No
vocabulário de expressões modernas surgiu mais uma novidade: o jogo da “Baleia
Azul”. Ao contrário do que seu nome sugere, não há inocência por detrás de tal
brincadeira. Ela pode até levar um jovem ao suicídio, caso a vítima aceite os
desafios propostos por um desconhecido online,
controlador do jogo.
No
mês de maio último, a polícia encontrou alguns adolescentes à beira de uma
rodovia no Distrito Federal1. Chorando de desespero, eles procuravam
cumprir a última etapa da “baleia azul”: atirar-se na frente de um ônibus em
alta velocidade!
Em
outros casos, não houve tempo de salvar a vítima.
A
onda do macabro jogo é provavelmente passageira e parece que vai saindo “de
moda”. Mas um assunto de maior vulto relaciona-se diretamente com ele. Por que
adolescentes suicidam-se cada vez mais?
Calculando
a dimensão do problema
Segundo
recente artigo da BBC Brasil2, um estudo baseado em dados oficiais
do Sistema de Informações de Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, revela dados
preocupantes. A primeira informação: considerando toda a população brasileira,
entre 1980 e 2014, houve um aumento de 60% na taxa de suicídios.
Quanto
aos dados relativos à população jovem, o mesmo artigo reproduz o que diz o
estudo: “Em 1980, a taxa
de suicídios na faixa etária de 15 a 29 anos era de 4,4 por 100 mil habitantes;
chegou a 4,1 em 1990 e a 4,5 em 2000”. Já no período entre 2002 e
2014, a taxa subiu de 5,1 para 5,6 por 100 mil habitantes. O estudo conclui: “Assim, entre 1980 a 2014, houve um
crescimento de 27,2%” na taxa de suicídios, considerando a mesma
faixa de idade.
Para
se ter uma ideia mais concreta do que tais números representam, a mesma
pesquisa mostra que em 2014, houve, somente no Brasil, 2.898 suicídios de
jovens de 15 a 29 anos.
Insisto,
pois a questão se impõe: por que tantos jovens acabam com a própria vida?
É
importante fazer notar, antes de tudo, que o artigo citado tenta fornecer
algumas respostas à pergunta acima, usando declarações de diversos sociólogos e
psicólogos. Segundo esses especialistas, “o
problema é normalmente associado a fatores como depressão, abuso de drogas e
álcool, além das chamadas questões interpessoais, violência sexual, abusos,
violência doméstica e bullying”.
De
fato, podemos encontrar tais causas por detrás dos suicídios. Contudo, o que
impele um jovem a usar drogas, por exemplo, ou o que ocasiona sua depressão?
Qual é a raiz da violência doméstica?
A
falta da noção do sofrimento na vida
O
mais fundo do problema reside, sem dúvida, na decadência moral generalizada do
mundo contemporâneo. Essa decadência afeta diretamente a constituição da
família. Se a família se desfaz, é inevitável a propensão do jovem para as
drogas e a violência, de um lado; e sua menor capacidade, por outro lado, de
suportar as dificuldades quotidianas, cujo desfecho pode ser a depressão.
Há
mais um fator, ignorado pelo artigo da BBC: o mundo contemporâneo oferece sem cessar
múltiplos divertimentos e prazeres. Sendo a juventude o grupo que mais deveria
se “beneficiar” deles, a lógica conclui que, quanto mais jovem, maior o desejo
de aproveitar a vida e, portanto, mais afastada a hipótese de suicídio.
Contudo,
não é o que ocorre na prática. E aqui fica desmascarada uma grande ilusão de
nossos dias: quanto mais gozo da vida, mais felicidade. Se assim fosse, deveria
haver menos suicídios, sobretudo entre os jovens.
Volto
ao jogo da “Baleia Azul”. Supostamente, jovens conectados à internet têm diante de
si possibilidades ilimitadas de entretenimento. Diversões fáceis e constantes,
sempre mais almejadas. No banquete frenético de diversões aparece outra: um
jogo de desafios cada vez mais ousados. O último deles termina em suicídio.
Assim,
a saturação dos prazeres leva à frustração, a qual, por sua vez, provoca a
busca intensa de novidades e entretenimento. Diversões, festas e jogos em
demasia... decepção, desespero, suicídio!
E
não adianta dizer que os suicídios atingem jovens das classes baixas ou com
menos oportunidades na vida. O artigo mencionado demonstra que jovens
considerados de elite, como estudantes de medicina, pertencem também às
estatísticas de suicídio. E não nos esqueçamos do grande número de viciados em
drogas entre a juventude das classes mais altas.
Revela-se
aqui uma das maiores causas do suicídio juvenil: a hipertrofia dos prazeres —
incentivada pela grande mídia e pela pedagogia moderna, como o ensino da
chamada Ideologia de
Gênero —, que além de rejeitarem e negarem a ideia do sofrimento e,
por conseguinte, do pecado, criam um circuito de ilusões na mente dos jovens. O
pecado leva a outro pecado, e como consequência surge o fantasma dos problemas
de consciência, sofrimento interior... suicídio!
A
admirável lição de Santa Teresinha
O
que fazer diante dessa constatação? Talvez uma rápida lição de santidade deite
um pouco de luz nessas sombras.
Abro
a famosa História de uma
Alma, autobiografia de Santa Teresinha do Menino Jesus, e leio o
seguinte trecho sobre sua juventude: “Tudo,
ao redor de mim, era alegria e felicidade; eu era festejada, acariciada,
admirada, numa palavra, [...] minha vida foi semeada só de flores... Confesso
que esta vida tinha encantos para mim”3.
A
“pequena santa” de Lisieux reconhece os atrativos e os prazeres da juventude.
Mas logo adiante — algo negado à juventude moderna — vem a reflexão serena e
coerente: “Aos dez anos o
coração deixa-se facilmente fascinar, por isso considero uma grande graça não ter ficado em
Alençon; os amigos que tínhamos aí eram muito mundanos, [...] Não pensavam
bastante na morte e, no entanto, a morte veio visitar um grande número de pessoas
jovens, ricas e felizes,
que conheci!!!”.
Eis
aí uma lição a ser ensinada aos jovens de hoje. Os momentos de felicidade são
transitórios e muitas vezes ilusórios. A vida não se constitui só de prazeres.
E estes devem ser moderados e regulados segundo a moral. É necessário ter
diante de si as dificuldades e os sofrimentos de todos os dias. Saber
enfrentá-los reverte-se em eficaz remédio contra a frustração, o desespero, e,
por fim, o suicídio.
Paulo Henrique Américo de Araújo
é colaborador da ABIM
Notas
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