O prédio de 1928 ficou décadas abandonado e foi palco de vários crimes. Agora ele será reaberto, em 31 de outubro, Dia das Bruxas, como um negócio que mistura experiências teatrais, jogos de fuga e um bar exclusivo
Abandonado por décadas, o
Edifício Rolim, no número 87 da Praça da Sé, se prepara para ser reaberto
no próximo dia 31 de outubro, quando se comemora o Dia das Bruxas. A data não
foi escolhida por acaso. Inaugurado em 1928 e assinado pelo arquiteto Hipólito
Gustavo Pujol (responsável também pelo prédio do Centro Cultural Banco do
Brasil - CCBB), o Rolim ocupa o terreno de uma antiga igreja e foi palco de
vários crimes ao longo do tempo. O edifício tem fama de mal-assombrado.
"Melhor impossível",
diz Facundo Guerra, um dos empresários responsáveis pela recuperação do Rolim,
que se transformou em uma espécie de "casa do terror" onde se
pretende misturar experiências teatrais, jogos de fuga (ou escape rooms),
enigmas, história e o acesso a um bar exclusivo.
Algo diferenciado na região, mas alinhado com o movimento de revitalização de prédios históricos do Centro, na tentativa de deixar essa área nobre da cidade mais atraente para o público.
Facundo é dono de negócios icônicos que resgataram a história cultural da cidade, como o Riviera Bar, o Mirante da Nove de Julho e o Bar dos Arcos, no subsolo do Theatro Municipal |
Figura conhecida no Centro, Facundo é dono de negócios icônicos que resgataram a história cultural da cidade, como, por exemplo, o Riviera Bar, o Mirante da Nove de Julho e o Bar dos Arcos, no subsolo do Theatro Municipal. Parceiro da Fábrica de Bares em outros negócios, Facundo foi um dos primeiros a saber quando Cairê Aoas, sócio da Fábrica, comprou o Edifício Rolim, que está bem ao lado do Caixa Cultural.
Sempre de olho na
disponibilidade de construções históricas e especialista em recuperar pontos
tradicionais da noite paulistana, Cairê diz ter sido atraído pelo preço de R$ 3
milhões pelo prédio todo - o mesmo que, segundo ele, se pagaria em um único
apartamento na região do centro expandido.
Quem observa o Rolim de longe
não deixa de notar uma espécie de farol em sua cúpula, que torna o prédio
único. Na época em que foi lançado como edifício de escritórios, com comércio
no térreo, se destacava em uma Praça da Sé que ainda não era tão verticalizada.
Tombado como patrimônio
cultural de São Paulo desde 2015, em conjunto com outras construções do entorno
do Pateo do Collegio, não há previsão, por ora, de restauro da fachada, que
seguirá coberta por uma tela. "É um exemplar do Pujol, cheio de história.
Não tinha como deixar passar", diz Cairê.
A recepção do Rolim recebeu papel de parede e peças de decoração inspirada
nas décadas de 1950, 1960 e 1970, inclusive com cenografia que imita animais empalhados
PARA OS
FORTES
Mesmo sem ter algo planejado e
considerando a oportunidade como única, a dupla pensou inicialmente em
transformar o Rolim em um hotel, mas logo desistiram. O ponto, segundo eles,
estava marcado. Tinha a questão do abandono e era muito associado à Praça da
Sé, considerada perigosa naquele momento. De acordo com os sócios da nova
experiência de horror, o prédio estava praticamente vazio nos pavimentos acima
do térreo.
Sem outras ideias, Facundo
contratou uma historiadora, Paula Febbe, para destrinchar o lugar. Assim,
descobriram que ali, onde funcionou o primeiro apart-hotel de São Paulo, entre
1928 e 1950, ocorreram dois suicídios e 19 assassinatos — a maioria
feminicídios.
"Pesado demais",
pensou o empresário, que não demorou muito para fazer uma associação entre a
história do lugar e o que era reproduzido em espaços de terror, como há na
Coreia do Sul, Japão e nos Estados Unidos, onde ele visitou mais de 30 casas
para se inspirar. No Brasil, o mais próximo que Facundo diz ter visto é o Abadom,
em Santo Amaro, que ele já havia visitado com a filha e que chegou a ter quase
dez mil pessoas na fila de espera.
A partir disso tudo, a dupla
resolveu recriar uma experiência de terror, inédita para a cidade, com um apelo
teatral, passando ao público a impressão de se estar dentro de um jogo por meio
de uma cenografia tão especial que beira o real. A temática fez com que Cadu
Dib e Rafael Bechara, ambos da Abadom - Experiências de Horror, também
entrassem na gestão do negócio.
Com ingressos vendidos a partir
de R$ 99 (e os primeiros deles já esgotados), a proposta é que grupos de no
máximo dez pessoas disponham de 45 minutos para seguir pistas, decifrar
enigmas, subir os andares e chegar a um cofre forte usado por ourives que
trabalharam por lá no passado.
O percurso é todo costurado por
uma narrativa e passa por mais de 20 ambientes, desde uma sala de chá com ares
de abandono até um quarto invertido, com cama e demais móveis presos ao teto.
Tudo isso acontece enquanto o
prédio está infestado de zumbis - são 25 atores espalhados por lá -, em
cenários que reproduzem cenas de horror, com direito a cheiros, iluminação,
macas vindas do IML de verdade, correntes, manequins, quadros virados ao
contrário, paredes rabiscadas, móveis antigos e caixas de som por toda parte
reproduzindo muitos gritos.
Quando a experiência termina, os participantes são convidados a tomar um drinque no Grito Bar, no 7º andar. O espaço também servirá pizzas. Outros pavimentos incluirão escape games (jogo imersivo de escape, em um ambiente único), um desafio (com prêmio de R$ 2,5 mil) e espaços para eventos, como festas e lançamentos (o que inclui o terraço, com vista para a Catedral e o Farol Santander).
REINVENTANDO PRÉDIOS ABANDONADOS
Sem ter passado por qualquer
reforma estrutural, no início deste ano, o prédio começou a ser adaptado para o
projeto, segundo Facundo. A remodelação incluiu intervenções elétricas, um novo
elevador, que mantém a estética do anterior, além da intensificação da atmosfera
de decadência, com efeitos de teto descascado, mofo e paredes quebradas.
Um dos primeiros pavimentos foi
adaptado para ser a recepção, como se fosse uma grande sala de estar, com
móveis, papel de parede e peças de decoração inspiradas nas décadas de 1950,
1960 e 1970, inclusive com cenografia que imita animais empalhados.
Dali, o público é direcionado
para um cômodo decorado como se fosse um museu da história do Edifício Rolim.
"A intenção nesse momento é mostrar por que o prédio precisa ser
reinserido e resgatado pela comunidade", diz Facundo.
Após esse momento, o grupo de
visitantes passa a ser perseguido por zumbis, dando início à fuga por seis
andares. Alguns cômodos tiveram o pé-direito reduzido, para aumentar a sensação
de claustrofobia e a proximidade com o cenário e os atores, embora as 90 salas
dos antigos escritórios já fossem pequenas. Na cenografia, objetos e móveis
foram garimpados em brechós e a decoração inclui até a reprodução de cadáveres
pelo caminho.
Sem saber o que esperar e como
o negócio irá repercutir, Facundo diz não existir uma receita para ter sucesso
nessa missão de identificar pontos históricos abandonados da região central,
reunir investidores e levantar um novo empreendimento na área de
entretenimento, sempre mantendo uma ligação com os áureos tempos do lugar.
Hoje, ele também prepara a
abertura do bar Formosa, em um espaço abaixo do Viaduto do Chá, também no
Centro. "É muito difícil trabalhar com prédio histórico, os órgãos
públicos não têm a perspectiva do empresário e os incentivos atuais são bem
pouco significativos. Ainda assim, digo que o Centro não precisa de argamassa
para viver, precisa de gente", disse.
IMAGENS: divulgação
Mariana Missiaggia
https://dcomercio.com.br/publicacao/s/rolim-a-nova-casa-do-terror-de-facundo-guerra-no-centro-de-sp
Nenhum comentário:
Postar um comentário