Mesmo nos bastidores, a América Latina será um dos temas centrais da eleição presidencial dos Estados Unidos. Longe de ser esquecida, a região tornou-se peça chave do novo desenho mundial que está por surgir no pós-pandemia.
Diante das oscilações naturais de prioridades na esfera internacional de
qualquer nação, a América Latina, que já foi prioritária na agenda dos Estados
Unidos, passou a ocupar uma posição secundária com o fim dos conflitos armados
na América Central durante a década de 1980, reencontrando algum protagonismo
com a aproximação entre Washington e Havana no governo Obama.
Fato é que a política internacional move-se de maneira curiosa nas cadeiras
global de poder e as agendas internacionais acabam por se entrelaçar de forma
inesperada. É neste ponto que a América Latina passa a fazer parte novamente da
agenda norte-americana, desta vez trilhando um caminho subsidiário até reocupar
os salões do Departamento de Estado e da Casa Branca em posição de destaque.
Os interesses de Rússia e China, nos dias atuais, passam pela América Latina.
Moscou tem se aproximado de maneira intensa da Venezuela, e Caracas se tornou
um polo irradiador dos interesses russos na região, especialmente porque o
Kremlin tem investido no país latino mediante apoio militar para defender
Maduro. A chamada nação pivot da Ásia é conhecida pela habilidade em lidar com
os labirintos da política internacional. Assim, o soft power russo, usado de
forma calculada, por intermédio de programas de intercâmbio em áreas
estratégicas, conseguiu penetrar na região via Venezuela. Para Maduro, o
resultado da equação foi extremamente positivo.
Do lado chinês, a influência na América Latina tem sido construída no longo prazo,
na criação de dependência econômica e ampliação de infraestrutura, realizada de
forma hábil e eficaz, onde o debate acerca da implementação da tecnologia 5G
está no centro de um jogo de pressões e influências. Pequim já tem alcançado
resultados tangíveis, ao mover os interesses da região dentro de sua agenda,
inclusive elevando o tom diplomático de maneira confortável.
Diante disso, de forma indireta, a América Latina retornou para agenda política
de Washington em assuntos que seguem além dos temas habituais da região, como
democracia e imigração. Por mais que a recente influência russa e chinesa não
sejam assuntos tangíveis no processo eleitoral, permeiam os interesses dos
Estados Unidos de forma determinante na esfera geopolítica e balizam o futuro
das Américas.
Dentro deste contexto, o Brasil ocupa posição estratégica. Aliado dos Estados
Unidos, possui também interlocução com a Rússia, por meio dos BRICS, e com a
China, pelas vias econômicas que aproximam os dois países. Movimentar-se de
forma inteligente neste tabuleiro diplomático, pode criar oportunidades,
diálogo e pontes que ajudem o Brasil no pós-pandemia.
Especialmente no que tange aos Estados Unidos, nosso país avançou para uma
posição que vai além do entrosamento entre os dois Presidentes. Nos últimos
anos, foi desenhado um caminho de aproximação institucional entre os dois
países que ainda pode render resultados extremamente positivos para ambos os
lados. Somos dois países que dividem características essenciais de formação,
como a pluralidade imigratória, democracia e liberdades. O canal aberto entre
os dois atuais mandatários é apenas o início de uma relação madura que pode se
aprofundar em administrações futuras.
Trump e Biden sabem que a América Latina, antes um local de natural influência
dos Estados Unidos, está movendo-se rapidamente na direção de países que
desejam implementar sua agenda e liderança na região. A crescente influência de
Rússia e China acenderam o sinal de alerta em Washington. Deste modo, a América
Latina retorna ao tabuleiro do xadrez da política internacional na capital
americana e o Brasil pode tornar-se peça fundamental deste jogo.
Márcio Coimbra - coordenador
da pós-graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade
Presbiteriana Mackenzie Brasília, Cientista Político, mestre em Ação Política
pela Universidad Rey Juan Carlos (2007). Ex-Diretor da Apex-Brasil.
Diretor-Executivo do Interlegis no Senado Federal.
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