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quarta-feira, 26 de junho de 2019

Pesticidas estão prejudicando a saúde reprodutiva de homens e mulheres ao redor do mundo


 Confira o que pode ser feito para reduzir a exposição a produtos químicos e tóxicos
Pexels

 

O Brasil é um dos maiores usuários de agrotóxicos do mundo, o que pode ser justificado pela sua característica de ser também um dos maiores produtores e exportadores de alimentos do planeta. Há os que o defendem dizendo que são imprescindíveis, e os que o defenestram afirmando que são prejudiciais à saúde. A verdade é que, por aqui, muitos químicos banidos no exterior continuam a ser usados.

Cientistas de todos os lugares vêm relatando tendências preocupantes sobre o efeito desses produtos na saúde em geral e, em especial, sobre o aspecto reprodutivo da população em todo o mundo. Pesquisas mostram que os pesticidas são, pelo menos em parte, culpados por muitas alterações físicas. Estudos apontam para uma crescente evidência científica ligando produtos químicos a muitos danos à saúde reprodutiva, como a redução na contagem e qualidade de espermatozoides, puberdade precoce em meninas, defeitos congênitos, aborto espontâneo e natimortos, entre outros.

“Há poucos anos, o site National Survey of Family Growth fez um levantamento sobre casais com dificuldade em engravidar e, surpreendentemente, observou um aumento maior desse problema em pessoas com menos de 25 anos (42%). Isso, segundo a publicação, sugere que as alterações ambientais nos últimos anos prejudicaram mais os casais jovens, por terem sido expostos a substâncias tóxicas presentes no meio ambiente num período de vida mais precoce”, afirma Arnaldo Cambiaghi, especialista em Medicina Reprodutiva e diretor do Centro de Reprodução Humana do IPGO.



Hormônios interrompidos

Um grupo de produtos químicos - disruptores endócrinos - são particularmente propensos a interferir na saúde reprodutiva, mesmo quando os níveis de exposição são extremamente baixos. Alguns desses produtos químicos imitam os hormônios humanos ou interferem de alguma forma nos sistemas controlados por hormônios que podem bloquear (ou sobrecarregar) uma série de processos biológicos.

Ao longo da vida, os produtos químicos desreguladores endócrinos podem danificar o sistema reprodutivo de várias maneiras. Alguns matam ou danificam células; se forem espermatozoides ou oócitos, o resultado pode ser a infertilidade. Outros alteram a estrutura do DNA, causando mutações genéticas que podem resultar em defeitos congênitos ou incapacidade de conceber.

Alguns produtos químicos podem até causar efeitos "epigenéticos", ou seja, eles mudam a forma como os genes são expressos - não apenas para os expostos, mas também para as gerações futuras. Um bebê no útero é particularmente vulnerável a substâncias químicas desreguladoras do sistema endócrino, pois os hormônios estão ocupados regulando a diferenciação das células e o desenvolvimento dos órgãos.

Bebês expostos ao produto químico errado, justamente quando os órgãos reprodutivos estão se formando, podem sofrer danos que vão se desenrolar ao longo da vida. Cientistas da Sociedade Nacional de Endocrinologia norte-americana explicam por que o momento da exposição é tão importante: nos casos em que a ruptura é direcionada para a programação de uma função, por exemplo, saúde reprodutiva, isto pode interferir com a organização inicial da vida, seguida por um período latente, após o qual a função é ativada e a disfunção pode tornar-se óbvia.

Em outras palavras, a exposição a substâncias químicas, quando o sistema reprodutivo de um bebê está se desenvolvendo, pode descarrilar completamente o processo. Mas só se saberá ao certo o que ocorreu anos depois, quando surgem problemas durante a puberdade ou quando se tenta engravidar.


Pesticidas: um dos principais culpados


Os cientistas entendem que a exposição a pesticidas pode causar uma ampla gama de danos reprodutivos que afetam homens, mulheres e crianças. Alguns estudos sugerem que:

=No primeiro estudo desse tipo, cientistas de Harvard descobriram que os homens que comiam alimentos com mais resíduos de pesticidas tinham menor contagem de espermatozoides que também eram menos normais que os de outros homens.

=A exposição ao herbicida atrazina tem sido associada a distúrbios menstruais, bebês com baixo peso ao nascer e defeitos congênitos.
=Um estudo de 2013 ligou pesticidas liberados, incluindo o lindano organoclorado, ao aumento do risco de endometriose em mulheres.

Os pesticidas também foram implicados em aborto espontâneo, parto prematuro, fertilidade reduzida em homens e mulheres e na proporção sexual alterada (menos meninos nascendo).
Estudo feito em 2018 nos Estados Unidos e publicado no National Center for Biotechnology Information  Produtos Químicos Antiandrogênicos Mistos em Baixas Doses Individuais Produz Malformações do Trato Reprodutivo no Rato Masculino- confirma que a situação vem piorando:
 Os esforços de biomonitoramento mostraram claramente que todos os seres humanos estão expostos a misturas químicas. É preocupante se a exposição a misturas durante a gravidez contribui ou não para anomalias congênitas em crianças, mesmo quando uma dose individual de cada produto químico não afetaria o feto. Pensando hipoteticamente que a exposição in utero a uma mistura de substâncias químicas cobrindo múltiplos mecanismos de ação antiandrogênica em doses que, individualmente não têm efeito adverso, resultariam em alterações permanentes no trato reprodutivo no rato macho após o nascimento.

As mães grávidas foram expostas a uma série de diluições (100%, 50%, 25%, 12,5%, 6,25% ou controle veicular) de uma mistura contendo pesticidas, ftalatos e drogas (p, p'-DDE, linuron, procloraz). , procimidona, pirifluquinazona, vinclozolina, finasterida, flutamida, sinvastatina e 9 ftalatos [dipentila, diciclohexila, di-2-etilhexila, dibutila, benzilbutila, diisobutila, diisoheptila, dihexila e diheptil].

A dose máxima continha 20% de cada substância química de nível de efeito adverso mais baixo observado para a alteração reprodutiva masculina mais sensível após à exposição in utero. Foi descoberto que os filhotes de ratos machos apresentavam uma variedade de efeitos neonatais, puberais e adultos permanentes em todos os níveis de dose. Mesmo na mais baixa (cada substância química aproximadamente 80 vezes abaixo do nível de efeito adverso mais baixo observado) houve reduções permanentes em vários pesos de tecido do trato reprodutivo.

No grupo de dose máxima, 100% dos descendentes do sexo masculino apresentaram defeitos congênitos graves permanentes, incluindo malformações genitais. Apesar de atuar por meio de cinco diferentes eventos de iniciação molecular, 18 substâncias químicas puderam se combinar para produzir efeitos aditivos mesmo quando cada composto estava em uma dose relativamente baixa.

