Dispositivos sem eficácia comprovada, utilizados indiscriminadamente para fins estéticos, têm potencial para aumentar doenças em mulheres, segundo a SBM
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)
determina medidas mais rígidas sobre implantes hormonais manipulados. A
resolução permite a comercialização de opções medicamentosas regulamentadas,
mas mantém a proibição, anunciada em outubro deste ano, dos chamados “chips da
beleza”, pellets subcutâneos à base de hormônios, sem comprovação de
eficácia e segurança, utilizados para fins estéticos, emagrecimento e aumento
do desempenho esportivo. Juntamente com 34 entidades médicas, a Sociedade
Brasileira de Mastologia (SBM) vem mobilizando esforços para a proibição desses
produtos. “A medicina tem uma grande preocupação em se basear por estudos
científicos para prescrever tratamentos corretos e adequados”, afirma a
mastologista Rosemar Rahal, membro da diretoria da SBM. “O uso indevido desses
implantes hormonais sem qualquer testagem de eficácia e segurança coloca em
risco a saúde da população.”
Como via para administração de medicamentos
aprovados pela Anvisa, os chips ou pellets vêm sendo utilizados, por
exemplo, como anticoncepcional e em tratamentos de hipogonadismo. Implantados
sob a pele, a partir de prescrição médica, esses pequenos tubos liberam, lentamente,
hormônios de que o organismo necessita em situações específicas.
A recomendação indiscriminada de implantes
hormonais manipulados em farmácias veio acompanhada de ampla visibilidade em
redes sociais, com a promessa de ganho de massa muscular, perda de peso e até
melhora do humor. No entanto, a SBM, em conjunto com 34 entidades médicas
brasileiras, apontou os riscos da aplicação dessas substâncias com fins
estéticos, que não têm qualquer comprovação de eficácia e benefício para a
saúde.
A mastologista Rosemar Rahal, da SBM, observa
vários pontos importantes na resolução da Agência Nacional de Vigilância
Sanitária para a regulamentação do uso dos implantes hormonais. “A primeira
consideração é que a Anvisa reconhece que o implante hormonal pode trazer
riscos para a população”, afirma. A especialista pontua que as determinações
reforçam as normas do CFM (Conselho Federal de Medicina), que proíbem a
utilização dessas substâncias para fins estéticos e de ganho de força muscular.
“É preciso considerar, ainda, que a via de administração de hormônio, na forma
de implante, não teve eficácia e segurança certificadas pela Anvisa.”
Na resolução da Agência Nacional de Vigilância
Sanitária, a médica destaca a exigência do CID (Código Internacional de
Doença), “que aumenta e facilita a rastreabilidade daquele profissional que
está prescrevendo o implante para um grande número de pessoas, utilizando o
mesmo código”, e do Termo de Responsabilidade/Esclarecimento em três vias,
obrigatoriamente preenchido e assinado pelo médico, pelo paciente e pela
farmácia. A especialista ressalta que são permitidos somente Insumos
Farmacêuticos Ativos (IFA) que já tiveram eficácia e segurança avaliadas pela
Anvisa. As penalidades para quem infringir as determinações, na opinião de Rosemar,
são bem claras no documento.
Além de transmissão de dados via SNGPC (Sistema
Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados), para ampliar o controle da
cadeia de produção e prescrição dos implantes hormonais, a mastologista
considera a importância da notificação compulsória de eventos adversos, como
monitoramento contínuo, previstos na resolução da Anvisa.
Na visão da especialista, a resolução tem outro
ponto fundamental que merece ser destacado. “A partir de agora, temos a
oportunidade construir um Painel Técnico, envolvendo entidades de saúde
representativas e demais agentes, para ampliar discussões e ações sobre o
tema”, reforça.
A mastologista da SBM expressa preocupação com o
uso indiscriminado de implantes hormonais sem qualquer investigação ou
comprovação científica, predominantemente por mulheres mais jovens, ressaltando
que o número de casos de mama é crescente no Brasil. “Em 2012, registramos
52.680 casos. Chegamos a 2024 com 73.610 diagnósticos da doença.”
A atenção da especialista ao aumento de número de
casos se justifica. “O câncer de mama é uma doença hormônio-dependente”,
destaca. Em outras palavras, o tumor cancerígeno se alimenta de hormônio para
se desenvolver no organismo.
Com base em estatísticas do SUS (Sistema Único de
Saúde) e do Observatório de Oncologia, plataforma dinâmica de monitoramento de
dados abertos e compartilhamento de informações relevantes da área de oncologia
do Brasil, a SBM indica que mulheres dos 40 aos 50 anos de idade respondem hoje
por 30% dos casos de câncer de mama no País. “Estamos diante de uma realidade
preocupante, que aponta o ‘rejuvenescimento’ da doença”, afirma a especialista.
De acordo com o Panorama do Câncer de Mama, painel
interativo aberto a médicos, gestores e sociedade civil que reúne informações
sobre o SUS, entre 2015 e 2022 mulheres de 40 a 49 anos tiveram diagnóstico
tardio em 39,6% dos casos. A faixa etária considerada de risco (entre 50 e 69
anos) responde por 35,3%. “Estes dados também vêm corroborar para a necessidade
de uma mudança de paradigma. Atualmente, o Ministério da Saúde preconiza 50
anos a idade mínima para início do rastreamento do câncer de mama, mas é
preciso considerar a possibilidade de realizá-lo a partir dos 40 anos”,
destaca.
Sobre medicamentos e tratamentos potencialmente
perigosos para a saúde, a exemplo do chamado “chip da beleza”, Rosemar Rahal
reforça que as associações médicas brasileiras devem, necessariamente, ser
envolvidas em discussões que tramitam nas várias esferas de decisão no País.
“Nosso objetivo é salvar vidas e evitar que as pessoas tenham problemas graves
de saúde com tratamentos que não têm qualquer evidência científica”, conclui a
mastologista da SBM.
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