As
guerras são conflitos armados entre nações ou povos pelos mais variados
motivos. As guerras impõem grandes perdas, com sofrimento e mortes, além dos
danos materiais às pessoas envolvidas. A convivência com a morte e os
ferimentos que poderiam ser evitados, além do medo, levam a muitas emoções como
a raiva, o ódio, sentimentos de vingança e reparação. As guerras carregam
sentimentos muitas vezes trazidos de gerações passadas, por conflitos
anteriores ou mesmo de riscos de genocídio. Situações tão complexas levam a
desejos de vingança e medo da aniquilação. As guerras trazem o que existe de
pior no ser humano, quando os inimigos são nossos algozes e presas, e desejamos
sua aniquilação. Perdemos nossa empatia.
As
guerras quebram as rotinas e as relações, causam desordem e insegurança. Além
dos danos psicológicos, o organismo é muito sobrecarregado pelo estresse e
perdas dos ritmos biológicos. A guerra exige do ser humano uma reação, por
vezes ultrapassando a capacidade de algo saudável, levando ao adoecimento
mental. O adoecer pode vir de várias formas e em intensidades diversas e, para
alguns, inclusive, o adoecimento pode se tornar crônico, com sintomas que
persistirão caso não sejam tratados. Podemos afirmar que ninguém sairá ileso de
uma guerra, todos terão suas marcas.
O
transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) é um quadro psiquiátrico que
acontece quando uma pessoa passa por situações traumáticas, onde há riscos a
integridade física ou à vida. No caso de guerras, o risco de desenvolvimento de
TEPT é muito elevado, sendo que metade das pessoas que passaram por um combate
podem ter desenvolvido sintomas. Em guerras onde a duração do conflito é longa,
os riscos são ainda maiores.
O
TEPT se caracteriza pela presença de sintomas de revivência, evitação,
hipervigilância, além de sintomas do humor e do pensamento. A revivência ocorre
na forma de lembranças ou pesadelos sobre os fatos traumáticos carregados da
emoção associadas à lembrança. As memórias são sofridas e vivenciadas como se
as agressões estivessem acontecendo novamente. As pessoas, então, começam a
evitar tudo aquilo que possa desencadear essas lembranças. Evitam lugares,
pessoas e temas relacionados.
Uma
vez que a pessoa vive como se as agressões possam ocorrer novamente a qualquer
momento, ela fica num estado de hipervigilância constante, o que acarreta
ansiedade e insônia, de modo que viva em sobressaltos. Por fim, existem vários
sintomas de pensamentos como pessimismo, culpa, amnésias, além de sintomas que
lembram muito um estado depressivo, como uma anestesia afetiva. Todos estes
sintomas causam muito sofrimento e incapacitação. Raramente melhoram
espontaneamente e, se não forem tratados, a cronificação é certa.
Mesmo
longe do Oriente Médio, hoje, conseguimos observar em tempo real pela internet
a tragédia da guerra, e com tristeza nos penalizamos com as pessoas de todas as
idades, de ambos os lados, sofrendo e morrendo. Com tristeza, imaginamos que
muitos já estão adoecidos, diante de tanto horror. Infelizmente, o impacto
desta guerra perdurará, mesmo que os combates cessem, na mente dos envolvidos
e, igualmente, para uma parcela considerável de pessoas, perdurará com muito
sofrimento e prejuízos, devido a transtornos mentais. Os horrores da guerra,
como a que ocorre na Faixa de Gaza, na Ucrânia ou qualquer outro conflito
certamente deixa danos à saúde mental que precisam ser tratados e que levam
tempo, anos, para serem trabalhados.
Marcelo Feijó de Melo - professor livre-docente do
Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina da Universidade
Federal de São Paulo (EPM/Unifesp)
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