Conseguimos dimensionar o valor daqueles que
desempenharam para nós o papel de pais quando temos a oportunidade de sermos
responsável por outro alguém. Várias situações que, no papel de filho,
criticávamos, acabamos por repetir, sem sequer perceber, em consequência das
nossas referências. Há expectativa de que possamos sofisticar um pouco mais a
lida com essa responsabilidade à medida da experiência de ter vivido a ‘saga de
ser filho’ e denunciar (algumas vezes, só em pensamento), tudo o que julgávamos
errado, anunciando uma educação mais aderente ao nosso tempo. Mas, quase
sempre, em cada posto que ocupamos, entramos como aprendizes, lançando mão, em
boa parte, somente das nossas referências.
São inúmeras as situações que resultam dessa
alteração de papéis. Uma delas, quase unânime, é a de que éramos bons filhos
diante do tipo de educação à qual éramos submetidos, pois a tarefa de educar
prescindia de um rigor, chegando ao limite da punição física. Porém, quando
buscamos resgatar essa memória com os nossos pais, nem sempre as coisas conferem.
Talvez seja porque “quem bate esquece, mas quem apanha, jamais”.
É humano buscar as referências para utilizar em nossas atitudes cotidianas.
Porém, é inteligente que essa referência se atualize, a partir de uma revisão
histórica.
A geração que hoje frequenta o ensino básico é
interativa por essência - e inclusiva pelas características próprias do estilo
de comunicação e relacionamento inerentes às comunidades virtuais as quais
pertencem. Logo, as iniciativas que desconsideram esse perfil tendem a fracassar
por falta de conexão com a atualidade. A resposta: "faça assim porque sou
seu pai" não encontra eco.
Autoridade, nesse contexto, passa
muito mais pelo respeito (necessariamente bilateral) do que pelo medo. Cada
criança ou jovem necessita de limites restritivos para se constituir
socialmente, mas, também, limites preservados, que assegure a construção
saudável da sua intimidade e, por sua vez, da sua identidade. Adultos que
invadem os espaços de intimidade daqueles pelos quais respondem, vigiando para
punir, constroem uma relação frágil de confiança, impedindo a experiência
prática de agir, assumindo as consequências pela sua ação. Essa experiência
permite exercitar as escolhas. Afinal, viver é fazer escolhas.
Preservar a intimidade não nos isenta de
acompanhar, dialogar e, sempre que possível, participar da vida daqueles pelos
quais somos responsáveis. A sabedoria popular já preconiza que o que diferencia
o remédio e o veneno é somente a dose.
Como cada ser humano é único (podemos
evidenciar em uma família com vários filhos, que o que foi adequado para um,
pode ter deixado sequelas profundas em outro), a alquimia que ajusta a dose
adequada acontece na ação de quem participa de perto, ajudando na arte de fazer
as melhores escolhas. O que aniquila as relações é a indiferença, pois a
atividade educativa necessita de energia (amor ou ódio) para que a aprendizagem
aconteça. E aí, incontestavelmente, o que nos move, antes aquece o coração.
Acedriana
Vicente Vogel - diretora pedagógica da Editora Positivo
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