Processo
"rouba" etapas importantes da infância e traz consequências negativas
no desenvolvimento social e emocional; hábitos simples que colocam as crianças
como protagonistas devem ser incentivadosFreepik
Rotinas sobrecarregadas, agendas lotadas de
atividades, uso de roupas, acessórios e equipamentos eletrônicos inadequados
para a faixa etária, além da exposição excessiva a vocabulários e conteúdos
impróprios para a idade, são situações cada vez mais comuns na vida de
crianças. Elas muitas vezes são estimuladas pelos pais e pela sociedade a
adotarem hábitos e comportamentos que não são apropriados para a idade que
possuem. Esse fenômeno é conhecido como adultização infantil e traz
preocupação, pois implica em sérios riscos e pode acarretar enormes prejuízos
para o desenvolvimento da criança.
De acordo com especialistas, a antecipação de
experiências e responsabilidades próprias da vida adulta acaba afastando as
crianças de exercícios naturais e essenciais para o desenvolvimento de
processos cognitivos, habilidades motoras e linguísticas, além de comprometer
as relações afetivas da criança. Para a psicóloga do Colégio Positivo -
Londrina (PR), Renata Moraes Constante, o processo de adultização da infância
tira da criança um importante espaço, colocando-a no papel de "mini
adulto". Isso resulta em consequências negativas que podem afetar toda a
vida da criança, como transtornos depressivos e ansiedade. "Tudo isso
prejudica a socialização, estimula o materialismo e consumo excessivo, promove
a baixa autoestima, sentimentos de inadequação e até mesmo o amadurecimento
sexual precoce", alerta.
A infância é um período essencial na vida de um
indivíduo, pois é quando ele adquire concepções psicológicas e morais que o
acompanharão pelo resto da vida. Introduzir elementos do universo adulto nessa
fase, sem a maturidade emocional para compreender plenamente o que está
acontecendo, torna esse indivíduo vulnerável. Renata ressalta que a mídia tem
desempenhado um papel influenciador nesse processo. "O estímulo
às vezes ocorre de forma sutil e quase imperceptível, portanto, é fundamental
que os pais estejam atentos a essa questão", destaca a
psicóloga. Para ela, o papel da família é crucial nesse momento. "É preciso observar
com atenção o comportamento, o vocabulário, a forma como a criança se veste,
analisar se a quantidade de atividades na agenda da criança é apropriada para
sua idade e verificar se há uso excessivo de dispositivos eletrônicos e
isolamento social", detalha.
Renata também oferece algumas dicas para os pais.
"Procurem retomar hábitos e costumes que permitam à família aproveitar a
infância dos filhos de maneira saudável. Invistam em brinquedos adequados
para a idade, aqueles que são simples e permitem que a criança seja a
protagonista. Tentem diminuir o uso de telas e eletrônicos e incentivem o
convívio com outras crianças, frequentando espaços lúdicos, como parques e
praças. E, acima de tudo, dediquem tempo de qualidade em família, conversando e
orientando os filhos", sugere a psicóloga.
A coordenadora pedagógica da Educação Infantil do
Centro Pedagógico do Colégio Positivo, Hannyni Mesquita, observa que a
adultização ocorre quando se diminui o tempo dedicado ao brincar, ao faz de
conta, ao tédio e aos conflitos próprios da infância. "Não podemos
subestimar a importância do brincar e do exercício da imaginação na vida de uma
criança. A brincadeira é a ferramenta mais poderosa para que ela reinterprete o
mundo, crie enredos, vivencie um espaço seguro e se prepare para os desafios
que enfrentará na vida real, descobrindo e desenvolvendo-se em todas as áreas.
Essa é a linguagem da infância", explica Hannyni. A
coordenadora também faz um alerta sobre o uso excessivo de telas nessa fase da
vida. "É fundamental que os pais definam limites claros para o uso de
tecnologia. Isso não é fácil, mas é possível. O ideal é começar com pequenos
acordos e mudar a cultura da própria família. Os pais devem aproveitar e
dedicar tempo de qualidade para atividades em família que permitam uma conexão
mais profunda, incluindo tempo para ouvir as preocupações da criança",
completa.
Em um mundo tão acelerado, a pedagoga lança uma
reflexão: "Que pressa é essa que nos impulsiona a acelerar o processo de
amadurecimento das crianças?" Hannyni afirma que é preciso com
urgência repensar as prioridades e desacelerar. A humanidade avança de forma
notável nas áreas da tecnologia, ciência e saúde, a fim de prolongar a vida e a
velhice de maneiras inimagináveis. No entanto, em meio a essa busca incessante
por estender o tempo de vida, o valor intrínseco e inestimável da infância está
sendo negligenciado. "Estamos roubando de nossas crianças a fase mais
importante do desenvolvimento humano. A infância é o solo fértil onde as
sementes da imaginação, da solidariedade, da criatividade florescem; é um
período de descobertas e aprendizado que não pode ser estendido
artificialmente. Precisamos reservar tempo para nutrir e proteger essa
preciosidade, pois a verdadeira riqueza de uma sociedade reside na capacidade
de suas crianças explorarem e viverem plenamente essa fase única da vida",
completa.
Colégio Positivo
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