A vigilante mídia brasileira se espanta
mais com a adesão de uma quarta parte da população às posições conservadoras do
candidato Bolsonaro do que com a adesão de um terço dessa mesma população às
condutas moralmente corrosivas e economicamente destrutivas de um criminoso
condenado, réu em meia dúzia de outros processos cujo denominador comum é a
promíscua relação pessoal com grandes empresas que prosperam à sombra do
Estado.
Qual o motivo do estresse em que se
envolveu o circo político-partidário nacional nas últimas semanas? Tratava-se,
visivelmente, de barrar a presença de um intruso, um outsider, uma zebra que
entrou no picadeiro eleitoral com ponderável estoque de intenções de voto.
É fácil compreender o desconforto que
isso causa. As forças políticas tradicionais, que degustaram os canapés do
poder ao longo dos últimos trinta anos não sabem como operar com intrusos.
Habituaram-se a atuar como corretoras de votos parlamentares e operadoras de
verbas públicas legítima e ilegitimamente coletadas. Todo intruso é risco e
todo risco tem preço, sabem os aprendizes do mercado de capitais.
É verdade o que intuem. Bolsonaro é um
intruso e, como tal, fator de risco. No entanto, esses mesmos partidos que
somam letrinhas para encorpar a sopa, gastaram e continuam gastando seu tempo –
e em muitos casos, longo tempo – cuidando de cargos e negócios. Em vez de
ouvirem as vozes mais sensatas da opinião pública, de abrirem quadros e mentes
para a renovação exigida pela sociedade, em vez de compreenderem seus anseios,
fecharam-se no entorno de elites decadentes e, em muitos casos, totalmente
desmoralizadas. Deram as costas para os interesses nacionais e para os clamores
por responsabilidade e equilíbrio fiscal. Lançaram e deixaram que fossem
lançados pela janela dos interesses mais escusos valores monetários duramente
produzidos pelo trabalho dos cidadãos. Jogaram e continuam jogando o país no
caos. Não ouviram os liberais e se afastaram dos conservadores que, juntos,
formam folgada maioria do eleitorado.
Bolsonaro representa um risco? Sim, há
risco em toda eleição presidencial. Viver sob esse modelo político é como rodar
em estrada esburacada – anda-se devagar e aos solavancos. Pneus estouram. Há
candidatos de risco e candidatos sabidamente catastróficos. Quem confia no centrão
ou no Ciro “tarja preta” Gomes, não deve atravessar a rua desacompanhado.
Em
política, muito do que se é resulta definido pelo que se combate. Reitero ser
ainda cedo para opções eleitorais definitivas. Na minha planilha, chegou a hora
de marcar quem combate quem e o quê. Isso tem seu lado divertido e seu lado
desolador. É divertido observar o descaramento das negociações que distribuem
terrenos na lua do poder. É desolador o confinamento da maioria do eleitorado.
Percival Puggina -
membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor
e titular do site www.puggina.org,
colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A tomada do
Brasil, integrante do grupo Pensar+.
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