Psicóloga da equipe Livre Maternagem, Camila Barros, e diretora-presidente do Instituto Opy, Heloisa Oliveira, abordam a importância da discussão sobre prevenção, diagnóstico e o tratamento da depressão pós-parto
Dados recentes da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) estimam que 25% das mães de recém-nascidos
no Brasil são diagnosticadas com depressão pós-parto. O alto número de
puérperas identificadas com a doença acendeu um alerta sobre a necessidade de
se discutir sobre a saúde mental maternal, especialmente durante o puerpério.
Considerado pela medicina obstétrica como o período que vai do momento logo
após o parto até 40 dias que se seguem, o puerpério é o tempo em que,
fisiologicamente, a mulher retoma seu estado mais próximo do anterior ao da
gestação.
Para Camila
Barros, psicóloga especializada em saúde mental materna e que faz parte da
equipe Livre Maternagem, “do ponto de vista psíquico, o
puerpério está relacionado ao tempo necessário para que a fusão primária
mãe-bebê reduza significativamente sua intensidade e a mulher se sinta
reequilibrada em seus diferentes papéis sociais – mulher, mãe, profissional,
companheira, etc”.
A nova configuração hormonal somada a um período de
vulnerabilidade da mulher contribui para o aparecimento da doença. “Nesse
período, a mulher é submetida a transformações radicais em seu estilo de vida e
precisa tomar uma série de decisões que dizem respeito não apenas a ela. Também
é preciso lidar com pressões sociais e ainda elaborar psiquicamente uma nova
vida que dependerá absolutamente dela e a quem ela deve um compromisso eterno”,
explica Camila.
Para a
diretora-presidente do Instituto Opy, Heloisa Oliveira, a prevalência da depressão pós-parto no
Brasil é bem mais elevada do que a estimada pela Organização Mundial de Saúde
(OMS) para países de baixa renda. “Uma pesquisa da Fiocruz mostrou que as mães
que mais apresentaram sintomas de depressão pós-parto, de acordo com o modelo
final da análise, não tinham planejado a gravidez, eram de cor parda, tinham
baixa condição socioeconômica, apresentavam antecedentes de transtorno mental e
praticavam hábitos não saudáveis, como o uso excessivo de álcool. A grande prevalência
dessa condição no Brasil é um alerta de que é preciso se ter uma política
específica para a prevenção, o diagnóstico e o tratamento da depressão
pós-parto”, relata.
Em tramitação na Câmara dos Deputados
está o Projeto de Lei Nº 1.704, de 2019 que Institui a Política Nacional de
Diagnóstico e Tratamento da Depressão Pós-Parto e seu substitutivo. “É evidente e necessária a
aprovação dessa proposta. É um passo importante e dá amparo legal para que o
executivo regulamente a política no Sistema Único de Saúde e na relação com as
operadoras privadas de saúde”, defende Heloisa.
Segundo o Centro de Pesquisa
em Saúde Materna e Infantil da City University, em Londres, o suicídio é
a principal causa de morte materna até o 1º ano após o parto, no mundo. “Mais
de 90% dos suicídios poderiam ser evitados com diagnóstico e tratamento
adequados”, salienta Camila. Falar sobre saúde mental ainda é um
tabu na sociedade, especialmente quando são as mães que estão adoecidas
mentalmente. “Muitas mulheres não falam sobre seus sofrimentos, não buscam
ajuda e são invisibilizadas nessa dor, seja na normalização desse sofrimento,
seja por medo. A Saúde Mental Materna deveria ser pauta nos Sistemas de Saúde
desde a educação sexual passando pela tentativa de engravidar, a gestação em si
e o atendimento de mulheres até o 2º ano após o parto’, afirma a psicóloga.
Alguns sintomas são sinais de alerta para
buscar ajuda especializada: perda de interesse em assuntos relacionados ao bebê,
diminuição dos autocuidados no pré-natal, vergonha da gestação, preocupação
excessiva com aborto, maior isolamento social, entre outros. “É importante
dizer que a gestação e o puerpério são momentos que normalmente a mulher
apresenta sinais de vulnerabilidade emocional e, por isso, é tão comum as pessoas
normalizarem sentimentos vistos como mais negativos. Por isso é crucial que
toda e qualquer reação que seja intensa demais ou que dure tempo demais e/ou
tire a mulher de seu funcionamento habitual seja olhado com cuidado”, aconselha
Camila.
Para apoiar mulheres que estão em processo de redescoberta
pós-maternidade, a psicóloga criou uma cartilha, disponível gratuitamente no
site https://www.livrematernagem.com.br/).
“A Organização Mundial de Saúde (OMS) trabalha com um
conceito de saúde que é bem mais abrangente que a simples ausência de doença:
Saúde é um completo estado de bem-estar físico, mental e social e, por isso é
importante cuidar de todas essas dimensões da saúde. Nesse contexto, a promoção
da saúde mental é essencial para que o indivíduo tenha a capacidade necessária
de se manter em equilíbrio e assim viver de forma saudável”, conclui Heloisa.
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