Esse ano de 2016 realmente vai ficar na
história. Muitos acontecimentos relevantes, alguns trágicos, outros
assustadores. Tanto o é que a maioria tem contado os minutos para deixá-lo para
trás, na esperança de um novo e melhor ano. No Direito Digital também tivemos
acontecimentos relevantes, intimamente ligados com episódios
político-econômicos que estarão nas retrospectivas dos principais meios de
comunicação no findar do ano.
Vejamos alguns acontecimentos no
Direito Digital nesse ano de 2016.
Pouco antes do impeachment da
ex-presidente Dilma Roussef, a então chefe do executivo editou o Decreto nº
8.771/16, regulamentando alguns dispositivos do Marco Civil da Internet (MCI).
Embora não tenha adentrado em questões polêmicas como a guarda da porta-lógica
pelos provedores de aplicação de Internet, abrandou as discussões acerca da
neutralidade da rede, ao vedar a prática do “zero rating”, ou seja, arranjos
comerciais que prestigiam determinado conteúdo, sem cobrar pelo tráfego, em
detrimento de outros que continuariam a consumir o pacote de dados, o que
violaria a independência e liberdade da rede mundial de computadores, além de
desmotivar novos empreendimentos em tecnologia. Importante lembrar também que o
Decreto definiu regras para solicitação de dados cadastrais por autoridades
administrativas, para não se tornar um abuso a prerrogativa do §3º do art. 10
do MCI.
O Regulamento do Marco Civil também
trouxe diretrizes relevantes na proteção dos dados coletados pela Internet,
obrigando empresas a investirem pesado em compliance na segurança da
informação, protegendo acessos desautorizados e criando políticas internas
eficazes, sob pena de se verem obrigadas ao pagamento de multas.
A crise política também serviu para
proteger o Marco Civil ao não dar condições ao Congresso Nacional para votação
de projetos que desfigurariam totalmente os princípios da Lei nº 12.965/14,
como alguns advindos da CPI dos Crimes Cibernéticos, que obrigam os provedores
a removerem conteúdo mesmo sem ordem judicial. Considerando que a maioria dos
ilícitos são relacionados a crimes contra a honra, a subjetividade de
determinada ofensa tem que ficar sob o escrutínio do Poder Judiciário,
justamente para privilegiar a liberdade de expressão.
Por outro lado, a crise política teve
um viés negativo ao tornar ainda mais demorada a discussão e aprovação do PL de
Proteção de Dados Pessoais. O Brasil continua sendo um dos poucos países a não
regular a matéria, trazendo insegurança para investidores e risco à vida
privada e intimidade dos cidadãos brasileiros. Audiências públicas serão
agendadas para 2017.
Quanto à privacidade, o ano de 2016 foi
emblemático. A disputa entre a Apple e o FBI, na qual a polícia federal
americana exigia que a empresa criasse uma “backdoor” nos seus aparelhos que
permitisse o acesso para investigação dos smartphones de pessoas investigadas.
Disputa essa que findou sem uma decisão judicial, uma vez que o FBI conseguiu
acessar por caminhos menos burocráticos.
No mesmo viés da proteção a
privacidade, aqui no Brasil, persistia a disputa entre o Estado e o Facebook,
com esse se recusando a fornecer dados do aplicativo Whatsapp e culminando com
ordens de bloqueio do aplicativo para todos os usuários. Que em 2017, nosso
Poder Judiciário esteja mais capacitado tecnicamente para entender, de fato, o
que é ou não obrigatório por lei armazenar, o que realmente os provedores armazenam,
diferenciando registros de conteúdo de comunicações, para então poder
determinar de forma mais assertiva o fornecimento. E, em caso de
descumprimento, que busquem medidas menos agressivas, tais como a de bloquear
novos cadastros ou impor multas mais contundentes. E, nesse último caso, que os
Tribunais prestigiem os juízes de primeira instância e não reduzam todas
sanções que chegarem a seu crivo, salvo casos em que o fornecimento seja
tecnicamente inviável.
Em um ano de crise econômica e elevadas
taxas de desemprego, o empreendedorismo tornou-se protagonista e as startups as
grandes estrelas. Não apenas pelo fato de o empreendedorismo digital ser aquele
que demanda menor investimento inicial, como também, e principalmente, pela
modificação na Lei do Simples Nacional pela Lei Complementar nº 155/2016, que
trouxe ao ordenamento jurídico a figura do investidor-anjo, dando maior
segurança jurídica para o aporte de recursos em micro e empresas de pequeno
porte, ao não integrar o capital social e não responder pelas dívidas da
empresa aportada, por exemplo. Embora entre em vigor apenas em 2017, não deixou
de ser uma luz de esperança para o ano vindouro.
Em 2016 continuaram em níveis
preocupantes os casos de crimes de ódio e “nudes”
nas redes sociais. Que em 2017, tenhamos mais efetividade e rapidez na
investigação e, por outro lado, maior conscientização sobre a gravidade de tais
ocorrências em meio digital.
Para 2017, ainda há: o julgamento da
ADPF 403 sobre o bloqueio de aplicativos e o julgamento do caso Aida Curi, que
poderá ter reflexos claros na aplicação do direito à desindexação ou ao
esquecimento, como frequentemente é confundido e, não é à toa que os big
players, Google e Facebook, fizeram em 2016 inúmeros eventos de lobby para
posicionar sua posição de manter os dados a qualquer custo, sejam quais forem
as informações que se pretende remover e mesmo diante de flagrante violação a
direitos individuais e sem qualquer interesse público a ser sopesado.
Que em 2017 nossos políticos entendam
que a solução econômica de um país passa, necessariamente, pelo incentivo ao
empreendedorismo e que, esse hoje, se consolida principalmente em ambiente
digital, criando cenários ainda mais favoráveis às startups, para que os
brasileiros usem todo seu talento nessa área, reconhecido mundialmente, a
partir de empresas criadas e estabelecidas em solo nacional.
Rafael
Fernandes Maciel