O carreirismo
político no Brasil é um fato negativo para o aperfeiçoamento da atividade,
tornando-se empecilho ao surgimento de novas lideranças, ou seja, de ideias
renovadoras e modernizantes. Um dos segmentos onde se instalou, nas Câmaras
Municipais, é o que mais afeta a população por ser o degrau inicial da
política, pois o vereador é o primeiro representante popular, o mais próximo da
comunidade. Sem dúvida o profissionalismo político nesse âmbito se deve aos
altos subsídios e mordomias legais ou institucionalizadas, aspectos que
precisam ser reconsiderados, ainda que difíceis de enfrentamento porque
mudanças dependem dos legisladores, que são exatamente esses mesmos políticos,
sempre indispostos a decisões que ameacem o corporativismo.
A instituição de
salários a vereadores começou efetivamente em 1977, no regime militar. Antes,
apenas vereadores das capitais recebiam subsídios. Naquele ano o então
presidente Ernesto Geisel sancionou decreto estendendo o benefício, visando
buscar apoio político das bases e também reforçar politicamente o partido do
governo. Gradualmente foram sendo estabelecidos extensivos valores salariais e
vantagens pecuniárias até o extremo a que encontramos hoje. Em muitas cidades o
salário dos vereadores é o maior do município para uma ou no máximo duas
reuniões, à noite, por semana, verdadeira afronta ao operariado que trabalha
oito horas por dia em sete dias da semana recebendo insignificância em
comparação ao integrante da Câmara instalado em gabinetes climatizados e
cercados de mordomias diversas.
Passou a ter grande importância eleger-se
(ou reeleger-se) para a Câmara Municipal. Para manter o mandato o vereador usa
apelo popularesco e se dedica em tempo quase integral à assistência social, o
que não é, em absoluto, sua função, todavia ele se transforma em espécie de
“despachante do povo” junto aos órgãos públicos de atendimento social que
aceitam e facilitam a intermediação porque o prefeito também depende do apoio
do vereador.
O assistencialismo que os vereadores
praticam é, portanto, atividade eleitoreira, não faz parte de suas atribuições
precípuas que são: legislar, fiscalizar as ações do executivo e discutir temas
de interesse dos bairros que representam para atendimento das necessidades
coletivas, deixando a assistência social individual a cargo dos organismos
próprios.
Considerando-se que o Brasil é um dos
poucos países que mantém tais critérios de remuneração dos vereadores, seria
conveniente que a sociedade discutisse o assunto. E também, que sejam debatidos
exemplos de países que adotam outros sistemas sem prejuízo à administração da
cidade. Segundo informação da ONU, entre 181 dos países filiados o Brasil é o
único que remunera vereadores nos moldes que conhecemos. Na maioria dos demais
existem conselhos municipais cuja eleição ou nomeação dos integrantes diferem,
e a remuneração também.
Em alguns países são apenas ressarcidas
as despesas pessoais ocorridas em função do desempenho do cargo, noutros há
pagamento de jeton por sessão, gratificação, ajuda de custo ou até mesmo nada
recebem, como na Suécia, onde a atividade é uma espécie de voluntariado em
colaboração aos cidadãos e à administração da cidade. Ninguém vive do cargo,
todos têm suas atividades profissionais. E não há notícia de que algum haja
morrido de fome.
No Brasil já foi assim, quando as Câmaras
eram constituídas por Conselhos Comunitários formados por representantes da
sociedade não remunerados, que se dedicavam não a fazer assistência social, mas
sim discutir temas, assuntos e projetos de interesse do município e de seus
cidadãos.
Como desde 2009 tramitam no Congresso
propostas de redução e até mesmo extinção dos salários dos vereadores, é bom
repensar e debater a questão para reforçar os argumentos. O carreirismo e o
alto preço das campanhas inibem cidadãos com disposição para trabalhar, mas com
poucas posses para enfrentar os “profissionais” acabam desestimulados. Em
consequência, cai o nível das representações municipais, existe pouca renovação
tanto de nomes quanto de ideias, o que inevitavelmente redunda em prejuízos aos
municípios.
Luiz
Carlos Borges da Silveira -
empresário,
médico e professor. Foi Ministro da Saúde e Deputado Federal.
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