Há pouco mais de um ano, recebemos a notícia de que teríamos que nos afastar do convívio social. Ao mesmo tempo, percebemos que alguns convívios se intensificariam, como aqueles com as pessoas que moram com a gente. Parecia simples. O movimento inicial de muitos de nós foi tentar replicar as rotinas já vigentes ao período de confinamento. Mas, aos poucos, a exaustão tomou conta e a cobrança de todas as esferas (familiares, pessoais e profissionais) começou a tornar a manutenção de tantos espaços e comportamentos inviável.
Como mãe, vi minhas posturas se ressignificarem e
percebi que eu precisava repensar e assumir responsabilidades que tinha
delegado e delegar responsabilidades que eu acreditava serem exclusivamente
minhas. No repensar da maternidade em si, entendi que o “maternar” não é
inerente à mãe. O “maternar” tem muito mais a ver com o cuidado que com o
parto. Dessa forma, encontrei um modo mais leve de encarar os múltiplos
desafios desse modo de viver inesperado, o confinamento.
Esse movimento de reposicionamento de papéis é, sem
dúvida, um desafio enorme, pois nos coloca em contato com aquilo que diz
respeito a quem acreditamos ser. O mais bonito, nesse caminho, foi perceber que
somos muitas, plurais e maleáveis. Durante este período, vimos nossas crianças
retornarem aos lares por tempo indeterminado, comprometendo arranjos que
tínhamos orquestrado. Muitas de nós estamos com os filhos em casa e sem saber
como dar conta de uma agenda de atividades que respeite os espaços e
necessidades individuais e coletivos.
Eu vejo que o mais importante, portanto, é estarmos
atentos para ouvir o que nós precisamos e o que as crianças precisam. A audição
é um dos sentidos mais poderosos para nosso desenvolvimento e, por isso,
devemos estimulá-la sempre. Na intenção de trazer um pouco de alívio à
sobrecarga que a administração de diferentes espaços (trabalho, escola, lar,
etc.) pode implicar aos que “maternam”, lembrem-se: não estamos replicando o
ambiente escolar em casa. Batalhas sobre ser fiel à rotina podem ser ainda mais
desgastantes que a rotina em si. Se há algo que já podemos marcar como
aprendizado nesse confinamento é que precisamos ser flexíveis. Até
encontrarmos, em nossas casas, um ritmo que seja confortável para todos,
precisamos ir devagar.
Também busque conter seus impulsos práticos de
querer resolver as coisas por eles. Cada criança absorve informações de um
jeito diferente. Olhe para sua criança e a escute. É assim que você conseguirá
saber se ela quer ou precisa de ajuda. Se estiver em dúvida, pergunte. Viva a
experiência com ela. Como adulto, a sua percepção de tempo e de urgência é
diferente da criança. Estamos acostumados a achar que tudo é prioridade. Mas
prioridade é uma palavra que sempre deveria ser usada no singular. O simples
fato de você ter uma criança em casa a torna prioridade.
Nesses novos tempos de afastamento (dos outros) e
aproximação (dos nossos) simultâneos, parceria é certamente a palavra-chave
para atravessarmos as ondas mais altas. E a integração dos ambientes doméstico
e escolar pode resultar em uma dinâmica que priorize o que realmente é mais
importante em cada etapa para o seu filho. Acredite no trabalho que a escola
está realizando no on-line e apoie as práticas no off-line. Assim, criaremos um
cenário para que, não apenas você, mas outras pessoas também possam “maternar”
quem a gente mais ama.
Anna Baratieri - coordenadora editorial de linguagens do SPE.
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