Diante do anúncio
da retomada do Programa Mais Médicos (PMM) pelo Governo Federal, o Conselho
Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) deu início à Operação
Mais Médicos no Estado. Trata-se de uma grande operação de fiscalização que
começou em dez municípios do Estado de São Paulo simultaneamente, nos dias 10 e
11 de fevereiro, e contou com a participação de diversos conselheiros,
delegados e médicos-fiscais. Em todas as Unidades de Saúde visitadas, os
profissionais do Cremesp encontraram cidades estruturadas com médicos
devidamente registrados no Conselho, o que comprova e demonstra ser desnecessária
a presença de médicos que não revalidaram os diplomas no Estado de São Paulo.
Os primeiros municípios fiscalizados (*relação abaixo), escolhidos
estrategicamente pelo Cremesp, vão exatamente ao encontro do público-alvo do
Programa Mais Médicos, para que a análise seja justa e correta. As primeiras 10
cidades selecionadas foram as que mais receberam médicos cubanos entre 2013 e
2018, segundo relatório da Organização Pan-americana da Saúde ao qual o Cremesp
teve acesso. São cidades pequenas, com população entre 1,5 mil a 9 mil
habitantes, poucos recursos, de difícil acesso (em alguns lugares, só foi
possível chegar ao local de viatura 4x4, especialmente obtida pelo Cremesp para
acesso a regiões remotas) e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) baixo.
O objetivo da Operação Mais Médicos é produzir dados que tirem as discussões
sobre o tema do plano ideológico e das narrativas, gerando relatórios com fatos
concretos sobre a real demanda por novos médicos no Estado. Para isso, o
Conselho fiscalizará os locais que receberam participantes do programa no
passado, aos quais se vem atribuindo falta de médicos. O objetivo é verificar
se o atendimento está de acordo com as determinações administrativas e legais e
se faltam ou não médico nessas localidades.
Também será observado se os médicos do Estado de São Paulo estão sendo
desligados ou prejudicados com a substituição por participantes do programa, em
especial por profissionais que não possuem revalidação do diploma médico. Serão
avaliados, ainda, os locais e as condições de trabalho dos profissionais,
visando garantir a qualidade da assistência à população.
Para orientar os médicos registrados no Cremesp e já atuantes, será entregue um
guia com um canal de denúncias sobre possíveis irregularidades ocorridas na
unidade, incluindo demissões. Médicos registrados no Cremesp que, de alguma
forma, forem demitidos, prejudicados ou substituídos por profissionais
contratados pelo Programa Mais Médicos têm à disposição um canal de denúncias
aberto pelo Cremesp: prerrogativas@cremesp.org.br.
A atual gestão do Cremesp está diligente em fiscalizar ininterruptamente
centenas de Unidades de Saúde que venham a retomar o PMM.
Acesse o vídeo da Operação
Mais Médicos em todo o Estado de São Paulo
Defesa do
Revalida
“Os médicos
registrados nos conselhos regionais devem ter preferência no exercício da
profissão, não só por já atuarem junto à comunidade, como também por terem sua
formação em faculdades autorizadas pelo Ministério da Educação (MEC).
Preocupa-nos o fato de que muitos indivíduos recorrem a faculdades em cidades
de fronteira, cuja qualidade de formação não é comprovada nem mesmo nos países
em que estão localizadas”, afirmou a presidente do Cremesp, Irene Abramovich,
ao comentar iniciativa do Conselho.
Com a Operação Mais Médicos, o Cremesp reitera sua posição em defesa da
exigência do Exame Nacional de Revalidação de Diplomas Médicos Expedidos por
Instituições de Educação Superior Estrangeira (Revalida) para a contratação de
profissionais brasileiros e estrangeiros, com formação em faculdades
estrangeiras. Tal posição já vem sendo defendida pelo Conselho desde 2019, em
audiências públicas no Congresso, que levaram ao formato atual da lei.
“Essa é a única forma de aferir se o médico adquiriu as habilidades necessárias
em sua formação e se está devidamente graduado e capacitado a prestar um
atendimento de qualidade à população. Não importa se o médico é formado em Cuba
ou em Harvard, todos precisam realizar a revalidação, como ocorre em outros
países”, afirmou o diretor 1º secretário do Cremesp, Angelo Vattimo.
Além disso, “a revalidação do diploma permitirá a obtenção do registro
profissional junto aos Conselhos Regionais, etapa obrigatória para que o médico
atue de forma regular no País e garanta a prática da boa Medicina, por estar
sujeito à fiscalização dos órgãos competentes. Os médicos do PMM sem registro
não estão sujeitos a nenhuma fiscalização, então, caso ocorra dano ao paciente,
ninguém sabe como o incidente será investigado e quem será responsabilizado.
