Em um divórcio ou separação litigiosa, o momento da
partilha de bens pode gerar intensos conflitos e, não raro, fraudes que
prejudicam gravemente uma das partes. É comum que um dos cônjuges adote
estratégias para ocultar ou desviar ativos, minimizando o valor real do
patrimônio a ser dividido. Nesse contexto, a investigação patrimonial surge
como um instrumento essencial para evitar perdas financeiras significativas e
proteger não apenas os envolvidos, mas também os filhos, que podem ser
indiretamente afetados pela instabilidade econômica resultante.
A verdade é que, em divórcios marcados por disputas
acirradas, a investigação patrimonial é indispensável. Esses processos
frequentemente envolvem tentativas de ocultação de bens, isto é, quando um
cônjuge busca esconder do outro partes do patrimônio acumulado em conjunto. No
Brasil, é frequente que apenas um dos parceiros gerencie a maior parte dos bens
familiares. Ao chegar o divórcio, esse administrador pode restringir o acesso a
contas bancárias, omitir saldos reais ou negar transparência sobre o patrimônio
integral do casal.
Sem uma investigação patrimonial, o divórcio
litigioso torna-se desigual e injusto. A investigação ilumina o patrimônio do
casal, permitindo que ambas as partes conheçam a totalidade dos ativos
partilháveis e as respectivas rendas tanto para o fim de partilhar os bens, a
depender do regime patrimonial aplicável, bem como para fins de fixação de
pensão alimentícia, quando for o caso. Na ausência dessa providência, a
dissolução do casamento ocorre às cegas, deixando a parte que tem menos
informação que a outra em posição vulnerável tanto nas negociações quanto no
âmbito processual.
As fraudes em divórcios podem envolver táticas
sofisticadas para dissimular bens conquistados em esforço mútuo. Servem como
exemplos doações simuladas; vendas fictícias; empréstimos inexistentes;
transferências de imóveis, veículos ou empresas para terceiros; criação de
empresas de fachada para ocultar participação real e dificultar a
rastreabilidade; abertura de contas bancárias em nome de laranjas;
armazenamento de dinheiro em espécie; envios para paraísos fiscais ou
investimentos não declarados em ações e fundos.
Quando empresas estão envolvidas, o cônjuge fraudador
pode desviar lucros, omitir faturamento ou adiar receitas para declará-las após
o divórcio. Outras artimanhas incluem a ocultação de bens móveis, como joias e
objetos de valor, que podem ser facilmente escondidos ou desviados. Há ainda a
subavaliação intencional de bens, assim como a invenção de dívidas fraudulentas
para reduzir o montante partilhável.
No caso de dívidas alegadas por um cônjuge contra o
outro, é crucial exigir comprovação de que elas de fato existam. Um cônjuge
pode afirmar que o patrimônio é menor devido a obrigações pendentes, que seriam
abatidas na divisão. Nesse cenário, o advogado do interessado deve requerer a
intimação dos supostos credores para que confirmem a origem e a documentação da
dívida. No caso das subavaliações, uma perícia judicial pode ser solicitada,
com a contratação de um avaliador independente para determinar o valor real do
bem.
Da mesma forma, o advogado pode demandar a
apresentação de documentos idôneos pelo cônjuge que alega existirem débitos
para diminuir o patrimônio a ser partilhado, como comprovantes de serviços
prestados.
De outra ponta, em situações de desvio de
rendimentos de ativos geradores de renda, é recomendável pleitear a quebra de
sigilo bancário, abrangendo tanto contas pessoais quanto CNPJs relacionados.
Isso permite rastrear o fluxo de dinheiro e verificar o destino dos recursos.
Para bens móveis e joias, a abordagem varia
conforme seja o tipo de bem. Joias, por exemplo, podem "desaparecer"
com facilidade. Uma medida inicial interessante nesses casos é requerer o
sequestro desses bens, viabilizando que um oficial de justiça localize e
apreenda objetos valiosos específicos. Outra estratégia é, logo após a
separação, ingressar com uma medida cautelar de arrolamento de bens, na qual o
oficial visita o domicílio e lista e registra itens como joias, obras de arte,
relógios e esculturas que guarnecem a residência. Esse documento oficial, com
fé pública, facilita contestações futuras em caso de eventual sumiço de bens
que seja perpetrado por quem ficou no domicílio do casal enquanto o outro teve
que sair.
