Nós mulheres não somos multitarefas, somos sobrecarregadas. O excesso de atividades e a ideia de "temos que" fazem com que nossa saúde mental fique abalada. E eu sempre digo: somos perfeitamente imperfeitas.
O mito é que somos
multitarefas. É errado falarmos que somos multitarefas, existe algo por trás
disso que é o essencialismo biológico, que significa atribuirmos vantagem
biológica em função do sexo. Um exemplo é falar que as mulheres dão conta de
várias atividades ao mesmo tempo: os filhos, a casa, o trabalho e ainda dar
apoio para quem precisa dela.
Atribuímos vantagens
competitivas em função do marcador de sexo. Se formos olhar as consequências
para as mulheres, há, além da saúde mental, violência psicológica. Quem nunca
ouviu que a culpa é sua quando alguém te paquera usando saia à noite? E aqui o
essencialismo é que os homens têm impulsos sexuais incontroláveis e nós
mulheres precisamos nos conter para não ''atiçá-los''.
Quem nunca ouviu
também o estereótipo de que mulher não é boa com números, com lógica, com
exatas. Tudo isso envolve machismo e essencialismo biológico. Isso faz com que
as mulheres se afastem de carreiras na área. Existem vários estudos neurocientistas que defendem que é impossível você fazer duas
atividades que demandam intelectualidade com a mesma qualidade e ao mesmo
tempo. É impossível ler este artigo enquanto conversa com alguém, por exemplo,
com atenção. A gente faz uma atividade e depois executa a outra. Você pode ter
se acostumado a se maquiar dirigindo, por exemplo, mas você não faz nenhuma das
duas com 100% de foco.
É muito comum as
empresas levantarem bandeiras que querem mulheres em cargo de liderança porque
elas são mais produtivas e conseguem fazer várias atividades ao mesmo tempo.
Precisamos questionar isso porque historicamente o grande dilema é que nós
assumimos esse papel de multi tarefeira: eu tenho que cuidar da minha casa, eu
tenho que performar bem no trabalho, eu tenho que cuidar do meu filho, eu tenho
que cuidar dos meus pais quando envelhecerem. Por isso, assumimos uma
sobrecarga mental absurda e precisamos começar a questionar esse tipo de fala.
Homens e mulheres não são multitarefas. Se endossamos esse discurso, vamos
assumir esse papel e obviamente, não daremos conta de tudo.
É fato que
desenvolvemos mais jogo de cintura, mas porque não foi nos dada outra opção
senão a responsabilidade integral pelo cuidar.
Outra consequência
negativa é o excesso de controle: somente eu cuido da minha casa, dos meus
filhos, somente eu posso performar no ambiente de trabalho e assim, eu não
deixo outros protagonizarem. Os demais são colocados como coadjuvantes.
Vestimos nossa capa de mulher maravilha e nos cobramos o dia inteiro para dar
conta de tudo.
Isso também tem a ver
com autorresponsabilidade. Retirar o protagonismo das pessoas é colocá-las como
coadjuvantes. Se estamos em um contexto de liderança, minha equipe se torna
medíocre porque sou sempre eu que tenho as ideias brilhantes e não deixo as
pessoas evoluírem. A mesma coisa acontece em casa e nas relações afetivas: se
você acredita que somente você sabe lavar a louça, cozinhar, cuidar da criança
e fazer a lista do supermercado, você está transformando a pessoa com quem se
relaciona afetivamente em coadjuvante.
A cada quatro mães,
uma não volta mais ao mercado de trabalho porque elas acreditam que não vão dar
conta de cuidar da casa, do filho, de performar no ambiente do trabalho. Da
mesma forma, a Diretora de Operações do Facebook, Sheryl Sandberg, em seu livro
Faça Acontecer traz um exemplo que, quando ela estava tentando contratar mais
mulheres, as que pretendiam engravidar, um ano antes elas já estagnavam as suas
carreiras acreditando que não dariam conta de trabalhar e de cuidar da casa e
dos filhos.
Isso tem consequências
drásticas na nossa saúde mental e no nosso reconhecimento como mulher e
profissional. Vamos quebrar esses paradigmas e refletir sobre a nossa potência!
Nem sempre vamos dar conta de tudo e está tudo bem!
Precisamos
ressignificar o mito do equilíbrio: a vida profissional, com a casa, com a vida
amorosa. Na prática, o que acontece são escolhas. Precisamos de
autorresponsabilidade para entender o que é prioridade para nós e assumir que
talvez em determinado momento eu queira me dedicar mais ao meu filho em um
momento, talvez o trabalho eu foque mais em outro, é uma escolha consciente.
Acreditamos na compensação. Assim como, em uma fase priorizamos o filho, na
próxima podemos priorizar o trabalho.
E precisamos assumir
essa responsabilidade de que em um contexto de equipe, quando eu dou a solução
sempre e estou sempre disponível, eu estou tornando as pessoas medíocres.
Quando você está disponível para o mundo, você não está disponível para você
porque você não se prioriza e isso impacta nosso trabalho, nossa vida e
principalmente nossa saúde mental.
E isso não é simples
de ser colocado em prática. Eu, por exemplo, acho que minha casa poderia estar
mais arrumada, com certeza estou com louça na pia neste exato momento. Mas
posso deixar essa responsabilidade para outra pessoa. Isso parte de entendermos
que a pessoa não vai fazer do jeito que eu faria, mas ela vai fazer. Isso é
inovação, diversidade e respeito. E, por isso, precisamos quebrar a fala de que
as mulheres são multitarefas, isso nos prejudica nas nossas relações pessoais e
profissionais. E se eu endosso essa prática, o discurso se propaga de uma
maneira completamente errada e inadequada.
Você não vai crescer
se quiser controlar tudo. Queremos saber se as pessoas vão entregar tudo nos
mínimos detalhes com os quais nos importamos e isso não vai acontecer. E você
terá que aprender com essa pessoa, ela tem um estilo diferente do seu e
precisamos celebrar essa diversidade para ter resultados melhores.
E a mulher sempre quer
melhorar, evoluir. Eu acredito que buscamos mais a perfeição porque existem os
estereótipos e uma sociedade que lucra com a nossa insegurança. Uma vez que eu
tenho consciência de que não há pessoas multitarefas, os compromissos que eu
faço comigo mesma para mudar isso são essenciais. A pessoa vai fazer do jeito
dela e do estilo dela e está tudo bem.
Mulher, pode tirar a
capa e dizer aos outros e a si mesma: "não somos multitarefas".
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