Isso não é justo com a população mais carente, que é aquela à qual o programa
se dirige”, completou.
Passado
marcado por distorções e irregularidades
Instituído em
2013, com a justificativa de resolver a alegada falta de médicos na atenção
básica, sobretudo em áreas mais distantes, o PMM foi marcado por
irregularidades. Uma auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU) apontou em
2018 problemas, mais especificamente na execução dos contratos por parte da
Organização Pan-Americana de Saúde (Opas), que incluíam a falta de
transparência e de comprovação do uso dos recursos repassados pelo Ministério
da Saúde (MS).
Entre setembro de 2013 e março de 2016, a auditoria apontou que, dos R$ 4,1 bilhões repassados para a Opas como
adiantamento, R$
316 milhões não haviam sido utilizados no período determinado. A CGU considerou
o montante como "potencial prejuízo" para os cofres públicos. Além
disso, das 19 recomendações feitas pela CGU ao MS, apenas cinco haviam sido
atendidas.
Substituição
de médicos
Um dos principais
grupos que passaram a defender o PMM é composto por prefeitos e secretários
municipais de saúde. Estes últimos, por meio do Conselho Nacional de
Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), do qual fazem parte, figuram entre
as principais forças políticas de apoio ao programa. Isso porque o PMM ajudou a
reduzir o custo de prefeituras com o pagamento de salários médicos, pois as
bolsas dos médicos integrantes do programa são financiadas pelo MS, em vez de
pagas pelas prefeituras, como ocorre com o salário da maioria dos médicos da
Atenção Básica.
Esse problema, já apontado pelo Cremesp em debate com o ex-ministro Arthur
Chioro em 2018, pode levar à substituição de médicos já contratados pela
prefeitura, devido ao risco de prevalecerem interesses corporativistas dos
gestores. A preocupação foi corroborada pela auditoria da CGU, que de fato
apontou a substituição de equipes de atenção básica por médicos do programa. De
acordo com a auditoria, de 222 equipes de Saúde da Família avaliadas na
amostra, 44 tiveram a substituição de um profissional da equipe por um do
Programa Mais Médicos. A auditoria apontou ainda que áreas consideradas mais
vulneráveis não foram priorizadas pelo PMM. Isso aumenta a preocupações de que
outros interesses podem ter guiado a alocação de vagas, com prejuízos aos
médicos e à população.
Tempo de
focar em fatos concretos
Desde a
implementação do programa em 2013, passando pelo seu fim em 2018, com a saída
unilateral do governo de Cuba, passaram-se dez anos. Desde então, a demografia
médica mudou significativamente no Brasil, com a abertura de centenas de novas
escolas médicas. Portanto, os argumentos que motivaram a criação do programa
devem ser revistos, de forma a basear quaisquer novas políticas públicas em
fatos concretos, em vez de narrativas político-ideológicas.
Assim, o primeiro passo é mapear onde de fato faltam médicos no Brasil. Este
será um dos objetivos da Operação Mais Médicos, conduzida pelo Cremesp.
“Queremos que as políticas públicas sejam implementadas seguindo o raciocínio
médico: primeiro é feito um diagnóstico e, depois, implementado o tratamento.
Do jeito que está sendo discutido, parece que se está forçando um tratamento
sem antes se fazer um diagnóstico preciso da situação”, pondera Abramovich.
O Cremesp defende que, se de fato constatada a falta de médicos e a dificuldade
em fixá-los em determinada localidade, seja criada a carreira médica de Estado.
“Por que os promotores e juízes se fixam em localidades remotas? Porque eles
sabem que terão possibilidade de seguir uma carreira, com estabilidade.
Acreditamos que o mesmo deva ser oferecido aos médicos”, defende Vattimo.
Municípios
fiscalizados pela Operação Mais Médicos do Cremesp:
- Flora
Rica (UBS III);
- Trabiju
(UBS Manoel Morales);
- Avaí
(Centro de Saúde III);
- Turmalina
(UBS Enfermeira Anne Larissa Leoci);
- Restinga
(Centro de Saúde III);
- Turiúba
(UBS Benedito dos Santos e Centro de Saúde III);
- Águas
de Santa Bárbara (Estratégia Saúde da Família Irineu Malícia / ESF Parque
dos Lagos / UBS Águas de Santa Bárbara)
- Iporanga
(UBS Dr. Thomaz Antônio Cunha Cardoso);
- Dobrada
(UBS III Frederico Scabello).
- Barra do Turvo (Pronto Atendimento e Centro de Saúde III).
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