Jovem mineira transforma sua experiência em ativismo e reforça a importância do acolhimento e medicação
No mês do Setembro Amarelo, campanha nacional de prevenção ao
suicídio, a escritora e palestrante mineira Marília Dan chama a atenção para um
problema silencioso, mas recorrente: a demora em identificar corretamente
transtornos mentais e a dificuldade de manter o cuidado de forma contínua. O
atraso no diagnóstico retarda o início do acompanhamento adequado, enquanto a
interrupção da terapia pode agravar crises e expor pacientes a situações de
maior vulnerabilidade e risco.
A própria história de Marília ilustra a gravidade da questão.
Antes de receber o diagnóstico definitivo de transtorno afetivo bipolar com
sintomas psicóticos, passou por diferentes avaliações. Aos 14 anos, começou a
ouvir vozes que acreditava serem de um vizinho e colega de escola — episódio
que marcou o início de uma longa busca por explicações. Enquanto enfrentava
bullying e perdia o interesse pelos estudos, recebeu, em 2015, o diagnóstico de
esquizofrenia, seguido da classificação de bipolaridade no ano seguinte. Em
2021, durante uma internação psiquiátrica, foi classificada com o transtorno
esquizoafetivo, o que foi descartado posteriormente. Hoje, aos 29 anos, Marília
canaliza sua energia em literatura e palestras sobre saúde mental.
Em uma das fases mais delicadas da sua vivência, quando
interrompeu a medicação, Marília enfrentou uma crise grave: ouviu vozes que a
mandavam pular da janela do apartamento. Temendo por sua segurança, pediu que
amigos trancassem todas as portas e janelas. No dia seguinte, decidiu buscar
ajuda e se internou voluntariamente no Hospital Espírita André Luiz (HEAL), em
Belo Horizonte (MG), referência nacional em saúde mental e dependência química.
De acordo com a Organização Mundial da Saúde, aproximadamente 800
mil pessoas morrem por suicídio anualmente no mundo. No Brasil, dados da
Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS), do Ministério da Saúde, revelam um
aumento de 43% nos casos de suicídio entre 2010 e 2019, passando de 9.454 para
13.523 registros.
O episódio, hoje relatado com clareza pela escritora, reforça a
importância da adesão ao tratamento e do apoio de uma rede de acolhimento para
a prevenção de situações de risco. Esse foi o ponto de virada de Marília.
Durante os 57 dias de internação no HEAL, contou com o apoio da família e o
suporte especializado, decisivos para sua recuperação. Desde então, com
disciplina no cuidado e uso correto da medicação, ela não voltou a apresentar
crises, consolidando um novo capítulo em sua vida pessoal e profissional.
“No Setembro Amarelo, é importante lembrar que quem enfrenta
pensamentos suicidas ou crises emocionais não quer, de fato, morrer. O que
existe é um sofrimento profundo, que pode se manifestar em quadros depressivos
extremos ou até em alucinações, como aconteceu comigo. Mas tudo isso pode ser
controlado e prevenido com diagnóstico correto, acompanhamento adequado e
apoio. Buscar ajuda é fundamental e ninguém precisa enfrentar essa dor
sozinho”, completa Marília.
Ativismo pela saúde mental
Além de compartilhar sua trajetória por meio da literatura,
Marília Dan se dedica ao ativismo com a palestra “Marília Dan e a Saúde Mental
no Cinema”, levando a discussão para escolas, empresas e espaços culturais. Em
outubro, ela lança a segunda edição do livro “As Vozes na Minha Cabeça: minha
história com o transtorno bipolar”, no qual relata em detalhes os episódios de
alucinações auditivas e o impacto do transtorno em sua vida.
Com sua atuação, reforça a urgência de iniciativas que enfrentem o preconceito, ampliem o acesso à informação e incentivem o diálogo sobre saúde mental. Para Marília, o debate não pode se restringir a datas como o Setembro Amarelo ou o Dia Mundial da Saúde Mental, celebrado em outubro. “É uma pauta que precisa atravessar o cotidiano e inspirar mudanças permanentes na forma como lidamos com o tema. Mais do que falar sobre isso, quero mostrar que é possível ter uma vida plena e feliz após o diagnóstico, desde que se siga o tratamento adequado”, ressalta.
Marília Dan - escritora, palestrante e ativista em saúde mental. Natural de Belo Horizonte (MG), passou um longo período convivendo com sintomas não identificados e sem tratamento adequado, até receber, aos 20 anos, o diagnóstico de transtorno afetivo bipolar com sintomas psicóticos. Transformou essa vivência em literatura e palestras, que mostram ser possível alcançar qualidade de vida e bem-estar emocional. Autora do livro “As Vozes na Minha Cabeça: minha história com o transtorno bipolar (2020)”, que ganhará nova edição em outubro de 2025, ela também iniciou a escrita de sua terceira obra, inspirada nos 57 dias de internação voluntária em um hospital psiquiátrico. Em sua palestra “Marília Dan e a Saúde Mental no Cinema”, conecta a própria trajetória a referências cinematográficas para promover reflexões sobre cuidado emocional, prevenção e enfrentamento de desafios.




