A depressão vai ser a
doença mais comum do mundo até 2030, de acordo com a Organização Mundial da
Saúde (OMS). Estima-se que mais de 450
milhões de pessoas sofrem de algum transtorno mental. Apesar dos números
expressivos, ainda é grande o desconhecimento sobre a doença.
A dieta, no entanto, tem
relação direta com o nosso humor. Alguns alimentos, como vegetais escuros,
cogumelos e açafrão foram apontados como influenciadores de emoções mais
intensas. Com isso, estudos sobre a ligação entre vegetarianismo e depressão
começaram a ser realizados, para entender se esses hábitos nutricionais estão
associados a transtornos mentais.
Para ajudar você a
entender melhor o que diz a ciência sobre a ligação entre vegetarianismo e
depressão, convidamos a Karina Okajima Fukumitsu, psicóloga, especialista em
suicidologia e pós-doutoranda pelo Instituto de Psicologia da USP, para fazer
uma análise sobre o tema. Acompanhe!
O que diz a ciência sobre a ligação entre vegetarianismo e
depressão?
Nos últimos anos houve
um aumento de estudos relacionadas aos efeitos da dieta vegetariana no status
nutricional e na saúde física. De modo geral, as pesquisas têm demonstrado que
os vegetarianos apresentam boa saúde física quando comparados com os padrões
nacionais.
Entretanto, a condição nutricional
resultante da dieta vegetariana, sem nenhum tipo de carne, pode afetar a função
neuronal e a plasticidade sináptica, que por sua vez, influencia os processos
cerebrais envolvidos na manutenção dos transtornos mentais.
Os vegetarianos
apresentam menores concentrações teciduais de ácidos graxos n-3 de cadeia longa
e vitamina B12, o que pode aumentar o risco de depressão. Isso acontece porque
a carne vermelha é um dos alimentos mais ricos nesse nutriente, a sua ausência
pode influenciar no desenvolvimento de transtornos mentais. Como aponta o
estudo “Vegetarian lifestyle and
monitoring of vitamin B-12 status”.
Além disso, outro fator
apontado na pesquisa “Vegetarian diet and mental
disorders: results from a representative community survey” é que
vegetarianos e não vegetarianos diferem em características psicológicas e
sociodemográficas, o que segundo os autores pode influenciar nos casos de
transtornos mentais. No geral, vegetarianos são majoritariamente mulheres que
vivem em centros urbanos e são solteiras, aspectos relacionados à presença de
doenças mentais.
Qual o argumento das pesquisas contrárias a ligação entre
vegetarianismo e depressão?
Enquanto alguns estudos
apontam para uma suposta ligação entre vegetarianismo e depressão, outras pesquisas defendem que os baixos níveis de vitaminas B12, B9 e
ômega-3, que são associados como a principal causa para um maior riscos de
depressão em vegetarianos, podem ser prevenidos com a suplementação desses
nutrientes, o que reduziria a sua influência nos casos de doenças mentais.
Além disso, pesquisadores
explicam que nem todas as pessoas que se identificam como vegetarianos consomem
os mesmos alimentos, especialmente quando se trata de ovos, peixes e produtos
lácteos. Portanto, segundo eles, isso, por si só, impossibilita afirmações
concretas sobre a população vegetariana.
A Sociedade Vegetariana
Brasileira (SVB) também se manifestou sobre as
suposições e defendeu que não existem estudos que comprovem a ligação do
vegetarianismo e a depressão a partir de diagnósticos médicos. A SVB ainda
argumenta que as pesquisas realizadas são baseadas em conversas entre o
entrevistado e o entrevistador, e portanto, são superficiais.
Outro ponto de destaque
é sobre as características sociodemográficas e de gênero. Como aponta a SVB, a
maior percentagem de mulheres vegetarianas, não impacta em um maior risco de
desenvolvimento de doenças mentais. Uma vez que esse público tende a ser mais
atento ao próprio corpo do que os homens, além de visitarem o médico com mais
frequência, o que não significa uma pior saúde, mas sim um maior cuidado.
