Estudo feito pela
organização em 14 países onde MSF trabalha mostra que muitos ainda não adotaram
diretrizes da OMS para tratar a doença
Um novo relatório divulgado
hoje por Médicos Sem Fronteiras (MSF) mostra que crianças com tuberculose
(TB) continuam sendo deixadas para trás no esforço global para acabar com a
doença. O relatório, “TACTIC: Testar, Evitar, Curar TB em Crianças”, analisou
as diretrizes políticas sobre a tuberculose em 14 países* com alta carga de
tuberculose, revelando que muitos deles estão atrasados no alinhamento de suas
políticas nacionais de combate à doença com as mais recentes diretrizes da
Organização Mundial da Saúde (OMS).
MSF pede a todos os países que atualizem suas
diretrizes nacionais para que estejam alinhadas com as recomendações da OMS
para o cuidado de crianças com tuberculose e que aloquem os recursos
necessários, além de desenvolver planos claros com prazos para implementar as
políticas e aumentar o acesso à prevenção, diagnóstico e tratamento da tuberculose
em crianças. MSF também pede aos doadores internacionais e agências de suporte
técnico que forneçam financiamento suficiente aos países para apoiar as
reformas e a implementação de políticas de tuberculose pediátrica.
“A tuberculose é curável, inclusive
em crianças. A OMS atualizou as políticas para orientar os países a fornecer o
melhor cuidado possível para crianças com tuberculose, que é uma das doenças
infecciosas mais mortais do mundo”, disse Stijn Deborggraeve, consultor em
diagnósticos da Campanha de Acesso de MSF. “No entanto, os países estão
atrasados na adoção e implementação dessas soluções para testar, prevenir e
tratar a tuberculose em crianças. Pedimos aos países, doadores e agências
técnicas que acabem com esse status quo mortal e intensifiquem seus esforços
para garantir o diagnóstico e o tratamento oportunos da tuberculose em
crianças. Não podemos mais nos dar ao luxo de ficar parados — cada atraso
significa que mais crianças morrem desnecessariamente.”
Dos 14 indicadores de política medidos no relatório
de MSF, apenas as políticas de um país estão totalmente alinhadas com as
orientações da OMS, enquanto sete países têm mais de 80% de alinhamento e
quatro países ainda estão abaixo de 50% de alinhamento. As maiores lacunas
foram encontradas nas políticas relacionadas ao diagnóstico da tuberculose em
crianças. Por exemplo, apenas 5 dos 14 países adaptaram suas diretrizes para
iniciar o tratamento da tuberculose em crianças quando os sintomas indicam
fortemente a doença, mesmo que os testes bacteriológicos sejam negativos. Além
disso, apenas 4 desses 5 países têm os recursos necessários para implementar
essa orientação de forma eficaz.
A situação no Brasil não foi
avaliada no estudo de MSF. No país, as diretrizes de tratamento e diagnóstico
foram atualizadas de acordo com as últimas recomendações da OMS. Desde 2020, há
uma tendência de crescimento de novos casos na faixa etária de até 15 anos, e
dados recentes mostram um alto índice de subdiagnóstico, podendo haver até 50%
a mais de casos neste grupo do que seria esperado com base em dados oficiais.
No ano passado foram diagnosticados no Brasil 80 mil casos novos de TB, sendo
3.406 (3.6%) em crianças de até 15 anos.
A OMS estima que 1,25 milhão de crianças e
adolescentes jovens (0-14 anos) adoeçam de tuberculose a cada ano, mas apenas
metade dessas crianças é diagnosticada e tratada. Com base nas evidências
científicas mais recentes, a OMS revisou suas orientações em 2022 para o
gerenciamento de crianças e adolescentes com tuberculose e fez várias
recomendações importantes, incluindo o uso de algoritmos de decisão de
tratamento que permitem que muitas crianças sejam diagnosticadas com base
apenas nos sintomas, na ausência de confirmação laboratorial, e a oferta de
regimes orais curtos para tratar e prevenir a tuberculose em crianças. Se
adotadas e implementadas, essas orientações da OMS melhorariam drasticamente o
diagnóstico e a qualidade do atendimento para crianças com tuberculose.
“Desde que começamos a
implementar as recomendações da OMS para crianças no distrito de Bombali,
começamos a encontrar e tratar muito mais crianças com tuberculose,” disse
Joseph Sesey, diretor clínico de MSF em Makeni, Serra Leoa. “Essas novas
recomendações nos ajudaram a evitar o diagnóstico incorreto em crianças. Os
médicos que hesitavam em iniciar o tratamento da tuberculose em crianças sem
resultados positivos para os testes de tuberculose agora se sentem mais
confiantes em diagnosticar a doença apenas com base nos sintomas clínicos,
utilizando as recomendações da OMS. Eu notei uma redução significativa nas
mortes entre crianças com tuberculose em muitos centros de saúde.”
No entanto, o trabalho não para com as reformas
políticas. Por exemplo, novos regimes mais curtos e totalmente orais são agora
recomendados pela OMS tanto para o tratamento da tuberculose suscetível a
medicamentos (DS-) quanto para a tuberculose resistente a medicamentos (DR-TB)
em crianças, mas sua implementação nos países continua lenta. Além disso,
embora novos medicamentos para tuberculose, adequados para crianças, estejam
disponíveis para DS- e DR-TB, eles nem sempre são adquiridos pelos países.
“É lamentável que formulações
de medicamentos para tuberculose adequadas para crianças ainda não estejam
disponíveis em muitos países devido a barreiras burocráticas e lacunas de
financiamento,” disse a Dra. Cathy Hewison, chefe do grupo de trabalho sobre
tuberculose de MSF. “Como resultado, as crianças com tuberculose são forçadas a
engolir medicamentos triturados e amargos, sem doses apropriadas baseadas no
peso, colocando-as em grave risco de efeitos colaterais e falha no tratamento.
Esse descaso precisa acabar agora. Pedimos que governos, doadores e
organizações de saúde globais ajam com urgência, garantindo que nenhuma criança
morra ou sofra de uma doença evitável e tratável como a tuberculose. As
ferramentas e tratamentos que temos devem chegar às crianças que mais precisam
– agora.”
*Afeganistão, República
Centro-Africana, República Democrática do Congo, Guiné, Índia, Moçambique,
Níger, Nigéria, Paquistão, Filipinas, Serra Leoa, Somália, República do Sudão
do Sul, Uganda.
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