Solicitação é permitida por lei desde 2014, mas deve ser avaliada caso a caso
Desde que a Lei 13.058/2014 foi sancionada, pais e
mães que não possuem a guarda dos filhos e que pagam pensão alimentícia têm o direito
de solicitar a prestação de contas sobre os gastos efetuados pelo genitor(a)
que recebe a quantia mensalmente. Embora o número de ações nesse sentido seja
cada vez maior, as decisões variam bastante e dependem muito do caso
concreto.
Diferentes turmas do Superior Tribunal de Justiça
(STJ) têm decidido em sentidos opostos. A 4ª Turma do STJ, por exemplo, foi
favorável ao pedido num caso de 2021, quando o relator do recurso, Ministro
Luis Felipe Salomão, determinou que o genitor poderia sim verificar se as despesas
e gastos estavam sendo realizados para a manutenção e educação da prole,
evitando assim que ocorressem abusos e desvios de finalidade.
Já a 3ª Turma do STJ, no mesmo ano, decidiu que o
alimentante – aquele que paga a pensão - não possui interesse processual em
exigir contas da detentora da guarda do alimentando – aquele que recebe a
pensão. Relator, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva argumentou que o pedido
de prestação de contas deveria estar embasado em ampla instrução probatória,
negando o recurso. Em decisão mais recente, de 2023, a mesma 3ª Turma do STJ
interpretou a lei no mesmo sentido, de que a prestação só deveria ser
reconhecida em caso de mau uso comprovado dos valores pagos.
Aline Avelar, especialista em
Direito das Famílias e Sucessões, Planejamento Familiar, Patrimonial e
Sucessório do escritório Lara Martins Advogados, explica que a questão é sensível e complexa. Ela considera que a busca
pela transparência e garantia do melhor interesse da criança são fundamentais e
que, neste sentido, a ação pode ser um instrumento importante para garantir que
os recursos dispensados sejam utilizados da melhor forma. “O STJ tem entendido
que tal demanda pode ser aceita em situações específicas em que haja prejuízos
de que os recursos destinados ao bem-estar do filho não estejam sendo
devidamente empregados. É importante ressaltar que cada caso é único e deve ser
avaliado isoladamente, considerando o contexto familiar e as necessidades da
criança”.
Para ela, a prestação de contas não deve ser vista
como um mecanismo de fiscalização rigoroso, mas sim como uma forma de promoção
da responsabilidade financeira e do cuidado parental. Segundo a advogada, o STJ
tende a adotar uma postura equilibrada e ponderada ao lidar com essas questões,
buscando sempre o bem-estar e o desenvolvimento saudável da criança em primeiro
lugar.
A advogada Vanessa André Paiva, especialista em Direito de
Família e Sucessões e sócia do escritório Paiva & André Sociedade de
Advogados, considera que a prestação de contas faz parte do
dever de fiscalizar por aquele que não detém a guarda unilateral. Para ela,
controvérsia gira em torno dos valores que são pagos a título de alimentos e se
a prestação de contas seria realmente necessária para apurar sua devida
utilização.
“Na maioria das vezes, o valor pago a título de
pensão alimentícia não cobre sequer metade das despesas da criança, o que
dispensaria o ajuizamento de uma ação de prestação de contas”, avalia. “No
entanto, quando o valor a ser analisado é exorbitante, dispendioso, aí sim
estamos diante de uma propositura que tem por finalidade a proteção integral da
criança. Movimentar a máquina do judiciário apenas para apurar possível crédito
não é efetivo, uma vez que os alimentos são irrepetíveis e, portanto, não podem
ser devolvidos”, finaliza.
Fontes:
Aline Avelar - advogada do escritório Lara Martins Advogados, responsável pelo núcleo de Direito de Família e Sucessões. Especialista em Direito das Famílias e Sucessões, Planejamento Familiar, Patrimonial e Sucessório. Presidente da Comissão de Jurisprudência do IBDFAM-GO.
Vanessa André Paiva - advogada especialista em Direito de Família e Sucessões; pós-graduada e mestra em direito; professora de Direito de Família; autora de obras jurídicas e sócia administradora do escritório Paiva & André Sociedade de Advogados.
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