Apesar de, durante muitos anos, ter sido
considerada um recurso natural infinito, há algumas décadas, o mundo
compreendeu que o mau uso da água pode, sim, ocasionar a sua escassez. Por essa
razão, inclusive, a Organização das Nações Unidas instituiu o dia 22 de
março como o Dia Mundial da Água. O intuito foi alertar a população sobre a
necessidade de refletir sobre a importância da preservação da água para a
sobrevivência dos ecossistemas e sobre as medidas práticas a serem adotadas.
No campo jurídico, aproveitamos esta oportunidade
para debater o que houve de progresso nos últimos anos em termos de políticas
públicas de gestão da água, em especial após o Brasil sediar, pela primeira
vez, o Fórum Mundial da Água no ano passado. Entre os diversos produtos do
referido Fórum, merece destaque o compromisso do governo federal de adotar
políticas e planos nacionais de gestão integrada de recursos hídricos a fim de
garantir o direito constitucional de acesso à água.
No entanto, se fizermos um balanço deste último ano,
nota-se que, embora haja uma quantidade significativa de projetos de lei sobre
a correta gestão da água, pouco se evoluiu efetivamente em termos práticos - em
especial no que se refere ao desenvolvimento de estratégias potenciais como
educação, transferência de tecnologia, incentivos econômicos, mercados, dentre
outros.
Embora o governo anterior tenha iniciado o processo
de revisão e atualização do Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab) e de
seu marco legal por meio da Medida Provisória n. 868/2018, os projetos de lei
que preveem incentivos econômicos e subsídios para adoção de tecnologias mais
sustentáveis no que tange à gestão da água não saíram do papel. Projetos de Lei
como o PL n. 495/2017, que regulamenta a criação de um “mercado de água”, e os
PLs n. 5733/2009; 182/2015; 377/2015; e outros, que regulamentam incentivos à
adoção de práticas mais sustentáveis, não evoluíram no Legislativo.
Ora, não dá para discutir uma gestão eficiente da
água se não pensarmos na aplicação de políticas públicas integradas,
articuladas e intersetoriais. Vide, por exemplo, o Projeto Oásis, desenvolvido
há 12 anos pela Fundação Grupo Boticário. Trata-se de um instrumento de
política pública econômica, o Pagamento por Serviços Ambientais, que promove a
valorização dos ambientes naturais por meio de mecanismos de incentivo
financeiro a proprietários que se comprometam com a conservação das áreas
naturais e a adoção de práticas conservacionistas de uso do solo.
Outro exemplo é o adotado em Tóquio, que não apenas
investiu em tecnologias limpas, como inseriu a temática de educação ambiental
nas escolas do município desde a década de 1970, criando, inclusive, programas
de capacitação técnica. Nota-se, portanto, que, apesar das discussões terem
avançado, a gestão eficiente da água ainda depende de políticas públicas
regionais e setoriais de amplo descortino político e que não apenas punam, mas
que também incentivem a adoção de técnicas de preservação ambiental. Sem
incentivos econômicos e educação ambiental, não há como se discutir melhorias
na gestão eficiente da água no Brasil.
Marcelo Buzaglo
Dantas - advogado, pós-doutor em Direito Ambiental, Transnacionalidade e
Sustentabilidade pela UNIVALI/SC, professor visitante da Universidad de
Alicante (ES) e da Delaware Law School (EUA) e membro da Rede de Especialistas
em Conservação da Natureza