Os bons livros são aqueles que lemos com lentidão,
pois não queremos que terminem. Na verdade, vemo-nos em estado de solidão
quando terminamos de ler bons livros. Isso aconteceu comigo em O nome da
rosa, de Umberto Eco.
Vamos adiando sempre um pouco, para que a leitura
não chegue ao fim. Os livros são bons companheiros. Porém, terminar a leitura
de um bom livro nos dá uma sensação de solidão.
No entanto, é preciso resgatar o hábito de concluir
etapas em nossos dias, a fim de experimentarmos não a solidão do abandono, mas
o prazer da solitude.
A rigor, as pausas e os ritos é que estão
desaparecendo. Hoje há uma grande dificuldade em concluir, em “fechar” o ciclo
para entrar na pausa do repouso da noite.
Embora o tempo seja o mesmo, os dias ficam inconclusos,
como se eles se prolongassem noite adentro. Assim também acontece com as
semanas, os meses e os anos.
É comum ouvir nos rádios e nos noticiários: o ano
que se findou não acabou. As pausas são o tempo em que escolhemos o silêncio da
calmaria e da lentidão.
As pessoas não terminam seus dias — elas continuam
trabalhando em casa, e as pausas e o ócio têm desaparecido de nossas vidas.
Dormir mais um pouco, andar descalço na grama ou na areia, mostrar-se um pouco
mais lento e preguiçoso, tudo isso está ficando cada dia mais raro.
Estamos sempre sem tempo, correndo de um lado para
o outro, sem saber para onde estamos indo.
Depois de tudo, quando, exaustos, caímos em nossas
camas, os algoritmos não nos deixam descansar: o cérebro interrompe a melatonina,
como se dissesse à glândula pineal: “Vamos, ainda não anoiteceu, o dia não
terminou.”
Estamos perdendo o tempo dos términos. A sociedade
do desempenho quer interromper o término de tudo. Chegará o dia em que nem
mesmo nos deixarão morrer em paz. No ato de morrer está a última mercadoria a
ser vendida; morrer é contra a economia. Nosso modo de vida depende da morte
adiada.
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