trabalhos, que agora conta também com a equipe da
engenharia. O próximo passo é uma aproximação com a meteorologia para estudar a
velocidade e o direcionamento dos ventos em tempestades. Isso nos ajudará a detectar
o lado mais fraco da copa ou se a árvore está em uma área de canalização de
vento. Assim, poderemos melhorar a poda e evitar plantio em locais de vento
mais forte”.
Pesquisa publicada no ano
passado mostrou que as podas drásticas, juntamente com o estado da madeira e o
estrangulamento da raiz pelas calçadas, podem ser usadas como preditores de
queda de árvores em cidades (leia mais em: agencia.fapesp.br/50618).
Entre os principais fatores em áreas
urbanas que influenciam a queda estão a altura dos prédios no entorno, a idade
do bairro, a largura da calçada e a altura da árvore. Com a verticalização,
elas enfrentam condições desfavoráveis nos chamados “cânions urbanos”, ou seja,
fileiras contínuas de edifícios altos que alteram a velocidade do vento local,
a dispersão da poluição e os padrões de iluminação e microclima, contribuindo
com a queda precoce (leia mais em: agencia.fapesp.br/39341).
‘A maçã de
Newton’
Nelli Silva conta que a ideia
do software surgiu durante um almoço com Buckeridge em um restaurante de São
Paulo – o local abriga em seu interior uma centenária Figueira-de-bengala (Ficus
benghalensis), cujo plantio é estimado na década de 1890. Do gênero Ficus,
ela tem altura de cerca de 6 metros, com diâmetro da copa de aproximadamente 46
metros.
“Sabia que o Buckeridge
trabalhava com essa linha de estudo e eu sempre tive curiosidade sobre as
árvores, com estruturas complexas e difíceis de modelar em computador. Então
pensamos: por que não usar um algoritmo para restaurar a otimização dessas estruturas
por meio da repoda? Foi aí a inspiração da pesquisa”, relembra o professor,
especialista em mecânica computacional.
Nelli Silva explica que a
natureza frequentemente inspira estudos de otimização estrutural e frutos como
a maçã podem servir de modelo para análises. “O formato da maçã é uma estrutura
que possui a menor tensão mecânica sujeito a peso próprio. Ela tem uma massa
apoiada em um ponto que é o caule. Partimos da ideia de que, se é possível
analisar a estrutura otimizada da maçã, seria também com a árvore.”
Na ciência, uma história famosa
envolvendo o fruto e que até hoje rende pesquisas e dúvidas é a do físico
inglês Isaac Newton, que teria concebido a Lei da
Gravitação Universal ao observar a queda de uma maçã de sua árvore. A lei
estabelece que a força de atração de dois corpos deve ser proporcional ao
produto de suas massas dividido pela distância entre eles ao quadrado.
Próximos
passos
Ao fazer a modelagem a partir
das imagens obtidas pelo equipamento a laser, é possível chegar a uma espécie
de “arquitetura” da árvore – etapa que contou com a colaboração do professor da
USP Marcelo Zuffo, um
dos pesquisadores do projeto “CID-SP EMERGÊNCIAS: Centro de
Inteligência de Dados em Saúde Pública”, apoiado pela FAPESP por
meio do programa Centros de Ciência para o Desenvolvimento (CCD-SP).
Nessa primeira etapa, as
análises foram realizadas pela copa. O grupo pretende agora inserir informações
das raízes. “A metodologia abre uma perspectiva para fazermos novas simulações
computacionais, customizadas para cada espécie e com outros tipos de dados. O
método é escalável para mapear árvores de uma cidade toda”, conta Nelli Silva.
De acordo com Buckeridge,
algumas prefeituras, entre elas a de São Paulo, já procuraram o grupo para
viabilizar o uso do software. “Estamos conectando a ciência ao desenvolvimento
da tecnologia para enfrentarmos as mudanças climáticas. Queremos aumentar a
velocidade de análise do software e reduzir o custo. Isso abre caminho para
startups que queiram ajudar no serviço. Quanto mais árvores tivermos melhor
será a resiliência das cidades às mudanças climáticas”, completa o vice-diretor
do IEA, que integra o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) do Bioetanol, financiado pela
FAPESP e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico
(CNPq).
Procurada pela reportagem, a
Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) da Prefeitura de São Paulo
informou estar “em tratativas para conhecer o software e avaliar sua
aplicabilidade nos serviços de manejo arbóreo da cidade” dentro do compromisso
com a adoção de tecnologias que aprimorem a gestão ambiental.
A secretaria diz que pretende
analisar de que forma a ferramenta pode contribuir com a poda preventiva e a
redução do risco de queda de árvores, especialmente durante temporais.
Luciana Constantino
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/pesquisadores-criam-software-da-poda-para-reduzir-risco-de-queda-de-arvores-em-areas-urbanas/54255
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