Pesquisa revela
que o autocuidado materno e a consciência de que o ideal de mãe perfeita não
existe ajudam o desenvolvimento das crianças
Quem nunca ouviu o ditado que diz que quando nasce
um filho, nasce a culpa? As pesquisas mostram que a culpa atinge as mães quase
que de forma universal. A culpa pode ser definida como uma emoção
desconfortável que surge quando percebemos que nosso comportamento causou
prejuízo a outra pessoa. A capacidade de se colocar no lugar do outro e sentir
empatia é um pré-requisito para a culpa. Por isso, nos relacionamentos mais
próximos a culpa está mais presente já que estamos mais atentos ao bem-estar do
outro. Embora a culpa seja desconfortável, ela cumpre uma função importante
para o funcionamento humano. Quando prejudicamos alguém e sentimos culpa, esse
desconforto nos motiva a reparar o dano e nos leva a escolher melhores
comportamentos da próxima vez, mais alinhados com as nossas expectativas e
valores.
Segundo Adriana Drulla, mestre em Psicologia
Positiva e autora do estudo Transmissão Intergeracional da Autocompaixão,
o problema da culpa materna é a forma como ela é prevalente e crônica. “Sabemos
que a culpa acontece para motivar uma maior coerência entre nossas ações,
expectativas e valores. Mas no caso da culpa materna, as expectativas são
inatingíveis e os valores incoerentes, logo é impossível se adequar. O
paradigma vigente da maternidade diz que a boa mãe é aquela que se doa
completamente em termos físicos, emocionais, psicológicos e intelectuais”. Ela
completa que a expectativa da mãe perfeita, o julgamento social a respeito da
maternidade alheia, o excesso de informações, conselhos e boas práticas
aprisionam as mulheres a padrões impossíveis que inevitavelmente geram culpa,
frustração, exaustão e raiva. “Pesquisas mostram que, cada vez mais, nos
sentimos piores enquanto mães. Temos sentido mais medo, estamos mais confusas,
e nos sentimos inferiores. Essa sensação de ineficácia afeta nosso bem-estar
físico, nossa saúde mental, e a nossa capacidade de sermos boas o suficiente no
nosso papel de mãe.”
Mães autocompassivas se sentem mais competentes
“Na minha pesquisa, feita nos Estados Unidos com
246 pares de mães e filhos, descobri que mães autocompassivas têm filhos mais
autocompassivos, e se sentem mais competentes no seu papel de mãe. A
autocompaixão envolve a capacidade de fornecer suporte emocional a si mesmo,
enfrentando desafios e adversidades com maior perspectiva e com a compreensão
de que as dificuldades são comuns a todas as pessoas. As mães autocompassivas
são mais propensas a se perdoarem quando cometem erros, em vez de vê-los como
uma indicação de incompetência ou inferioridade. Isso ajuda com que elas sigam
em frente, tenham menos medo de errar, e tenham maior facilidade para persistir
e tentar novos caminhos”, afirma Adriana. A autocompaixão significa olharmos
para as dificuldades com realismo e não com lentes de aumento. É sobre adotar
uma postura gentil com relação a si mesma, dando pra si o que você precisa em
um momento difícil, seja um banho demorado, seja pedir ajuda para alguém porque
você precisa relaxar.
Outra pesquisa feita na Holanda com 900 pares de
mães, pais e filhos, mediu vários comportamentos parentais importantes como a
qualidade da escuta, compaixão pelos filhos, a consciência dos pais sobre as emoções
dos filhos e como os pais julgavam a própria atuação nos seus papéis de pais.
“Destes aspectos, a aceitação dos pais e as mães sobre a própria atuação
enquanto pais foi o fator mais fortemente associado a menores níveis de
depressão e ansiedade nos filhos. Quer dizer, aceitar nossas imperfeições com
naturalidade e abrir mão das expectativas irrealistas, é importante para a
resiliência emocional dos nossos filhos”, defende a especialista.
Como lidar com a culpa materna
“O que acontece quando nos cuidamos é que além de
nos tornarmos mais emocionalmente saudáveis, nos tornamos menos reativas,
conseguimos nos conectar com a criança de uma forma mais profunda. Ao abrir mão
da expectativa de nos tornarmos mães perfeitas, conseguimos aceitar que nossos filhos
também têm defeitos. A criança que se sente aceita por quem ela é, que não acha
que precisa mudar para receber amor, desenvolve um autoconceito mais positivo e
maior autocompaixão”. O vínculo com os pais é um dos principais fatores que
suportam a resiliência emocional da criança, que é a capacidade da criança de
enfrentar desafios de forma construtiva. A resiliência emocional também é
facilitada pela forma como a criança interpreta e lida com os problemas. As
pesquisas mostram que as crianças que têm maior dificuldade para lidar com os
próprios erros, e que enxergam as limitações pessoais como sinal de que há algo
errado com elas, tendem a deprimir e desenvolver outros problemas emocionais
com maior frequência.
A autocompaixão é um dos grandes facilitadores da
resiliência emocional em situações de estresse na adolescência. De acordo com
Adriana Drulla, adolescentes mais autocompassivos deprimem menos, têm menos
ansiedade e melhor desempenho acadêmico. “As pesquisas mostram que a
autocompaixão pode ser aprendida, tanto por adultos quanto por crianças. A
maior lição da minha pesquisa é que quando as mães se cuidam e são mais gentis
consigo, os filhos também se beneficiam. Eles aprendem a serem autocompassivos
e têm um vínculo mais forte com essas mães. Logo, exercitando a autocompaixão e
cuidando de si você beneficia também as pessoas que você mais ama”, finaliza a
mestre em Psicologia Positiva.
Adriana
Drulla - Mestre em Psicologia Positiva, pela Universidade da
Pennsylvania, é especialista em Autocompaixão e Parentalidade
Consciente.
https://www.instagram.com/adrianadrulla/?hl=pt-br
Podcast Crescer Humano: https://spoti.fi/3lzJghY
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