Prevalência de distúrbios vocais em profissionais
da educação varia entre 50% e 80%, afirma especialistaShutterstock
O ano letivo teve início em
fevereiro para ao menos 17 capitais do Brasil. Apesar de a maioria dos
professores ter mantido seus trabalhos de forma virtual durante o isolamento
social imposto pela pandemia de Covid-19, o retorno às salas de aulas exige
muito mais da voz, já que ela é uma das principais ferramentas de trabalho
destes profissionais.
Conforme a otorrinolaringologista do Hospital Paulista Dra. Luciana Fernandes
Costa, os professores são considerados grupo vulnerável aos distúrbios vocais,
devido ao seu uso intenso no dia a dia. A especialista destaca que a estimativa
de prevalência dos distúrbios vocais na população geral encontra-se entre 6% e
15%, enquanto, em professores, esses índices podem variar entre 50% e 80%, com
gravidade para cerca de 12%.
“Entre as lesões mais presentes estão as denominadas fonotraumáticas -- que se
desenvolvem a partir de padrões vocais inadequados, secundários à sobrecarga
fonatória. Há também uma ampla probabilidade de nódulos vocais, seguidos por
pólipos e alterações estruturais mínimas”, alerta Dra. Luciana.
Os professores também têm grandes chances de desenvolver disfonia, alteração de
algumas das qualidades acústicas da voz, tais como intensidade ou volume da
voz. “As consequências da disfonia persistente podem ser devastadoras para o
desempenho profissional, por vezes resultando em afastamentos e/ou
remanejamento para tarefas administrativas”, complementa a especialista.
A prevenção é a principal forma de combater os
distúrbios vocais. Segundo a médica, os fatores de risco à disfonia incluem
extensa jornada de trabalho, frequentemente superior a 40 horas semanais;
número excessivo de alunos por sala de aula, já que demandam mais atenção e
desgaste vocal; e instalações inadequadas, incluindo elevado ruído ambiental e
lousa com pó de giz.
“Esses fatores fazem com que os professores
aumentem a intensidade da voz para manter a atenção dos estudantes, sendo essa
a essência do fonotrauma, podendo levar ao desenvolvimento de lesões
laríngeas.”
A idade e o tempo de profissão também são
considerados fatores de risco para o desenvolvimento de lesões na laringe. Por
conta da correria diária, grande parte dos professores substitui as refeições
convencionais por lanches e fast-foods, favorecendo os distúrbios
gastrointestinais, principalmente o refluxo gastroesofágico, importantes
causadores da laringite.
“Doenças neurológicas ou endócrinas, hábitos
tabágicos ou alcoólicos e problemas respiratórios superiores recorrentes também
podem comprometer a qualidade vocal”, reitera a especialista.
Uso de máscaras
Mesmo com as crianças voltando às aulas e a vacinação em estágio avançado, é
importante manter as medidas sanitárias que ajudam a evitar a disseminação do
vírus. Nesse sentido, é fundamental manter o distanciamento, a higienização das
mãos e o uso correto das máscaras, que devem sempre cobrir nariz e boca.
Dra. Luciana ressalta que é possível e necessário lecionar utilizando o item.
"Busque algum modelo de máscara que seja
seguro e que permita a livre mobilidade da mandíbula, realizando pausas vocais
para descanso e hidratação, em ambiente seguro.”
Equipe multidisciplinar
Uma boa hidratação vocal e a escolha de alimentos que
não ressequem a garganta e causem pigarro, além de intervalos entre o uso da
voz, são de extrema importância para a manutenção da saúde vocal, mas nem
sempre são suficientes.
A fonoaudióloga Bruna Rainho Rocha destaca ser importante
ainda o apoio de um fonoaudiólogo, que pode auxiliar em situações de desconforto, cansaço vocal, rouquidão e falhas e mudanças na
voz ao longo do dia ou da semana.
“Os profissionais também trabalham com estratégias de
comunicação em geral, como o correto uso do microfone, escolha de vocabulário,
uso de gestos e até adequação da postura para falar”, explica.
Segundo Bruna, a própria fonoaudiologia pode ser um
método preventivo aos problemas vocais. “Mesmo que não apresentem alterações,
tanto professores como os demais profissionais que fazem uso intenso da voz
podem procurar um fonoaudiólogo. Nestes casos, para fazer condicionamento vocal
e aprender estratégias para o seu uso correto, podendo, assim, evitar eventuais
problemas na voz e na comunicação.”
De acordo com a Dra. Luciana, ao perceber sintomas como rouquidão, fadiga, cansaço vocal, instabilidade na
voz, dor ou desconforto na garganta e esforço para falar, principalmente de forma
recorrente, é necessária uma avaliação médica.
“Os problemas vocais podem não ser transitórios, e
muitos casos exigirão tratamento e acompanhamento multidisciplinar do médico e
do fonoaudiólogo, podendo, inclusive, envolver opções medicamentosas
ou cirúrgicas”, finaliza a especialista.