Pesquisa feita com roedores no
Instituto de Ciências Biomédicas da USP usou técnicas de ponta e foi divulgada
na revista Current BiologyEstudo identificou o sítio crítico para identificação
de ameaças no cérebro de roedores
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Artigo publicado na revista Current Biology descreve experimentos
que possibilitaram mapear com precisão locais no cérebro responsáveis pela identificação
imediata de ameaças e pela formação de memória de medo.
“Estávamos interessados em ver
uma região do cérebro relacionada à sinalização de medo, como ela poderia
identificar ambientes relacionados previamente a uma ameaça física ou
predatória, como um local em que o indivíduo sofreu um estímulo físico eversivo
[que causa destruição]”, conta Newton Sabino Canteras, professor titular do Departamento de Anatomia do Instituto de Ciências
Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP) e um dos autores do artigo.
O hipocampo sabidamente está
envolvido na navegação espacial e orientação do corpo no ambiente – e também
agrega as ameaças ambientais. O registro do que for perigoso vai ser “jogado”
lá, de tal maneira que é possível computar no ambiente de onde vem a ameaça,
explica o cientista. Outra estrutura que faz parte do hipocampo é o subículo.
“Basicamente essa é a estrela
do espetáculo. Ela transfere as informações ligadas à ameaça ambiental ao
hipotálamo. Então nossa pergunta foi como essa estrutura se comporta quando o
animal está frente a um ambiente previamente associado a um estímulo aversivo”,
conta Canteras.
Para observar a atividade desse
núcleo, o grupo utilizou fotometria de fibra. “Colocamos um vírus que expressa
uma proteína sensível à entrada de cálcio e pode registrar a atividade celular.
Conforme há atividade celular, vai emitindo mais fluorescência.”
Resumo gráfico da pesquisa crédito: Juliette M.A. Viellard et al./Current Biology |
O paradigma comportamental
usado foi habituar um camundongo em um aparato com duas caixas ligadas por um
corredor. Numa dessas caixas, o roedor foi confinado e recebeu estímulos
físicos aversivos (choque nas patas). No dia seguinte, o animal foi colocado no
aparato experimental de forma a evitar a caixa aversiva.
“Normalmente, quando é testado
assim, ele estica o corpinho, vai e volta, mas não entra mais na caixa onde
recebeu o choque, tem uma série de reações que a gente chama de evitação.”
Na análise fotométrica com foco
no núcleo pré-mamilar dorsal (PMd), uma interface crítica do circuito neuronal
investigado, foi detectado que o PMd fica particularmente ativo quando o animal
se direciona ao local aversivo e apresenta um aumento ainda maior da atividade
quando fica próximo da fonte ameaçadora.
“Trata-se, portanto, de um
detector de ameaça muito claro, que interage de forma dinâmica com a fonte. Se
o rato virar de costas, não é ativado, mas se olha para ela ou fica próximo, o
PMd vai ‘apitar’, e esse é um dos grandes achados do trabalho”, relata
Canteras.
Na sequência, os pesquisadores
inativaram o núcleo utilizando quimiogenética (designer receptors exclusively
activated by designer drug – Dreadd). “A gente injeta um vírus, esse vírus
expressa um receptor [a proteína hM4Di] que, na presença de uma droga
específica, vai ‘silenciar’, ou seja, impedir que essas células disparem. Fica
silenciado só no momento em que dou a droga. No momento em que eu tiro,
funciona normalmente”, detalha Canteras. “Quando faço essa inativação do
núcleo, o animal reduz drasticamente a resposta de defesa, deixa de evitar a
caixa ameaçadora, vai lá e entra, como se o ambiente fosse inócuo, como se nada
tivesse acontecido.”
Notou-se que a inativação do
PMd influencia tanto a expressão das respostas de defesa como o processo de
reconsolidação da memória de medo. Ou seja, após a inativação do PMd o animal
registra o ambiente como seguro e, no dia seguinte, navega pelo ambiente como
se não houvesse qualquer risco.
Na sequência foram investigados
os papéis funcionais dos principais alvos do PMd, a saber: a substância
cinzenta periaquedutal (PAG) e o tálamo medial anterior (AM) – dois sítios do
sistema nervoso, um no tronco e outro no tálamo.
“Há uma técnica pela qual posso
inativar especificamente a projeção que vai para o tronco ou a que vai para o
tálamo. Coloco um vírus no PMd que expressa uma proteína que é um canal de
cloro sensível à luz. Quando jogo luz nos campos terminais, essas terminações
silenciam, então posso manipular uma via específica de projeção.”
Os pesquisadores verificaram
que, quando é inativada a via da projeção para a PAG, o efeito é a diminuição
do comportamento de defesa no momento de inativação da via. Mas, no dia seguinte,
o rato responde bem ao medo, ou seja, não altera a memória.
“Vai influenciar principalmente
a expressão do comportamento, mas não vai influenciar na reconsolidação da
memória de medo”, detalha o pesquisador. “Por outro lado, quando é feita uma
inativação para o tálamo quase não tenho efeito imediato, mas tenho um grande
efeito na reconsolidação da memória de medo.” Assim, os dois eventos estão
sendo principalmente mediados por sítios diferentes de projeção do núcleo.
O artigo tem como primeiros
autores Juliette Viellard (ICB e Institut des Maladies
Neurodégénératives da
Universidade de Bordeaux, França) e Fernando Melleu (ICB), e como coautores Alicia Tamais, Alisson de Almeida, Carolina Zerbini, Juliane Ikebara, Karolina Domingues, Miguel de Lima, Simone Motta (todos do ICB) e Fernando A. Oliveira, do Laboratório de Neurobiologia Celular e Molecular do Centro de Matemática, Computação e Cognição da Universidade Federal
do ABC.
O grupo recebeu apoio da FAPESP
por meio de dez projetos (17/12881-2, 14/05432-9, 16/18667-0, 19/27245-0, 16/08640-7, 22/07530-4, 21/02864-9, 22/16318-9, 21/01642-2 e 18/25857-5).
O artigo A
subiculum-hypothalamic pathway functions in dynamic threat detection and memory
updating pode ser lido aqui: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0960982224006043.
Agência FAPESP
https://agencia.fapesp.br/grupo-mapeia-circuitos-cerebrais-que-sinalizam-inseguranca-imediata-e-criam-memoria-do-medo/52333
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