Qual a análise dos especialistas sobre a ligação entre
vegetarianismo e depressão?
Segundo a psicóloga
Karina Okajima Fukumitsu se tratando de processos autodestrutivos, ela sempre
pergunta como os pacientes se alimenta. Isso porque a forma como eles se nutrem
é um processo de escolha, em que a pessoa decide não consumir alguns tipos de
alimentos, porque acreditam que eles podem fazer mal a elas ou ao meio
ambiente.
“Entender como se dá a
alimentação do indivíduo é importante para entender o comportamento
autodestrutivo, porque quando a pessoa está passando por um transtorno mental,
o que mais se perde é a capacidade de discriminação do que é bom ou ruim para
ela”, explica a psicóloga.
No entanto, optar por
uma dieta que difere do senso do comum, do que a maioria adota não é fácil. E o
julgamento com das escolhas é um dos fatores que mais gera o sofrimento. A
dificuldade da pessoa poder escolher, poder renunciar, poder discriminar, o que
é bom para ela e o que é ruim afeta o seu estado psicológico.
Com o sofrimento pode se
expressar neste contexto? Como um processo autodestrutivo, Fukumitsu explica
que “esses processos são aprendidos, porque muitas vezes são a única
maneira até o momento que a pessoa encontra para responder a certas
adversidades e certos problemas”.
Portanto, segundo a
especialista apesar de alguns indícios apontarem para uma suposta ligação entre
o vegetarianismo e a depressão, não podemos afirmar que uma dieta sem carne
influencia diretamente no risco de transtornos mentais. “Eu acho que é uma
percepção muito fechada, muito causalista, de causa e efeito. A gente não pode
ser reducionista, principalmente, na questão do suicídio” argumenta Fukumitsu.
Para a especialista o
desenvolvimento de transtornos mentais está mais associado ao sofrimento do que
a alimentação. O estado de espírito de uma pessoa depende muito mais de coisas
internas do que da dieta que ela segue propriamente dita. “O grande vilão da
história é o sofrimento e não é a comida que a gente escolhe comer”, acrescenta
Fukumitsu.
Afinal, como perceber se alguém está com depressão?
A depressão é uma doença
mental. Ela produz alterações no humor causando uma tristeza profunda, forte sentimento de
desesperança e perda de interesse por atividades do seu dia a dia. Por se
tratar um problema silencioso e incapacitante, a Organização Mundial da Saúde
(OMS) a classificou como o mal do século.
Entretanto, nem sempre é
fácil identificar que nós ou pessoas próximas estão com depressão. Além disso,
geralmente, o indivíduo que apresenta um quadro de tristeza profunda não tem
vontade de procurar um tratamento por conta própria. Por isso, é essencial
observar os sintomas da doença naqueles que estão próximos da gente.
A depressão pode se
desenvolver em qualquer fase da vida, ainda na infância ou na fase adulta.
Neste caso, ela pode ser desencadeada por algum gatilho, como traumas ou alguma
situação de grande incômodo para uma pessoa. Os motivos podem ser diversos e,
normalmente, estão ligados a um acontecimento.
O principal sintoma da
depressão é a tristeza constante. No entanto, outros sinais como baixa
autoestima, perda do interesse por atividades da rotina, dores pelo corpo sem
causa definida, pouca energia podem ser identificados no paciente com
depressão. Delírios e alucinações também podem acontecer nos casos mais graves.
Do ponto de vista
médico, só é considerado como depressão os sintomas que persistente, por, pelo
menos, duas semanas. Sendo que é válido ressaltar que neste intervalo o
paciente pode apresentar uma melhora e depois um declínio novamente.
Portanto, procurar uma ajuda médica é
essencial para entender os sintomas. Além disso, como base em tudo o que foi
apresentado podemos concluir que as pesquisas sobre a ligação entre
vegetarianismo e depressão ainda são prematuras e precisam ser mais estudadas. No
entanto, isso não exclui a importância de uma análise psicológica.