Erros médicos no
Brasil são um dos grandes problemas enfrentados pelo setor da saúde e também de
sua judicialização. De maneira equivocada, chamamos de erro médico todas as
intercorrências, falhas e complicações presentes na seara da prestação de
serviços médicos hospitalares. Vale ressaltar que
a esmagadora doutrina pátria considera erro médico
desde o erro na administração de medicamentos por equipe de enfermagem até a
falha técnica em um procedimento cirúrgico ou erro de diagnóstico.
Assim, observando-se a
amplitude semântica do termo, pode-se dizer que os erros médicos são
normalmente sistêmicos e não envolvem apenas o médico. Estatisticamente, as
maiores complicações hospitalares ainda se relacionam ao erro de medicamentos,
alguns sem consequências percebidas por pelos pacientes e seus familiares e
outras que levam à morte.
Ao considerar as
especialidades mais demandadas judicial e administrativamente, reconhece-se ser
a ginecologia e obstetrícia e a cirurgia plástica aquelas que possuem mais
questionamentos pelos pacientes.
Importante dizer que a especialidade
ginecologia e obstetrícia tem reclamações diretamente relacionadas aos partos e
eventuais sequelas aos bebês, quer pela demora na realização do procedimento,
quer por manobras que deixam algum tipo de sequela como é o caso de uma
lesão de plexo braquial. Muitas das reclamações originam-se de
atendimentos na rede pública, considerando claro haver maior número de partos
normais pela rede.
Nos casos envolvendo
estética, raramente há um erro técnico, mas sim a insatisfação das pacientes,
uma vez que nem sempre o corpo responderá da forma desejada pelo profissional e
pelas pacientes. E, por vezes, faz-se necessário repetir procedimentos – o que
desagrada a muitos pacientes.
Esse, porém, é um indicador de um
problema que tem trazido muitas condenações aos médicos e instituições de
saúde: a ausência de informações claras e objetivas sobre diagnóstico, terapêutica,
prognóstico e, em especial, sobre intercorrências e possíveis resultados.
O ideal para minimizar
os problemas nos casos cirúrgicos é realizar um checklist, tais como a
identificação correta do paciente, do membro e lado a ser operado, da indicação
cirúrgica, da disponibilidade do material necessário ao procedimento, da
ciência dos deveres do acompanhante e outros aspectos.
A avalição anestésica
deve ocorrer sempre nos casos da cirurgia eletiva, preferencialmente, com
antecedência ao ato cirúrgico – nunca no próprio ato. Utilizar um sistema com
dupla checagem para dispensação e aplicação de
medicamentos é essencial em um hospital, haja vista a quantidade
de medicamentos a serem ministrados – em especial em enfermarias dos
atendimentos de urgência e emergência.
Termos de
consentimentos usados para cirurgias e também em outros procedimentos envolvem
o paciente nos atendimentos, proporcionando-lhe maior consciência de seus
deveres, uma vez que os cuidados com a saúde são de responsabilidade de
cada um e dos familiares. Ciente dos procedimentos, o paciente será um
coadjuvante muito importante. Daí ser essencial um Termo específico para
cada procedimento, sem informações genéricas ou que sejam tão técnicas a ponto
de o paciente não as compreender.
Os protocolos médicos
são essenciais para se evitar erros médicos. Os protocolos são criados por
juntas de profissionais especializados em determinados procedimentos – levam em
consideração as evidências, artigos científicos e possuem fundamentação dentro
de determinado tempo – isso porque devem ser constantemente atualizados, haja
vista a frequente inserção de novas tecnologias em equipamentos e medicamentos.
Um protocolo, porém,
não é vinculante – há casos em que pacientes diferentes demandam
tratamentos que podem não estar em consonância com protocolos; no entanto,
caberá ao médico justificar a não adoção de um protocolo.
Juridicamente, os
protocolos são norteadores. Se observados e houver uma complicação prevista em
literatura, dificilmente uma ação será julgada procedente pelos magistrados. E,
na hipótese de o médico não ter observado os protocolos por negligência, as
chances de uma condenação aumentam consideravelmente diante de um dano ao
paciente. A regra deve ser observar os protocolos e segui-los. A exceção
precisará ser sempre justificada.
A tecnologia também
pode auxiliar, principalmente, na segurança do paciente. O registro de
todas as informações dos pacientes em arquivo eletrônico, que podem ser
consultados por outros médicos (e colaboradores autorizados) para o acompanhamento
e evolução do paciente, é por si revolucionário. Máquinas de exames
de imagens, em especial, revelam patologias antes dificilmente detectáveis –
radiografia, ultrassom e ressonância magnética são hoje essenciais para certos
diagnósticos.
Já existem
experiências com robôs que podem ministrar medicamentos, observando a dosagem,
a indicação da substância, a via de acesso do medicamento, com alto índice de
precisão. Aplicativos lembram os pacientes em suas casas dos medicamentos
que devem tomar e condutas saudáveis a seguir.
Entretanto, deve-se
acentuar que sempre caberá ao ser humano alimentar as máquinas com dados e
sempre será do ser humano a capacidade de observar os pacientes, suas reações,
suas aspirações e necessidades. A tecnologia é um auxiliar fantástico, mas o
cuidado humano é decisivo para garantir a segurança. E os erros, sejam dos
médicos ou de equipes da saúde, são passíveis de punições e processos
judiciais, em alguns casos milionários.
À parte as
indenizações, o erro deve ser um condutor para a renovação e consequente
reavaliação de processos internos e de formação dos profissionais de saúde.
Essa é a chave para mudanças: reconhecimento das falhas e busca de soluções em
conjunto.
Sandra Franco - consultora
jurídica especializada em Direito Médico e da Saúde, presidente da Comissão de
Direito da Saúde e Responsabilidade Médico-Hospitalar da OAB de São José dos
Campos (SP), presidente da Academia Brasileira de Direito Médico e da Saúde,
membro do Comitê de Ética da UNESP para pesquisa em seres humanos e Doutoranda
em Saúde Pública.
Nenhum comentário:
Postar um comentário