Arquiteto e
urbanista, Rui Rocha Júnior explica como esse modelo de arquitetura atrasa o
combate à desigualdade social
A arquitetura hostil é um conjunto de estratégias
projetuais ligadas ao desenho urbano para prevenir ou impedir a criminalidade e
manter a ordem. Em geral, esse conceito é utilizado para evitar a prática de
skate, parkour, micção pública, abrigo para pessoas em situação de rua, entre
outros comportamentos. E possui uma espécie de urbanismo higienista, segundo
Rui Rocha Júnior, professor de Arquitetura
e Urbanismo do Centro Universitário de João Pessoa – Unipê. O objetivo é
afastar as ocupações indesejáveis nos grandes centros urbanos, praças,
viadutos, marquises e calçadas.
Rui diz que essas estratégias regulamentam o espaço
público e afastam das grandes cidades as pessoas mais desprovidas de dinheiro,
o que é um grande perigo, já que a cidade em si é para todos. “As áreas
aparentemente mais estruturadas pertencem aos que têm o maior poder econômico e
consequentemente social, portanto a arquitetura hostil dialoga indiretamente
com a população mais pobre, alertando-a que, apesar de ser um espaço público,
não é um lugar para ela, passando a ser uma arquitetura da exclusão. A cidade é
de todos e para todos, mas a aplicação desses planos cria muros invisíveis na
sociedade”, explica.
Um fato que representa bastante as exclusões
geradas pela arquitetura hostil segundo o professor, foram as pedras instaladas
sob os viadutos Dom Luciano Mendes de Almeida e Antônio de Paiva Monteiro,
localizados na Avenida Salim Farah Maluf, em São Paulo. Elas afastavam as
pessoas em situação de rua do local. Um outro exemplo, aconteceu em 2015, na
capital baiana, onde plantaram cactos de baixo dos viadutos, para afastar as
pessoas em situação de rua.
“Existem diversos projetos de revitalização urbana
que disponibilizam bancos de praças com braços dividindo o espaço, ou com
acentos inclinados, para que não os usem para dormir”, ressalta. “As
estratégias trazidas pela arquitetura hostil funcionam como uma violência à
democracia do espaço urbano. Não resolvem o problema de segurança, mas camuflam
a pobreza. Uma das formas de trazer segurança aos espaços públicos é a
vitalidade urbana, que é a presença humana”, assinala Rui, que ainda diz que os
conflitos sociais graves nas cidades podem muitas vezes estar mais relacionados
com políticas sociais mais profundas e complexas, ao invés do espaço
construído.
Para o docente, a sociedade necessita de uma
arquitetura amistosa ao invés de uma arquitetura hostil nas cidades. Para
pessoas em situação de rua, a solução é mais profunda, dependendo também de
políticas públicas de abrigo e habitação social, educação, melhores condições
de empregos, entre outras ações. Vale ressaltar que os espaços citados são
espaços utilizados por pedestres, crianças, idosos e pessoas com dificuldades
de locomoção.
“Marquises e viadutos servem como forma de abrigo
contra as tempestades para pedestres, motociclistas e ciclistas que não possuem
proteção, portanto não podem ser descartados como meio de proteção desse
público. Quanto aos skatistas e praticantes do parkour, penso que a cidade deve
ser aprazível, lúdica e vivenciada por todos e não apenas por um grupo
especifico”, sinaliza.
Rui lembra que a arquitetura e o desenho urbano não
são as únicas soluções aos problemas sociais, mas ajudam a resolvê-los tanto
quanto a agravá-los; “É preciso mudar a forma como encaramos a cidade, pensar
mais no coletivo e em soluções para todos.”
Por fim, o especialista salienta: o conceito pode,
na verdade, afastar diversos conflitos sociais nunca antes mediados. “No caso
da arquitetura hostil, agrava-se a má qualidade das nossas cidades, e a
hostilidade é a ausência de respostas aos problemas sociais que a cidade nos
apresenta. Ela tenta ‘varrer para baixo do tapete’ as questões sociais que
ainda estamos longe de resolver”, finaliza.
Centro Universitário de João Pessoa – UNIPÊ
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