Doença
inflamatória na articulação está associada à síndrome metabólica, condição que
é combatida de maneira eficaz com a restrição do consumo de carboidratos
De acordo com análise publicada na revista
científica “Arthritis & Rheumatology”, os casos de gota tiveram um aumento
alarmante nas últimas três décadas em todo mundo. O estudo publicado em 2020
mostra que, entre 1990 e 2017, o número de pessoas que sofrem com a doença
aumentou 5,5%, chegando a 41 milhões. A gota é uma doença inflamatória aguda e
dolorosa, que ocorre frequentemente em uma articulação de cada vez apenas,
sendo o dedão do pé um dos locais mais afetados.
O médico e diretor-presidente da Associação
Brasileira Low Carb (ABLC), José Carlos Souto, destaca os benefícios da
estratégia alimentar low carb no tratamento da gota, especialmente pela
reversão da síndrome metabólica. Além disso, um estudo apresentado em um
congresso da American College of Rheumatology mostrou que 74 pacientes com
sobrepeso ou obesos que foram submetidos durante seis meses à dieta Atkins (com
alta quantidade de proteína e com pouco carboidrato) apresentaram diminuição
dos níveis de ácido úrico, substância que é fator de risco e condição
necessária para o aparecimento da gota.
Para entender como a estratégia low carb pode
auxiliar no tratamento da gota, é preciso compreender os diversos fatores
envolvidos no seu surgimento. O ácido úrico está intrinsecamente relacionado
com a gota. Como explica Souto, a doença inflamatória ocorre quando há uma
precipitação de cristais de ácido úrico dentro da articulação. "Por esse
motivo as pessoas com gota quase sempre tem ácido úrico elevado",
afirma.
O ácido úrico, por sua vez, é um subproduto do
metabolismo das purinas, compostos cuja origem são bases nitrogenadas presentes
no DNA de seres humanos, animais e vegetais. O diretor-presidente da ABLC
explica que por estarem presentes em grande quantidade nos alimentos que nós
consumimos tradicionalmente (como carnes e frutos do mar) tem-se empregado uma
dieta pobre em purinas a pacientes que tenham gota ou ácido úrico
elevado.
Contudo, conforme Souto, os ensaios clínicos
randomizados já realizados sobre esse tipo de dieta indicam sua ineficácia
clínica no combate à gota. " Isso acontece porque já foi demostrado que na
atualidade que cerca de 80% do ácido úrico que os seres humanos produzem
resulta de purinas endógenas (produzidas pelo próprio corpo) e não de purinas
oriundas da alimentação", esclarece.
Além disso, uma dieta pobre em purina, ou seja, que
restrinja carnes e frutos do mar, acaba sendo uma estratégia alimentar rica em
alimentos refinados, como carboidratos, que são metabolizados em glicose
(açúcar) no organismo. A situação se complica, conforme o diretor-presidente da
ABLC, quando é sabido, de acordo com estudos, que o consumo de açúcar produz
elevações agudas nos níveis de ácido úrico. Assim, uma dieta pobre em proteínas
não é apenas ineficaz no tratamento da gota, como pode favorecer o seu
aparecimento.
Souto afirma que a relação entre o açúcar e o ácido
úrico é explicada pela maneira como a frutose (que corresponde a 50% da
molécula de açúcar) é metabolizada no fígado. "São necessárias grandes
quantidades de ATP para metabolizá-la e adenosina, presente no ATP, é uma
purina, contribuindo para o aumento agudo dos níveis de ácido úrico no
sangue", diz.
Deve-se ressaltar que, apesar de estar associada à
gota, o ácido úrico não é a única causa da doença inflamatória. Aliás, conforme
o diretor-presidente da ABLC, apenas 10% das pessoas com ácido úrico elevado
desenvolverão gota. "Não se sabe porque isso acontece, mas há indícios de
que pessoas que têm inflamação crônica apresentam uma tendência a desenvolver
doenças de natureza inflamatórias, ficando mais suscetíveis a apresentar gota
quando têm o ácido úrico elevado", explica.
Levando-se em conta que o quadro de inflamação
crônica do organismo, decorrente do acúmulo de gordura visceral, é
característico da síndrome metabólica, pode-se afirmar que essa condição
favorece o desenvolvimento da gota em pessoas que tem propensão genética a
apresentar o ácido úrico elevado. De acordo com Souto, a síndrome metabólica
relaciona-se com a gota também pela capacidade de aumentar a quantidade de
ácido úrico no organismo. "Quem sofre de síndrome metabólica costuma
apresentar insulina elevada. Este hormônio atua sobre os rins diminuindo a
excreção do ácido úrico, aumentando seus níveis no sangue", conta.
Um dos fatores responsáveis pelo aumento de gordura
visceral, que vai gerar a obesidade, responsável pela inflamação crônica e a
síndrome metabólica, é o excesso de glicose (açúcar) no sangue. Dessa maneira,
segundo o diretor-presidente da ABLC, o açúcar contribui dobrado para o
surgimento da gota: além de favorecer a produção de ácido úrico pela forma como
a frutose é metabolizada no sangue, é responsável pelo acúmulo de gordura
visceral que leva à síndrome metabólica.
Depreende-se daí a importância da dieta low carb no
auxílio ao tratamento da gota. Mesmo sendo uma prática alimentar na qual as
proteínas estão até mais presentes, ela favorece a melhora da síndrome
metabólica e da resistência à insulina por meio do emagrecimento. "Assim,
com o passar do tempo, os níveis de ácido úrico tendem a se reduzir e a gota
tende a desaparecer", afirma Souto, ressaltando que há indivíduos que tem
níveis geneticamente elevados. “Para estas pessoas, caso apresentem crises
repetidas de gosta, o tratamento farmacológico medicamentoso se fará necessário
em muitas ocasiões”, conclui.
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