A primeira fase da tão sonhada Reforma Tributária tem como proposta do governo federal mudanças no PIS e Cofins para as empresas, por meio do Projeto de Lei 3.887/2020. Pouco mais de 300 dias depois de ter sido apresentada, mesmo sem a primeira fase sequer tendo sido votada, o Poder Executivo finalmente deu sequência à proposta de mudanças no sistema tributário brasileiro. O que têm em comum essas duas fases? As polêmicas.
Na primeira etapa, entregue ao Poder Legislativo em
julho de 2020, empresas do setor de serviços questionaram – e muito – as
novas regras, que, se passarem, aumentarão – e muito – a carga tributária
desses segmentos. Já a segunda fase, levada no final de junho de 2021 pelo
ministro Paulo Guedes, é bem preocupante para empresários e contribuintes com
maior renda.
Existem mudanças importantes que, se passarem, irão
impactar – e muito – o caixa das empresas e de seus acionistas. O fato de haver
uma redução da alíquota de Imposto de Renda para as organizações privadas
dificilmente vai amenizar a tributação sobre dividendos.
Um exemplo muito ruim recai sobre as empresas que
administram bens. Muito comum hoje em dia, esse tipo de organização é muito benéfica
para seus sócios pois pode ser enquadrada no regime de apuração pelo sistema
“lucro presumido”. Isto faz com que a alíquota efetiva do IR fique em torno de
10,88% sobre a receita. Em uma empresa que praticamente só registra recebimento
de aluguel em sua contabilidade, é uma grande vantagem. Além do mais, esses
recursos têm os lucros distribuídos sem qualquer imposto via dividendos para os
acionistas. Com a proposta atual, se passar, esse tipo de segmento não poderá
mais optar pelo lucro presumido, ficando obrigatoriamente a adotar o lucro
real. Utilizando um exemplo em que uma administradora de bens tenha 80% de
lucros que são 100% distribuídos, haverá um aumento de carga tributária sobre
as receitas dos atuais 10,88% para 34,6%, isso já considerando a redução da
alíquota de IR dos atuais 15% para 10% em 2 anos.
Sobre a tributação dos dividendos, combinada com a
redução da alíquota de Imposto de Renda para empresas, vale ressaltar que o
efeito depende muito da política de distribuição de lucros para os acionistas e
o próprio reinvestimento no negócio. Parece que as mudanças são
desproporcionais, pois a alíquota de Imposto de Renda como proposta cai cinco
pontos percentuais em dois anos, enquanto os dividendos são tributados na
largada de zero para 20%. Mas é preciso analisar caso a caso. Imaginando uma
empresa do lucro real que distribui 100% dos seus lucros, a situação ficaria
muito ruim. Haveria um aumento de carga tributária sobre os lucros de 34% para
43,2%. Por outro lado, em uma empresa que tem como política distribuir 25% dos
lucros para os acionistas, a redução de carga seria de 34% para 32,6%.
Considerando o objetivo de equidade tributária, faz
muito sentido tributar os dividendos, porém, será que é o caminho ideal?
Segundo estudos da própria Receita Federal referente às entregas das
declarações de Imposto de Renda Pessoa Física do ano de 2017, a alíquota
efetiva de quem tinha rendimentos acima de 160 salários mínimos não passou de
5%, enquanto que, quem recebeu de 7 a 10 salários mínimos pagava algo em torno
de 6% mensais. Muito provavelmente, tais efeitos ocorrem porque os
contribuintes com rendas muito altas “vivem” de dividendos, sem qualquer
tributação. Ou seja, tributar esse público de alta renda pode fazer a balança
ficar mais equilibrada. Adicional a isso, fala-se muito na regulamentação do
IGF (imposto sobre grandes fortunas). Esse imposto voltou aos holofotes
ultimamente e está em discussão no STF.
A atualização da tabela de Imposto de Renda e a
possibilidade de atualização dos imóveis para as pessoas físicas são pontos
positivos dessa proposta, buscando maior equidade tributária em nosso país. Mas
outros temas parecem um verdadeiro pacote de “maldades”, principalmente para as
empresas e seus sócios. A redução da alíquota de Imposto de Renda para as
pessoas jurídicas em cinco pontos percentuais não será suficiente e vai gerar
aumento de carga tributária para as organizações.
Simulações demonstram aumento de mais de nove
pontos percentuais para organizações que distribuírem totalmente seus lucros.
Por outro lado, uma vez que parte dos lucros sejam reinvestidos na empresa
haveria redução da carga tributária. Diante das polêmicas, o caminho de reforma
parece estar longe, mas já é um primeiro passo. A proposta passará por várias
discussões no Congresso. A aposta é que, no final das contas, prevaleça o bom
senso – e que não haja aumento de carga tributária, mais uma vez…
Marco Aurélio Pitta - gerente de controladoria e contabilidade do Grupo
Positivo e coordenador de programas de MBA nas áreas Tributária, Contabilidade
e Controladoria da Universidade Positivo.
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