O
trabalho geralmente ocupa um papel central na vida das pessoas; por volta dos
18 anos a pessoa já desenvolveu ou está desenvolvendo alguma atividade
laborativa. Com a inserção de projetos, como o Jovem Aprendiz, muito antes dos
18 anos o adolescente já teve alguma experiência laboral e começa a desenvolver
sua identidade social, em razão das novas relações que se estabelecem no
ambiente de trabalho.
Para
a maioria das pessoas a inserção no mercado de trabalho deveria promover a
melhoria na autoestima, motivação de crescimento profissional, expectativas de
reconhecimento, autoconhecimento de aptidões e crescimento pessoal que passa
por um processo de maturação e tende a levar o indivíduo à autorrealização.
O
oposto do tema inserido acima mostra uma sociedade laborativa cada vez mais
saturada, esgotada, estafada, repleta de argumentos e reclamações que os levam
a licenças psiquiátricas.
O fato de o Brasil encontrar-se em processo de desenvolvimento nos faz notar um aumento do setor de
serviços na economia, crescente aumento da instabilidade social e econômica,
coexistência de diferentes modalidades de processos produtivos (da manufatura à
automação), precariedade das relações de produção, desemprego crescente e
mudanças nos hábitos e estilos de vida dos trabalhadores.
Cenários
como esses têm causado um aumento de sintomas como: cansaço a todo o momento,
enxaqueca, fraqueza, dores musculares, distúrbios do sono, dores no estômago,
náuseas, dores de cabeça, alergias, queda de cabelo, maior suscetibilidade a
gripes, diminuição do desejo sexual, tentativa de suicídio, falta de atenção e
concentração, alterações de memória, irritabilidade, resistência a mudanças,
perda de iniciativa, perda de interesse pelo trabalho, pelas coisas pessoais,
ironia, raiva, isolamento, ceticismo, despersonalização e distanciamento
afetivo, tudo isso “cavando” no sujeito os sentimentos de frustração e
fracasso. A pessoa normalmente vai ao trabalho, porém desenvolve um estado que
chamamos de presenteísmo, quando se está fisicamente no posto, no entanto com a
mente muito distante. A esse conjunto de características damos o nome de síndrome
de Burnout (Maslach & Schaufeli,
1993),
que é causada por ambientes profissionais que exercem pressões psicológicas
constantes, não reconhecimento pessoal, acúmulo de tarefas, perfeccionismo e
foco constante no trabalho como únicas fontes de lazer e prazer que acabam por
direcionar a pessoa ao desgaste físico e mental. Vale lembrar que não é
necessário que a pessoa apresente todos os sintomas concomitantemente para ser
caracterizada com burnout e é importante um diagnóstico diferencial,
pois apesar de parecer uma depressão, possui características diferentes. A síndrome
de Burnout identifica o trabalho como desencadeador do processo e apresenta uma sintomatologia com prevalência
de sentimentos de desapontamento e tristeza. Por outro lado, na depressão o
que prevalece são os sentimentos de derrota e
letargia para a tomada de atitude.
O termo em inglês significa estar chamuscado, queimado,
calcinado por um fogo que se alastra como numa floresta; esse termo só pode ser
empregado para o ambiente laborativo, pois é uma metáfora que se refere ao
alastramento dos sintomas emocionais e físicos que tomam a pessoa. Estima-se
que, no Brasil, 30% dos profissionais apresentam esse grau máximo de “pane no
sistema”, conforme pesquisa da filial nacional da International Stress
Management Association (Isma), que avaliou mil pessoas de 20 a 60 anos
entre 2013 e 2014.
As pessoas com essa síndrome apresentam maior risco de
erros e acidentes de carro, devido à desatenção e impaciência. Como se não
bastasse, há perdas sociais, especialmente na relação com os colegas e
familiares, pois essa pessoa pode apresentar boa aparência e as pessoas se
questionarem da veracidade dos sintomas. É normal os amigos e familiares darem
conselhos para que a pessoa reaja e isso só tende a piorar, pois a pessoa passa
a acreditar que qualquer outro indivíduo em seu lugar teria capacidade de
reagir, menos ela, cedendo maior espaço às frustrações e ao sentimento de
incapacidade.
As categorias mais atingidas são as pessoas que lidam
diretamente com outras e são expostas ao sofrimento humano. A síndrome acomete
muitos enfermeiros, psicólogos, professores, policiais, bombeiros, carcereiros,
oficiais de justiça, assistentes sociais, atendentes de telemarketing,
bancários, advogados, executivos, arquitetos e jornalistas, com a ala feminina
como alvo principal, pois as mulheres tendem a desenvolver suas funções, mas
também o serviço “doméstico” do escritório, como atender telefone, tomar notas,
servir café e organizar festas, sem serem recompensadas por isso. Quando se
negam a realizar essas tarefas, sentem-se ameaçadas, achando que sua carreira
pode ser prejudicada. Vale lembrar que a síndrome não é de exclusividade
feminina.
A síndrome de Burnout tem crescido subitamente, junto
à tentativa de desenvolvimento do país, que traz prós e contras, pois há um
cenário ambíguo de atividades e exigências. O mercado capitalista exige ainda
uma maior produção em menor espaço de tempo. As redes sociais nos mantêm
conectados constantemente e provou ser eficiente em comunicação rápida, o que
acaba demandando que estejamos disponíveis o tempo todo. Se não respondermos a
um questionamento de trabalho às 22h00min pelo WhatsApp (apenas um
exemplo dentre tantos) é porque não estamos muito aptos a crescer na carreira,
quando, na verdade, o expediente deveria ter terminado às 18h00min. Todas essas
facilidades deveriam servir para diminuir o tempo de trabalho, tornando-o mais
eficaz, porém a mensagem tem sido transmitida da seguinte forma: “Se você está
conectado 24 horas por dia, deve trabalhar 24 horas por dia”.
A síndrome de Burnout possui tratamento e
merece atenção especial, uma vez que ataca o biopsicossocial do indivíduo e
gera grandes descompassos nas empresas, provocando alta rotatividade de
funcionários, perda de grandes talentos e muitas vezes gerando processos expressivos
ao setor empresarial.
Comumente é tratada com ansiolíticos e/ou antidepressivos
associados à terapia psicológica de abordagem Cognitivo Comportamental.
Entretanto, melhor que tratar é prevenir, e aqui vão algumas atitudes que podem
fazer a diferença: aumentar a variedade de rotinas, para evitar a monotonia;
prevenir o excesso de horas extras; dar melhor suporte social às pessoas;
melhorar as condições sociais e físicas de trabalho;
e investir no aperfeiçoamento profissional e pessoal dos trabalhadores
Fernanda Machado - CRP
06/121510 - Psicóloga Cognitivo Comportamental, com formação em Transtornos
Psiquiátricos e Neuropsicologia
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