Nutricionista e autora do livro O Peso das
Dietas acredita que dietas radicais são prejudiciais e fazem as crianças
engordarem mais
Para
Sophie Deram, nutricionista com doutorado no departamento de endocrinologia
pela Faculdade de Medicina da USP e pesquisadora na área de obesidade infantil,
a maioria dos programas de “combate” à obesidade infantil incentiva as
crianças a “fechar a boca e malhar”, ou seja, é a responsabilidade da criança
reduzir o que ela come e aumentar exercício físico com a ajuda dos adultos ao
seu redor.
A
noção de “combate” pressupõe que a criança obesa de alguma maneira tem uma
responsabilidade na situação na qual se encontra. Existe uma estigmatização da
criança obesa como sendo preguiçosa e sem nenhuma força de vontade ou
disciplina.
Isso
prejudica muito essas crianças que, na realidade, estão presas num corpo que se
adaptou ao meio ambiente no qual vivem, sem saber o que fazer para mudar a
situação. Isso pode até levá-las a sofrer bullying.
Fechar
a boca e malhar não funciona
É
claro que um mínimo de exercício físico é saudável, mas fazer dieta restritiva
(fechar a boca) desregula o cérebro, aumenta o apetite, a obsessão por comer e o
comer emocional. Também reduz o metabolismo. O cérebro, percebendo uma falta de
comida, começa a “economizar”. Esses efeitos são ainda mais fortes em crianças
que estão em desenvolvimento. Em vez de ajudar a criança com restrições, se
estressa o cérebro dela, levando à tristeza, depressão ou mesmo comer
escondido, uma das causas da obesidade infantil.
O
comer escondido não é uma escolha dela, dá muita vergonha e isso é o começo de
uma vida de compulsão e relação estragada com a comida, algo difícil de reverter.
Então, basicamente, fazendo dieta a criança entra no caminho de engordar e/ou
de desenvolver um transtorno alimentar.
Estudos
mostram que adolescentes que fazem dietas aumentam em duas ou três vezes o
risco de se tornar obesas quando comparados a outros que não fizeram
restrições. Um estudo mostrou que dietas severas (diminuindo calorias ou
pulando refeições) aumentam em 18 vezes o risco de desenvolver transtornos
alimentares em adolescentes. Na população geral, 95% dos que fazem dieta voltam
a engordar em um prazo de 2 anos, muitas vezes para um peso maior ainda. Dos 5%
que não engordam, mais do que a metade (3%) têm um transtorno alimentar. Ou
seja, é normal fracassar na dieta!
A
obesidade infantil é evitável
Apenas
alguns casos são geneticamente inevitáveis. A Organização Mundial da Saúde
(OMS) é clara sobre isso: a obesidade é evitável, mas é difícil de tratar.
Quando se estuda a genética da obesidade se vê que há mais do que 500 fatores
genéticos associados à obesidade. Quem puxa o gatilho é o estilo de vida e
também o estresse psicológico, medicamentos, desregulamento de hormônios, falta
de sono e muito mais. Não é só comer demais e ser preguiçoso!
Tentativas
de tratamento com dietas, remédios e cirurgia, não têm dado resultados
satisfatórios e têm muitos efeitos secundários. O corpo volta a engordar na
maioria das vezes. Por que? Porque a obesidade é uma adaptação do corpo ao seu
meio ambiente e quanto mais se agride o corpo, mais ele reage engordando!
Hoje
está cada vez mais claro e comprovado que se deve enfatizar uma abordagem
chamada “mindful eating” ou alimentação consciente. É uma forma compassiva e
holística para se conseguir uma alimentação saudável. É preciso respeitar a
fome e prestar atenção à saciedade, conexões emocionais com a comida e os
relacionamentos envolvidos em comer.
Sobre a autora:
Sophie
Deram é nutricionista francesa e brasileira naturalizada, com doutorado em pela
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) no departamento da
Endocrinologia. Formou-se originalmente engenheira agrônoma na França e então
estudou nutrição, primeiro na França e depois no Brasil. Concentrou suas
pesquisas em obesidade infantil, nutrigenômica, transtornos alimentares e
neurociência do comportamento alimentar. É também pesquisadora no Ambulatório
do Programa de Transtornos Alimentares (AMBULIM) do Hospital das Clínicas da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. É coordenadora do projeto
de genética e do banco de DNA dos pacientes com transtorno alimentar no
AMBULIM. Como especialista em comportamento alimentar, estilo de vida saudável
e perda de peso, Sophie é ativista contra as dietas restritivas e inspira
incontáveis indivíduos, no consultório e nas mídias sociais, a viver uma vida
mais feliz e a transformar sua relação com os alimentos, mudando seu mundo
familiar, e fazendo as pazes com seu corpo e os alimentos. Ela acredita no
prazer de comer e no poder dos alimentos verdadeiros para resgatar a saúde e
chegar ao peso saudável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário