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De peça apertada - que representava verdadeira tortura às mulheres, a símbolo de revolução - sendo queimada em lixeiras, a lingerie percorreu um longo caminho nos últimos séculos.
Muito além de acompanhar o avanço da moda, as
roupas íntimas se atualizaram junto com as mudanças sociais, dialogando e
atendendo às diferentes necessidades do seu público e o que ditava cada
época.
Aos poucos, o conforto foi tomando espaço e a
tecnologia permitiu a criação de diferentes materiais e tecidos que melhor se
adaptavam à pele. Mas antes disso, o conjunto de lingerie era o
grande responsável por moldar dolorosamente o corpo feminino, na tentativa de
atingir padrões irreais.
Por outro lado, foi também a criação do sutiã com
suas alças presas aos ombros que devolveu à mulher o domínio do seu movimento,
liberando sua estrutura física de peças descabidas, ao mesmo tempo em que
ofereceu segurança e agilidade.
São muitas fases, objetivos, tecidos, formatos. Há
milênios, sutiãs e calcinhas vêm
ajudando a construir memória e a contar a história da mulher na sociedade.
Abaixo, um resumo e um infográfico resgatam parte dessa trajetória.
Primórdios da lingerie e a criação do
espartilho
Alguns dos primeiros registros de versões
primitivas da lingerie podem ser encontrados em peças artísticas romanas de
mais de dois mil anos. Inicialmente, era hábito feminino utilizar tiras de
tecido em volta dos seios com o propósito de torná-los mais harmônicos.
Algumas centenas de anos depois ocorre a criação do
corpete. A peça contorna todo o tronco com o objetivo de moldar a silhueta,
deixando a cintura mais fina e o busto empinado. Há relatos, ainda na Grécia
Antiga, de esportistas mulheres que se utilizavam do corpete para manter os
seios presos para melhor se movimentarem durante exercícios e
competições.
Por sua vez, a roupa serviu de inspiração para um
tipo de lingerie que surgiu com força durante a Idade Média e que continuou em
voga por bons séculos: o espartilho.
De maneira geral, o espartilho era usado também
para moldar a silhueta feminina, mas ainda contribuia para manter a postura
ereta, empurrando os ombros para trás.
O uso contínuo desta peça foi nocivo e até mesmo
fatal para muitas mulheres. Era algo extremamente apertado, por muitos anos
feito de ferro, comprimia órgãos internos, costelas e causava
asfixia.
Entretanto, isso não impediu que o espartilho
continuasse ganhando importância até o final do século XIX, marcando, para além
de um padrão de beleza, status e a classe social de quem o vestia.
Cetim, babados e fitas: a lingerie
romântica
Apesar do espartilho ainda fazer sucesso, nas
décadas seguintes ele apareceu com ares mais românticos, destacado por tecidos
finos e babados. Também começaram a ser usados materiais mais leves na sua
produção, como cetim e rendas.
Em meados do século XIX uma outra espécie de roupa
de baixo ganhou importância: a crinolina. Com o propósito de deixar a saia em
formato semelhante ao de um sino, a peça de metal se juntou ao espartilho, indo
por debaixo de saias e vestidos, para oferecer aquela circunferência bem
definida, apresentada pelas mulheres da época.
Nesse contexto, também houve a popularização de
camisolas e vestidos de mangas bufantes, fixando às mulheres uma imagem de
inocência e delicadeza.
A liberdade do sutiã
Atualmente, tirar um sutiã apertado no final do dia
pode ser sinônimo de liberdade. Mas quando a peça foi criada chegou a
representar emancipação e autonomia.
Quem leva os créditos pelo surgimento do sutiã
moderno é a francesa Hermione Caddole. Em 1889, a europeia, que possuía sua
própria fábrica de lingerie, lançou uma peça apelidada de “corpete para seios”,
feita com tecidos à base de algodão e seda.
O propósito foi levantar a região do busto sem
comprimir o abdômen e sem a pretensão de moldar a silhueta feminina. Um detalhe
essencial para a praticidade dessa nova peça foi ter as alças apoiadas nos
ombros, tornando o sutiã algo menor e que não restringia tanto os movimentos de
quem usava.
Essa foi a resposta que diversas mulheres
esperavam, já que havia uma certa revolta com os espartilhos para lá de
apertados, que provocavam acidentes e prejudicavam a saúde feminina.
Novos tecidos e possibilidades para a
lingerie
A chegada do nylon, na década de 1940, foi outra
revolução no universo da lingerie. O tecido permitiu que sutiãs e calcinhas
durassem muito mais, além de facilitar consideravelmente a lavagem.
Na época, diversas mulheres brancas da classe
operária entravam no mercado de trabalho para suprir a demanda deixada pelos
homens, que foram compor os batalhões na Segunda Guerra Mundial. Praticidade e
otimização do tempo eram termos-chaves na vida dessas jovens
trabalhadoras.
Quando o nylon foi patenteado pela Dupont, empresa
estadunidense de química, o preço do tecido diminuiu, tornando as lingeries
mais baratas e acessíveis financeiramente.
O estilo pin-up e a liberdade sexual de 1960
Contrariando o estilo romântico e mais inocente em
voga até então, a década de 1950 trouxe as famosas pin-ups. As modelos cheias
de curva, com coxas fartas e seios proeminentes foram personagens essenciais
para a divulgação de um estilo de lingerie mais sensual e
provocativo.
Nesse sentido, voltaram à moda corserts e outras
espécies de espartilho, porém, dessa vez, não tão apertados. Também ganhou
destaque a cinta-liga, que até hoje é uma das peças que mais traz sensualidade
ao look. Esse foi um pequeno pontapé para tornar a sexualidade feminina algo um
pouco mais natural.
Nas décadas seguintes, a conversa sobre sexo e
repressão das mulheres chegou a outro nível. Entre 1960 e 1970, há a segunda
onda do feminismo. Com ela, temas como liberdade sexual, direito à pílula e
lingeries ainda mais confortáveis entraram no debate e no dia a dia da mulher
moderna.
A mobilização culminou no chamado “Women’s
Liberation Movement”, em 7 de setembro de 1968. Neste dia, cerca de 400
mulheres foram às ruas e queimaram diversos objetos que representavam opressão
ao sexo feminino. Maquiagem, revistas de beleza e, claro, os
sutiãs.
Esse foi um alerta para as empresas de lingeries,
que começaram a se preocupar ainda mais em criar diferentes formatos, que se
encaixassem bem em mulheres de diversos corpos e incomodassem cada vez menos no
uso de rotina.
Assim, acontece a criação de peças leves, que não
marcavam nem apareciam através das roupas. Uma tendência nos anos 1970,
inclusive, eram sutiãs tão finos que não escondiam o desenho do mamilo sob a
camisa.
Cintura alta: a moda da lingerie de 1980
A década de 1980 trouxe com ela uma preocupação
ímpar com a saúde. Muitas mulheres entraram na rotina fitness e as roupas de
esporte ficaram cada vez mais presentes nas suas atividades
cotidianas.
Uma moda registrada à época foi a cintura alta, que
chegou aos bodysuits de academia e também às calcinhas. Acreditava-se que esse
tipo de corte valorizava mais o corpo feminino.
É também nesta década que a lingerie chegou às ruas
pela primeira vez: as mulheres começam a usar as peças à mostra. Dos sutiãs
rendados aos bodies bem trabalhados, não era mais um erro certas roupas íntimas
aparecerem.
Algumas famosas, como as cantoras Cher e Madonna,
foram referências na tendência. A última, inclusive, utilizou um bustiê com
elementos explícitos do universo da lingerie na capa de um dos seus maiores
álbuns “Like a Virgin” (1984).
Anos 2000: de Victoria Secret’s à lingerie plus
size
O início dos anos 2000 foi marcado por desfiles da
marca de lingerie Victoria Secret’s e por um padrão de beleza extremamente
magro.
Nesse contexto, blusas mais finas e calças de
cintura baixa ganharam destaque na moda. Já na roupa íntima, o fio dental
começou a ocupar espaço como uma peça polêmica de lingerie.
Nos últimos anos, porém, a busca incansável pela
magreza deu lugar a uma filosofia um pouco mais inclusiva.
Apesar do padrão ainda ser a modelo magra, muitas
marcas de lingerie tiveram que adaptar seu catálogo de produtos a fim de
atender a um público identificado como plus size, que demandava, com razão,
ser reconhecido e contemplado nas tabelas de medidas das lojas.
Outra característica dos últimos anos é a volta do
conforto. As peças apertadas e de tecidos desconfortáveis dos anos 1980 são
temporariamente abandonadas. Agora, estar bem e sentir-se cômoda na lingerie é
o grande foco.
Assim, algumas tendências como o sport wear
- com sutiãs e tops maiores, de elásticos grandes - chamam atenção, tornando-se
carros-chefes de marcas de luxo, como a Calvin Klein.
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