Pesquisadora Tal Luzzatto, da Universidade
de Haifa, se dedica a estudar o tema e aponta várias aplicações em andamento
para doenças como o câncer, soluções antienvelhecimento e alimentos funcionais.
Ela estará no Brasil entre os dias 25 a 27 de
agosto para falar sobre o assunto
O oceano é um ambiente que, para muitos, é visto como
fonte de alimentos. Para outros, como rota comercial que movimenta grandes
navios cargueiros que levam produtos de um continente para o outro. Já tem
gente que valoriza suas águas infinitas como um espaço de contemplação. Mas uma
coisa é fato: ainda há grandes mistérios que ainda são pouco acessados, como
uma biodiversidade infinita em suas profundezas. No entanto, nos últimos anos a
ciência tem avançado e mostrado que esse ambiente pode oferecer pode ir muito
além: sob as ondas, há um grande “laboratório” natural ainda pouco explorado,
com potencial para revolucionar a medicina dos dias atuais.
É esse universo que a pesquisadora Tal Luzzatto, da Universidade
de Haifa, em Israel, tem investigado com lupa, envolvendo a utilização de
pequenas moléculas produzidas por macroalgas, microalgas e bactérias marinhas
em aplicações que envolvem tratamentos contra doenças como o câncer, soluções
cosméticas para o envelhecimento da pele e o desenvolvimento de novos medicamentos
de ponta.
“Meu laboratório está explorando o potencial das algas como
possíveis agentes anticâncer, suas propriedades para os cuidados da pele, além
do desenvolvimento de antimicrobianos e antibióticos, e pigmentos naturais e
compostos gelificantes que podem ser usados pelas indústrias alimentícias e
cosmética”, explica Tal com mais detalhes.
Nesse sentido, países como o Brasil se tornam um importante alvo
de interesse da pesquisadora, diante da enorme extensão total de seus oceanos -
que chega próximo de 4,5 milhões de km² - além da existência de mais de 800 espécies de
algas conhecidas nos mares brasileiros.
“A costa brasileira é um verdadeiro tesouro.
Reúne condições ideais para o desenvolvimento de uma nova frente de pesquisa em
biotecnologia marinha e em estudos metabolômicos que buscam entender não apenas
a presença de compostos, mas o contexto biológico e ecológico em que são
produzidos. Isso nos ajuda a prever a função dessas moléculas e a entender
melhor como utilizá-las para as finalidades terapêuticas”, ressalta a
pesquisadora.
Isso expande os horizontes da medicina, que historicamente teve sua trajetória escrita com base em plantas terrestres. “Essas espécies são amplamente utilizadas na medicina tradicional, mas o mar começou a ser explorado para fins terapêuticos apenas nos anos 1970. Ainda estamos no início dessa era”, conta Tal.
Das águas para as prateleiras?
Para transformar essas descobertas em ativos reais,
o caminho, de acordo com Luzzatto, depende do objetivo a ser alcançado.
“Produtos farmacêuticos exigem anos de pesquisa, inúmeros testes de eficácia,
segurança e a conformidade com uma regulamentação rigorosa. Já cosméticos,
suplementos ou alimentos funcionais podem chegar ao mercado com mais rapidez”.
Um dos maiores trunfos da pesquisa com algas
marinhas é que esse trabalho não envolve, necessariamente, a exploração
predatória dos oceanos. “Ao identificar uma molécula ativa, ela pode ser
sintetizada quimicamente em laboratório ou integrar sistemas de cultivo
controlado para produção em larga escala. A descoberta de produtos naturais não
precisa impactar o meio ambiente”, enfatiza Luzzatto.
Para a pesquisadora, o mar pode oferecer soluções
para desafios médicos cada vez mais urgentes, como, por exemplo, a resistência
bacteriana. “Sempre há necessidade de ter novos antibióticos disponíveis, pois
os microrganismos desenvolvem resistência aos medicamentos existentes e
precisamos encontrar alternativas que funcionem. No entanto, outras soluções
para diversas doenças, fatores nutricionais e de bem-estar podem ser
descobertas no mar, que ainda é relativamente pouco explorado”.
O que chama a atenção dos especialistas sobre o
potencial promissor das algas é sua diversidade química. E a ideia de que o
futuro da medicina pode estar nas águas salgadas já começa a dar seus primeiros
sinais. Alguns compostos de algas marinhas e cianobactérias (algas
verde-azuladas) estão em fases avançadas de pesquisa ou aprovação para serem
aplicadas em medicamentos contra o câncer, depressão, analgésicos, entre
outros. É o caso da salinosporamida A, substância produzida por bactérias
marinhas que apresentou ação potente contra o câncer colorretal - segundo tipo
que mais mata no mundo, de acordo com dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia
Oncológica (SBCO).
Espécies
de algas marrons, por exemplo, produzem substâncias como a fucoxantina, que já
demonstrou ação potente contra células cancerígenas em testes laboratoriais.
Outros compostos, como fucoidanas e laminarinas, têm propriedades
anti-inflamatórias, antivirais e imunomoduladoras. Essas substâncias são
capazes de inibir o crescimento de tumores, induzir a morte celular programada
e até potencializar os efeitos quimioterápicos.
Para Tal, o Brasil tem tudo para se destacar
nessa agenda, desde que haja investimentos em pesquisa, infraestrutura e
políticas públicas que consigam unir inovação e conservação. “Com a
biodiversidade como aliada e o conhecimento, o oceano pode deixar de ser apenas
um território azul no mapa e se tornar uma fonte de cura para os desafios da
saúde do século XXI”, conclui.
Dra. Tal Luzzatto Knaan - chefe do laboratório de
Metabolômica Funcional da Universidade de Haifa. Doutora em Bioquímica pela
Universidade Hebraica de Jerusalém, fez pós-doutorado no laboratório do Prof.
Pieter C. Dorrestein na UCSD, onde desenvolveu métodos metabolômicos para
estudar a comunicação química microbiana e explorar a química marinha em busca
de novos medicamentos. Estudou as interações químicas do plictoplanton em seu
laboratório combina abordagens inovadoras e multidisciplinares para explorar o
papel biológico, a regulação, a diversidade e a distribuição de produtos
naturais em micróbios e algas, além de suas potenciais aplicações
biotecnológicas, cosméticas e medicinais. Além do destaque em sua área
científica, Tal participa do programa global “Homeward Bound STEMM (Programa de
mulheres na Ciência, Tecnologia, Engenharia, Matemática e Medicina) para
liderar com propósito e impacto.
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