O Ministério da Educação publicou os dados do
Sistema de Avaliação da educação Básica (Saeb), referentes ao ano de 2017. Pela
primeira vez, o MEC apresentou os dados em uma escala de valores de 0 a 9 -
sendo que de 0 a 3, o conhecimento é insuficiente; de 4 a 6, básico; e de 7 a
9, adequado. Pois bem: o Ensino Médio foi classificado no nível 2 de
proficiência. Na série histórica, o quadro é o mesmo de 2009. Em matemática, a
média de pontos conseguiu, inclusive, ficar pior do que há 8 anos.
Um pouco mais de informações: nenhum Estado da
federação alcançou a meta do Ideb para o Ensino Médio, que era de 4,4. São
Paulo, inclusive, baixou. Também o Rio Janeiro e o Distrito Federal. As escolas
particulares não vão mal, mas não vão bem. Se a média para passar de ano fosse
6, só as redes particulares de Minas Gerais, Espírito Santo, Santa Catarina e
Distrito Federal teriam nota azul. Piauí, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul
e Mato Grosso do Sul teriam de conversar com a professora e propor um trabalho
extra, pois ficaram com nota 5,9.
Para o 9o ano do Ensino Fundamental, a média
esperada era de 4,7 e foi de 4,4. No entanto, no quinto ano do Ensino
Fundamental, apenas quatro Estados não cumpriram as metas previstas: Sergipe,
Amapá, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Os pequenos conseguem ir bem até o
quinto ano. Quando ingressam no chamado Fundamental II, a coisa apura. No
Ensino Médio, desanda.
E o que isso significa realmente? Que nossos jovens
do Ensino Médio, na sua imensa maioria, não sabem destacar a ideia principal de
um texto, ou interpretar um gráfico simples. Erram conta de mais. Trocam o S
pelo Z, o P pelo B. Ou seja, em pouco tempo, os alunos do Ensino Fundamental
saberão mais que os alunos do Ensino Médio. E o diploma, em vez de um carimbo
do MEC, terá uma imagem do fundo do poço.
A pergunta que não quer calar é: por que isso acontece?
E a resposta é simples, o que não quer dizer fácil: a escola não está gerando
aprendizado. O aluno aprende algo em uma série, mas não está usando esse
aprendizado na série seguinte. Daí esquece. E começa tudo de novo e, então,
aprende outras coisas, mas não aprofunda, não consolida, não sedimenta
conhecimento nenhum. Tudo fica ali, na superfície, nas duas primeiras linhas. E
quando o jovem é apresentado a um desafio que exija a mobilização das suas
aprendizagens, como quem usa ferramentas para consertar ou inventar algo, ele
estaca. Dá “tilt”.
E como gerar aprendizado? Em primeiríssimo lugar,
pela literacia. Se não soubermos ler e compreender os signos da nossa cultura,
nunca poderemos cultivar nada. Somos humanos porque nos inventamos por meio de
nossas mãos e nossas palavras. Desde milhares de anos, fazemos e ensinamos aos
outros como se faz e, então, os que aprendem, ensinam sem precisar mais fazer,
por meio das palavras. As palavras permitem a multiplicação do aprendizado
sobre as obras dos homens e mulheres no mundo. Se não soubermos utilizar com
desenvoltura e familiaridade a linguagem, nada será possível. Nem a matemática,
nem a física, nem a química, pela razão óbvia de que seu aprendizado depende
fundamentalmente da língua materna.
Faço coro ao que afirmava Roland Barthes: “se
tivesse que deixar uma única disciplina para ser ensinada na escola, escolheria
a Literatura”. Pois se compreendemos como as pessoas falam do mundo e como
explicam o mundo, como o resumem, como o enfrentam com as palavras, como buscam
decifrá-lo e transformá-lo, saberemos como fazer todo o resto, pois que
compreenderemos. Mas sem a ferramenta mestra da linguagem e da compreensão,
quando muito pescaremos um peixinho magro que só servirá para lembrar de nossa
fome e de nossa incapacidade de viver na beira de um rio caudaloso.
“Minha Pátria é minha língua”, já dizia o poeta. Sem saber ler e
compreender o que se lê, somos como os cegos do Saramago : “cegos que vêem,
cegos que, vendo, não vêem”.
Daniel Medeiros - Doutor em Educação Histórica pela UFPR, consultor de
conteúdos da área de Humanidades e professor no Curso Positivo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário