O sobrepeso pode prejudicar a gestação, levar a abortos espontâneos e
provocar uma pior resposta a tratamentos de fertilidade
Na semana Nacional de Combate à Obesidade, a Sociedade Brasileira de
Reprodução Assistida (SBRA) fez um alerta sobre como o sobrepeso pode interferir
na fertilidade e na ovulação da mulher. Especialistas recomendam que, para uma
gravidez sem risco, mulheres devem apresentar um índice de massa corpórea (IMC)
entre 20 e 25. Um resultado acima de 30 pode apresentar complicações na
ovulação.
O médico creditado pela SBRA Roberto Antunes dá algumas recomendações
para pacientes acima do peso e que desejam engravidar: “Iniciar o quanto antes
um acompanhamento nutricional e mudar o estilo de vida, iniciando a prática de
atividades físicas”, ressalta o médico, que também é membro do Conselho da
Diretoria da SBRA. Ainda de acordo com ele, pacientes que conseguem diminuir o
peso têm menos riscos de desenvolver síndrome metabólica, pressão alta e
diabetes.
Uma pesquisa recente do Ministério da Saúde revelou o aumento de 67,8%
de pessoas obesas nos últimos 13 anos, saindo de 11,8% (2006) para 19,8%
(2018). Os dados também apontam que o crescimento da obesidade foi maior entre
os adultos de 25 a 34 anos e 35 a 44 anos, com 84,2% e 81,1%, respectivamente.
Apesar de o excesso de peso ser mais comum entre os homens, em 2018, as mulheres
apresentaram obesidade ligeiramente maior – com 20,7% – em relação aos homens –
18,7%.
A seguir, confira os principais pontos da entrevista com Roberto
Antunes. O médico esclareceu questões cruciais sobre como a capacidade
reprodutiva é influenciada pela obesidade, além de dar dicas que podem auxiliar
as mulheres a realizar o sonho da maternidade. Roberto será o presidente do Congresso Brasileiro de Reprodução Assistida (XXIV CBRA
2020), a ser realizado de 5 a 8 de agosto de 2020, no
Rio de Janeiro.
1 – Como o excesso de peso interfere na fertilidade da mulher?
Roberto Antunes – O excesso de peso acarreta um
aumento da produção de estrogênio e contribui com os distúrbios da ovulação.
Fisiologicamente falando, o excesso de tecido adiposo colabora para a
resistência à ação da insulina. Tal fato leva a uma maior produção desse
hormônio e de outras moléculas pelo organismo da mulher, como o IGF-1, as quais
acabam atuando sobre os ovários de maneira a dificultar a formação adequada dos
folículos dominantes e, consequentemente, ela passa a ter maiores dificuldades
para ovular. Diminuindo o número de ovulações, obviamente, a mulher passa a ter
menos chances de engravidar. Além disso, existe um efeito indireto da
descompensação metabólica que a obesidade traz nas taxas de implantação dos
embriões. Assim, considerando os aspectos fisiológicos, as mulheres obesas têm
mais dificuldades de ovular e, quando os embriões se formam, eles têm mais
dificuldades em implantar.
2 – No caso dos homens, como o peso interfere na fertilidade?
Roberto Antunes – O excesso de peso também afeta
negativamente a ação da testosterona. O tecido adiposo é rico em uma enzima
chamada aromatase, a qual converte os hormônios androgênicos, incluindo a
testosterona, em derivados do estrogênio. Isso causa um impacto importante na
libido e na qualidade de vida de indivíduos obesos. Pacientes acima do peso
também apresentam uma série de alterações no exame de espermograma podendo, até
mesmo, fragmentar o DNA dos espermatozoides. Essas alterações aumentam as
dificuldades de uma gestação natural, aumentam as taxas de abortos e pioram a
qualidade dos embriões formados por fertilização in vitro (FIV).
3 – O excesso de peso também prejudica a gravidez? Por quê?
Roberto Antunes – O excesso de peso na gravidez
aumenta o risco de diabetes e pressão alta. Além disso, os fetos podem nascer
com um tamanho acima do esperado para a idade gestacional, com alterações do
metabolismo e hipoglicemia. O pós-operatório também é complicado, por
apresentar riscos de infecção de ferida e dificuldades de cicatrização. Porém,
pacientes com IMC abaixo de 20 também podem apresentar distúrbios
ovulatórios.
4 – Mulheres com excesso de peso têm menos chances engravidar por meio
das técnicas de reprodução assistida?
Roberto Antunes – O peso é um dos pontos
levados em consideração ao realizar o estímulo ovariano da paciente para a
fertilização in vitro ou injeção intracitoplasmática porque afeta
a ação da maioria das medicações de estimulação. Pacientes de maior peso
necessitam de maiores doses de medicação para uma resposta ovariana adequada.
Em relação à qualidade dos óvulos recuperados e à classificação dos embriões
formados, não há diferenças entre pacientes obesas e pacientes com peso
normal.
5 – Qual a taxa de IMC considerada preocupante para mulheres que desejam
engravidar?
Roberto Antunes – O IMC ideal encontra–se entre
20-25. As pacientes que apresentam IMC acima de 30 são aquelas que começam a apresentar
uma maior taxa de complicações associadas à ovulação. Por outro lado, pacientes
com IMC abaixo de 20, que possuem panículo adiposo muito reduzido, também podem
começar a apresentar distúrbios ovulatórios.
6 – O baixo peso demais também pode trazer problemas para as mulheres?
Roberto Antunes – Os extremos de peso afetam
bastante a fertilidade. Pacientes com percentual de gordura muito baixo, seja
por doença, como nos casos de anorexia, seja por atividade física intensa, como
nos casos de atletas profissionais, geralmente apresentam um distúrbio do eixo
hipotálamo-hipófise-ovário (responsável pela produção hormonal). Ou seja, essas
alterações suprimem os níveis dos hormônios FSH (hormônio folículo-estimulante)
e LH (hormônio luteinizante), o que pode impedir a ovulação.
7 – Qual a relação da cirurgia bariátrica com a fertilidade?
Roberto Antunes – Os resultados da cirurgia
bariátrica podem aumentar as chances de gestação espontânea porque a mulher
volta a ovular e menstruar e apresenta melhores índices de glicemia e de
colesterol. Mas para pacientes que, mesmo após a cirurgia, necessitem recorrer
aos tratamentos de fertilização in vitro, pode haver queda nos
resultados do estímulo ovariano. Ou seja, o número de óvulos recuperados tende
a ser menor e a qualidade dos embriões formados também apresenta uma tendência
de piora. Independente do método de gestação, após a bariátrica a mulher
precisa estar atenta aos riscos para o feto e para si mesma, a fim de evitar
síndromes disabsortivas (de má absorção intestinal). Nesses casos, recomendamos
um acompanhamento pré-natal com muita atenção, com profissional afeito a
gestação de alto risco.
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