Outro estratagema clássico é o desvio de
rendimentos e receitas produzidas por ativos geradores de renda, especialmente
quando apenas um do casal esteja controlando esses ativos, facilitando que
desvios desse tipo sejam perpetrados. Nesse tipo de situação é importante
requerer no processo a quebra de sigilo bancário, tanto da pessoa envolvida
como, se possível e a depender do caso, de eventuais pessoas jurídicas vinculadas
ao casal.
Aliás, são comuns casos em que apenas um dos
cônjuges detém a administração integral de todos os bens do casal, assim como é
normal situações nas quais cada cônjuge tem administração de seus próprios bens
e rendas, mas não tem total visão sobre o patrimônio e rendas do outro.
Em situações tais, muitas vezes ocorre de o cônjuge
administrador não querer abrir as informações completas sobre o patrimônio
comum com o outro. Esse cônjuge se recusa a entregar o extrato das contas e
outros dados sobre os bens partilháveis que estão sob sua administração e, com
isso, tenta forçar o outro a um acordo baseado só nas informações unilaterais
transmitidas por esse administrador. Isso gera uma situação de alta
vulnerabilidade, pois o cônjuge que não está na administração daqueles bens não
tem informação das finanças e do patrimônio do casal e, portanto, um acordo
celebrado dessa forma estaria viciado pela assimetria de informações entre os
envolvidos.
Naturalmente, não é possível aceitar um acordo a
cegas desse tipo.
Exatamente por isso, quando atuamos em casos assim,
sempre providenciamos, além de uma atuação processual enérgica, uma
investigação patrimonial dedicada. Com essa medida é possível mapear toda a
evolução pecuniária que fica documentada de diversas formas como, por exemplo,
as transações imobiliárias que dependem de escrituras de compra e venda e ficam
arquivadas em cartórios. Outras providências que podem fazer parte da
investigação patrimonial incluem identificar as matrículas e comprovar documentalmente
a evolução do patrimônio imobiliário; promover a quebra de sigilo fiscal para
obter as declarações de imposto de renda; pedir no processo a quebra de sigilo
bancário para descobrir o caminho do dinheiro, entre outras medidas. As
informações obtidas dessa forma não raro auxiliam a dar subsídio para pedidos
poderosos no processo, como uma medida liminar de bloqueio de bens.
Um case interessante para relatar e que
ilustra esse tema foi um no qual havia um casal era abastado que estava se divorciando
e que envolvia um cônjuge fazendeiro muito bem-sucedido e o outro cônjuge que
era do lar e alheio à administração do patrimônio. O cônjuge administrador
ofereceu uma fração muito ínfima do patrimônio ao outro na separação. Após
profunda investigação patrimonial em favor do cônjuge alienado foram
descobertas as fazendas não declaradas, apartamentos, veículos e algumas
empresas, que por sua vez tinham diversos outros bens integralizados nelas.
Foi possível até mesmo encontrar rebanhos bovinos,
cavalos de raça, e outros ativos de valor do tipo semovente. Para ser ter uma
ideia da amplitude do patrimônio escondido, até aeronaves foram descobertas na
investigação patrimonial. Muitas coisas encontradas na investigação a esposa
nem imaginava da existência. Consequentemente, a investigação patrimonial
acabou sendo essencial para o desfecho do caso e para que o cônjuge que estava
fora da administração daqueles bens tivesse acesso a uma partilha mais justa.
A investigação patrimonial atua, portanto, como um
farol em meio à névoa de incertezas e enganos que costuma pairar sobre os
divórcios litigiosos. A investigação transforma a suspeita em prova e a
desigualdade em equilíbrio. Ela entrega ao advogado não apenas argumentos, mas
a própria matéria-prima da justiça: a verdade dos fatos. Ao juiz, oferece um
mapa claro e seguro para navegar pelo complexo território da partilha,
viabilizando o desmantelamento das fraudes eventualmente perpetradas. Um
trabalho dessa magnitude, que combina a perspicácia investigativa à solidez
jurídica, exige profissionais que dominem esse cenário. A contratação de uma
equipe especializada nesse tipo de caso não é apenas uma recomendação, mas,
sim, o passo decisivo para assegurar a efetividade da Justiça, a utilidade do
processo e a prevalência da verdade.
Dr. Rommel Andriotti - advogado e sócio fundador do escritório Rommel Andriotti Advogados Associados. Atua como professor de Direito Civil e Processo Civil na Universidade Presbiteriana Mackenzie e também na Escola Paulista de Direito (EPD). É mestre em Direito (concentração em processo civil) pela PUC/SP (2020). É também mestre em Direito (concentração em Direito Civil) pela FADISP (2020). Possui pós-graduação lato sensu em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Paulista de Direito e é bacharel em Direito pelas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU, 2015).