O efeito da 

presença de produtos tóxicos na saúde dos bebês


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No parto, estudos comprovam que, nos poucos segundos em que o bebê passa pelo ambiente vaginal, o contato com a flora influenciará de forma benéfica o seu sistema imunológico. Após o nascimento, sem dúvida alguma, o leite materno será o alimento mais saudável para o bebê. “Porém, ele também é um meio de excreção de toxinas e, por isso, infelizmente pode estar repleto de substâncias químicas como agrotóxicos. Portanto, quanto mais precoce for iniciado um processo de limpeza e desintoxicação na mãe, melhor será a qualidade do leite materno, assim como do ambiente intrauterino”, afirma Cambiaghi.
Em 2010, um artigo publicado na revista Pediatrics, a mais importante e tradicional revista científica de pediatria do mundo, estudou a relação de pesticidas e distúrbios de comportamento. Foi comprovada uma ligação entre a exposição a pesticidas e a presença de sintomas de transtorno de déficit de atenção com hiperatividade. Foram avaliados os níveis de pesticidas da urina de 1.139 crianças, e os autores concluíram que a exposição a pesticidas organofosforados, mesmo em níveis considerados “normais”, pode contribuir para o aparecimento do TDAH.
“Fica aqui mais um alerta: nenhuma doença genética tem caráter endêmico, ou seja, sua incidência não aumenta. Portanto, em todas as doenças, desde as mais simples como alergias, estresse e hiperatividade até infertilidade, aquelas autoimunes, autismo e câncer, quando existe um aumento da incidência delas, existe um ou provavelmente vários fatores ambientais envolvidos”, enfatiza o especialista.
“A multicausabilidade dessas doenças dificulta determinar os agentes. Mas existe uma clara relação entre as expansões das fronteiras agrícolas com o aumento da incidência de determinadas doenças em trabalhadores do campo, como leucemia em crianças que viveram em plantações de soja”, finaliza Cambiaghi.

O que pode ser feito para reduzir a exposição a produtos químicos e tóxicos

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. Não fume e evite tornar-se um fumante passivo;

· Procure saber o que compõe a água que você bebe;

· Se necessário, filtre a água, ferva-a;

· Reduza o consumo de espécie de peixes que contenham altos níveis de mercúrio, dioxina e PCBS, como o atum, mas não pare de comer essa carne. Se for utilizar pílulas de óleo de peixe, use as de marcas conhecidas. O ômega 3 contido nesses suplementos é importante antioxidante;

· Se possível, compre alimentos orgânicos. Se não for possível, lave e descasque os itens antes de comê-los para remover os produtos químicos agrícolas que eles possuem;

· Reduza ou evite o uso de pesticidas em casa, no jardim e nos seus animais quando possível. Tente alternativas não-tóxicas;

· Evite ambientes que foram dedetizados com pesticidas ou herbicidas. Dependendo do produto e condições do local, a duração do efeito pode ser de um dia a até um ano;

· Seja cauteloso com alguns alimentos coloridos. Em maquiagem, medicamentos ayurvedicos da Índia, algumas ervas chinesas, alguns brinquedos ou adornos de chiclete preparados nos Estados Unidos, pois, nesses produtos foram encontrados altos teores de chumbo;

· Evite mamadeiras e outros produtos de policarbonato que possam entrar em contato com a comida porque podem ter entre os componentes da fabricação o bisfenol (composto químico presente em garrafas de PVC);

· Procure saber se o material plástico contém phthalates (pergunte ao fabricante). Nunca cozinhe no micro-ondas alimentos em tigelas plásticas porque podem expelir componentes nocivos;

· Compre produtos pessoais (xampu, maquiagens, loções etc.) sem phthalates e outros tóxicos;

· Use produtos de limpeza não-tóxicos e biodegradáveis;

· Mantenha sua casa bem ventilada quando for pintá-la, limpá-la ou quando estiver fazendo qualquer trabalho usando cola, tinta, resinas etc;

· Evite o uso de florais e fragrâncias que perfumem o ambiente;

· Se julgar necessário, consulte um especialista em Medicina Ocupacional e Ambiental, caso esteja muito preocupado com o ambiente de trabalho ou de casa e queira uma avaliação da exposição pessoal;

· Procure não comer frutas e vegetais com casca, pois podem estar contaminados com pesticidas.





Fonte: Arnaldo Schizzi Cambiaghi é diretor do Centro de Reprodução Humana do IPGO, ginecologista-obstetra especialista em medicina reprodutiva. Membro-titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, da Sociedade Brasileira de Cirurgia Laparoscópica, da European Society of Human Reproductive Medicine. Formado pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa casa de São Paulo e pós-graduado pela AAGL, Illinois, EUA em Advance Laparoscopic Surgery. Também é autor de diversos livros.  


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